domingo, 7 de fevereiro de 2021

Fernando Henrique Cardoso* - As difíceis escolhas

- O Estado de S. Paulo

Além da pandemia, temos de vivenciar o jogo degradante de sempre de quem manda

Dias difíceis estes pelos quais passamos. Além da pandemia, o jogo do poder. Eu não me posso queixar: fique em casa, dizem os que mais sabem sobre os contágios. Isso é possível... para quem tem casa, como eu. E os que não a têm, ou a têm precária, e são muitos, na casa dos milhões? E os que estão no poder e, diferentemente de minha situação atual, precisam meter-se no dia a dia da política?

O bichinho persistente, o novo coronavírus, mata indiscriminadamente, é verdade, jovens ou velhos, ricos e poderosos tanto quanto pobres e sem alavancas de poder nas mãos. Mesmo assim, na minha faixa de idade, quando os 90 anos se aproximam celeremente, é triste viver dentro de casa, por mais confortável que seja, e ver a cidade murchando. E é tristeza para todos.

Mas não desanimemos. Se algo o tempo ensina, é como diz o velho ditado: não há mal que sempre dure nem bem que nunca acabe.

Às vezes, raramente, sinto certo desânimo. Olho em volta e vejo: meu Deus, outra vez! É o Congresso em seu ritmo habitual: dá cá, toma lá. Certa vez perguntei a Bill Clinton, então presidente dos Estados Unidos: mas é sempre assim? Tratava-se da prática de pegar no telefone e falar com cada um dos deputados que o apoiavam, para pedir: é preciso votar a favor, ou contra, tal ou qual projeto.

Era o habitual. Mas vale a pena. Sem democracia é pior: a barganha, quando existe, não é vista nem comentada. Mas existe. Melhor que se a faça às claras.

Luciano Huck* - Apesar de ...

- Folha de S. Paulo

Sistema imunológico da sociedade brasileira dá respostas à altura das agressões do bolsonarismo

O Brasil será vacinado contra a Covid mesmo com as omissões, os erros e os arbítrios do governo federal. Entramos no terceiro ano da Presidência de Jair Bolsonaro, mas no 33º ano do Sistema Único de Saúde, o SUS.

Para cada negacionista que orbita o poder no Palácio do Planalto, há milhares de brasileiros empenhados em combater de peito aberto os efeitos da maior crise sanitária da história.

São os médicos, enfermeiros e profissionais de saúde na trincheira para salvar vidas e que estoicamente ignoram os delírios obscurantistas de seus superiores. Gente que há quase um ano se desdobra no atendimento dos doentes e agora tocam a campanha de vacinação.

São os cientistas e técnicos nas frentes de pesquisa, garantindo que as vacinas sejam produzidas e aplicadas com toda segurança.

São nossos diplomatas mundo afora que não se deixaram capturar pelo tradicionalismo, como o diligente time da representação na Índia, que assegurou as importações de vacina apesar do disfuncional que os lidera em Brasília.

Butantan e Fiocruz financiados pelos nossos impostos se tornaram merecidamente o símbolo dessa resistência humanitária.

Mas os heróis da resistência democrática são muitos. Incluem os jornalistas que nunca trataram a doença como uma “gripezinha”. Os líderes comunitários que organizam exércitos de mobilização. Os políticos verdadeiramente comprometidos com o povo sem cair no populismo. Os empresários que entenderam a gravidade do contexto e abraçaram a agenda da inclusão, sem filas paralelas ou qualquer outro privilégio.

Muita gente fez —e faz— a diferença ao enfrentar a miopia e a descoordenação apesar da insistência em atrapalhar de quem deveria liderar o país atualmente.

Temos de reverenciar a resposta diária dos professores nos estados e municípios e aplaudir os projetos públicos de ensino digital como, por exemplo, do Maranhão e do Rio Grande do Sul, que são ações bem sucedidas, apesar de a educação ter sido jogada às traças por ministros extremistas e alienados do marco democrático.

Paulo Fábio Dantas Neto* - Reposicionamento do DEM?

Frustrarei alguns dos ainda poucos leitores ou ouvintes regulares desta coluna, ao não comentar diretamente o desfecho de eleições recentes para as mesas da Câmara e Senado. É que estou escrevendo um artigo sobre esse assunto, que será publicado pela revista eletrônica “Política Democrática”. Quem ainda não estiver saturado de informações, interpretações e conclusões sobre isso poderá acessar a revista, na próxima semana. De todo modo, o tema de hoje deriva daquele. É, por assim dizer, um efeito colateral do desfecho da disputa da Câmara, que vem sendo tratado - a meu ver, indevidamente e não inocentemente - como se fosse uma causa. Trata-se do posicionamento político do DEM.

Cultivo o hábito, hoje meio fora de moda, de avaliar, de saída, a posição de políticos e partidos pelo que eles declaram em público. A declaração tem valor em si, porque – salvo em casos limite, devidamente comprovados, de desprezo pela razão e uso contumaz da mentira - compromete o declarante, além de provocar ações de terceiros, que a tomam como baliza.  De modo complementar, fazer reflexões para avaliar se estão sendo verazes, usando, como evidências, fatos e informações cruzadas de outras fontes, mas sempre pondo-as na condicional, sem fazer conjecturas passarem por veredictos. Pior do que a benevolência acrítica é o criticismo imprudente. Por isso, parto da entrevista concedida, pelo presidente nacional do partido em foco, ao jornal Folha de São Paulo, no último dia 3.

O título da matéria é “DEM não vai com extremos em 2022, mas não posso descartar agora estar com Bolsonaro, diz ACM Neto”.  Quem foi além do título e leu a entrevista, viu que essa não foi uma declaração da iniciativa do entrevistado e sim uma resposta sua a uma pergunta direta do jornal.  Leu também, no restante da mesma resposta, uma pergunta feita pelo político baiano:  Qual Bolsonaro vai ser? O dos dois últimos anos que passaram? Não queremos. Agora, haverá um reposicionamento? Para a construção de algo mais amplo, que não fique limitado à direita? Não sei.”  O título da matéria reproduz o núcleo da resposta e destaca o que nela suscita mais polêmica. O contexto da polêmica é a divisão do DEM na disputa da Câmara dos Deputados, fato que já vinha sendo interpretado, predominantemente, nos meios de comunicação, sob a chave da “traição”, da maioria da bancada e do presidente do partido, ao deputado Rodrigo Maia. Como estratégia jornalística, tudo certo, o entrevistado perderá tempo em reclamar.

Marco Aurélio Nogueira* - O momento pede ação democrática firme e inteligente

Revista Será? (PE)

A espetacular vitória de Arthur Lira na Câmara dos Deputados deixará marcas profundas na vida política brasileira, que terão de ser digeridas pela oposição democrática. Pode não ser uma novidade, dadas as características do nosso presidencialismo, que impulsiona o governo federal a se compor com o que se pode ter de “maiorias” no plenário da Câmara. Todo governo age para ganhar o Congresso, valendo-se de recursos mais decentes ou menos. Mas a vitória de Lira teve um diferencial: materializa uma ampla coalizão direitista e fisiológica e expressa com clareza a nova estética política que prevalece no País, na qual o que conta é jogar para a plateia (no caso, o plenário), abusar da demagogia, explorar mágoas e ressentimentos, deixar de lado qualquer protocolo ou manual de boas maneiras. Como no Executivo, a grosseria e a rusticidade predominam, sem qualquer prurido.

A festa com que Arthur Lira e seus apoiadores comemoraram a vitória, em Brasília, foi o suprassumo da estética dominante. Todos sem máscara, bebida solta, abraços e beijos, um festival de breguice e exibicionismo. Dançaram e cantaram como se estivessem a debochar da população enclausurada ou que rala nas ruas para trabalhar.

Há questões que passam pela lógica dos partidos brasileiros: a tendência inerente a eles de serem sugados pelo poder, com suas prebendas e vantagens. DEM, PSDB, MDB, PT, para falar de alguns “grandes”, se estraçalharam com isso. Mostraram pouca coerência e nenhuma lealdade. Deixaram Simone Tebet e Baleia Rossi na mão. Provavelmente não se beneficiaram com cotas orçamentárias, mas deixaram patente a disposição de ficar bem com a “maioria” que controla a Câmara, quem sabe aspirando fazê-la girar em dada direção, e não em outra. O que pesou mesmo foram interesses pessoais, grupais, regionais, muito mais do que princípios ou alinhamentos políticos. Deixaram no ar uma interrogação sobre quem é oposição, por quais razões e com quais intenções.

DEM e PSDB, em particular, que se consideravam líderes de uma espécie de “centro democrático”, saíram desmoralizados, cortados de cima a baixo por desavenças e desentendimentos. Mostraram ser compósitos de correntes que não se entendem: vão pela estrada carregando bagagens em que abundam pequenos interesses e faltam ideias, firmeza, compromissos.

No Senado, o estrago foi menor, o que converteu a instituição em um fator de equilíbrio e no novo locus da articulação democrática. Afinal, a candidatura do vitorioso Rodrigo Pacheco funcionou como um estuário de forças de centro e de esquerda, desenho que não se viabilizou na Câmara. O MDB “cristianizou” Tebet, mas não rompeu com a coalizão que terminou por prevalecer. No Senado, Bolsonaro não nadará à vontade. A Casa poderá fazer um contraponto ao que se antevê como recrudescimento direitista na Câmara, com um Arthur Lira se entregando a um plenário fragmentado e desorganizado, à agressividade típica de um “cabra da peste”, cego para o País, concentrado em seus interesses e modus operandi.

Merval Pereira - Verdades escondidas

- O Globo

Uma disputa domina os bastidores do Supremo Tribunal Federal (STF), relacionada ao processo politicamente delicado de declaração de parcialidade do ex-juiz Sérgio Moro na condenação do ex-presidente Lula pelo triplex do Guarujá. Trata-se da permissão à defesa do ex-presidente Lula pelo ministro Ricardo Lewandowski  de ter acesso aos diálogos entre o então juiz Moro e os procuradores da Lava-Jato de Curitiba, notadamente Deltan Dallagnol, roubados por hackers.

Nesta terça-feira, a 2ª Turma do Supremo Tribunal Federal toma uma decisão fundamental para o desenrolar do julgamento, que deve ser finalizado ainda nesse primeiro semestre. Os ministros Carmem Lucia e Edson Fachin já votaram a favor de Moro, considerando que não há provas de ilegalidades no processo. Restam os votos de Ricardo Lewandowski e Gilmar Mendes, que votam em conjunto contra a Lava-Jato, e o de Nunes Marques, cujo voto pode revelar qual é a posição do presidente Bolsonaro.

Só que essa questão, que precede a principal, deveria ser definida pelo plenário do STF, de acordo com decisão anterior do ministro Edson Fachin, que é o relator dos casos da Lava-Jato. O ministro Ricardo Lewandowski, por uma manobra dos advogados de Lula, e falha da secretaria-geral do Supremo, recebeu o habeas-corpus sobre as mensagens roubadas e autorizou o que Fachin anteriormente negara. Pretende levar o caso para a  2ª Turma, onde, acredita ter maioria contra Moro, antes que o plenário decida.

Eliane Cantanhêde – Paus para toda obra

- O Estado de S. Paulo

 Amigos e ministros são paus, pedras e vitrines para pandemia, vacinas, Manaus, combustíveis...

Nada melhor, e às vezes bem fácil, do que sair do alvo terceirizando culpas e responsabilidades, dando voltas, avançando e recuando, desqualificando os que denunciam, atiçando os cães de guarda, rindo dos indignados e enganando os trouxas. O presidente Jair Bolsonaro é craque nisso, mas ele só acerta porque há quem faça o jogo dele.

O procurador-geral da República, Augusto Aras, diz que abriu nove “investigações preliminares” sobre a ação, ou inação, de Bolsonaro na pandemia. Motivos não faltam, culminando com o atraso das vacinas, mas as investigações nunca saem das preliminares e quem está objetivamente na mira é o general Eduardo Pazuello. Ele bate no peito para dizer que negocia vacinas em várias frentes, sem se penitenciar por fazer em fevereiro de 2021 o que 50 países sérios fazem desde meados de 2020. Além de submisso e atrasado, ele é atrapalhado.

Elio Gaspari - A Lava-Jato morreu na infância

- O Globo / Folha de S. Paulo

Acabou-se a força-tarefa de Curitiba que durante sete anos mostrou ao país o maior esquema de corrupção de sua História. Morreu sem choro nem vela. Empreiteiros corruptos e onipotentes foram para a cadeia, suas empresas encolheram, milhares de empregos sumiram, e nenhum deles ficou pobre. O juiz Sergio Moro tornou-se uma celebridade nacional, mumificou-se indo para o Ministério de Bolsonaro e de lá para a humilhação pública. Alguns procuradores lambuzaram-se com a fama. Ninguém saiu da Lava-Jato como entrou, e ninguém saiu bem dela.

Só a poesia de Paulinho da Viola captura o tamanho dessa tragédia:

“A marca dos meus desenganos ficou, ficou. (...)

Foi um rio que passou em minha vida, e meu coração se deixou levar.”

A Lava-Jato prendeu um ex-presidente da República e destruiu a máquina do comissariado petista que havia se associado a caciques do Centrão. Em 2004, antes que a Lava-Jato surgisse, o juiz Sergio Moro escreveu um artigo louvando a campanha de combate à corrupção que deslegitimou o sistema partidário da Itália. Com a fama que conquistou, aninhou-se num governo, que prometia uma “nova política”. Podia-se fazer tudo pelo juiz de Curitiba, menos o papel de bobo. Enquanto ele dava esse salto, seus colaboradores concebiam uma fundação bilionária. A “nova política” tornou-se o novo nome do Centrão, com suas obras e suas pompas.

Numa trapaça da História, a Lava-Jato de Curitiba morreu nos mesmos dias em que voltam a ser conhecidos, com mais detalhes, as conversas promíscuas e primitivas que tinham em suas redes. (Eles continuam dizendo que os diálogos são “supostos”. Supostas foram as falas messiânicas com que embrulhavam o devido processo legal).

Dorrit Harazim - Pente finíssimo

- O Globo

Esta foi a semana inaugural da vice-presidente pinçada por Joe Biden para estar a seu lado — ou no seu lugar — no comando do país até 2025. Foi de Kamala Harris o voto de minerva no Senado que permitiu a tramitação do pacote emergencial de estratosféricos US$ 1,9 trilhão (R$ 99,5 trilhões) destinado a reparar a devastação nacional causada pela Covid-19. A votação durou 15 horas, terminou às 5h30m da madrugada de anteontem, e sua tramitação recheada de 40 emendas volta agora para a Câmara dos Representantes. Um marco e tanto.

A partir de terça-feira, quando o segundo pedido de impeachment de Donald Trump aportar no mesmo Senado rachado em 50-50, a inquisitiva ex-senadora Harris fará falta nas arguições — se arguição houver. É mais provável que nem sequer haja condenação, pois, para ser aprovada, são necessários dois terços dos votos. Na improvável hipótese de que seja aceita uma votação extra, por maioria simples, sobre Trump ser proibido de exercer qualquer cargo público futuro, Kamala estará a postos em caso de empate na votação. Ao longo da história, o voto de minerva que compõe as atribuições da Vice-Presidência já foi exercido 268 vezes.

A equipe de Biden que garimpou Kamala Harris trabalhou em duplas por três meses durante a campanha. Da primeira seleta de 23 sabatinadas, e da avaliação das montanhas de documentos por elas fornecidos, haviam sobrado 11. Várias chegaram a classificar o questionário de mais de 120 perguntas como “invasivo” e “extenuante”. Ao final de 120 horas de entrevistas, sobraram Kamala e Susan Rice, a assertiva ex-assessora de Segurança Nacional de Barack Obama, também negra. Biden só foi chamado a tomar sua decisão histórica na reta final. E, sendo quem é, telefonou pessoalmente às 11 descartadas para atenuar o desapontamento e agradecer a dedicação.

Luiz Carlos Azedo - Um candidato no telhado

- Correio Braziliense / Estado de Minas

Huck parece realmente disposto a largar o mundo do entretenimento e ingressar na política. Mas a aposentadoria do Faustão pode mudar suas perspectivas na TV Globo

Desculpem-me o trocadilho com a inspiradora história do leiteiro Tevje e sua família, na pequena aldeia russa de Anatecka, um conto de autoria de Scholem Aleichen, o grande escritor ídiche, a língua falada pelos judeus da Europa Central e Oriental. Com sua esposa Golde, ele tenta criar as filhas Tzeitel, Hedel, Chava, Shprintze e Bielke na melhor tradição judaica. Tevje e sua canção “Se algum dia eu ficasse rico” bombaram na estreia do musical “Um violinista no telhado” (Anatevka) na Broadway, em setembro de 1964.

Foi um verdadeiro espanto à época, porque o musical era em ídiche, uma mistura de alemão, hebraico e línguas eslavas, e lotou as sessões do Teatro Imperial da Broadway. O título original da adaptação é Fiddler on the roof (Um violinista no telhado). “Parece loucura, não é? Mas no nosso lugarejo Anatevka é assim. Cada um de nós é um violinista no telhado. Ficamos aqui, porque Anatevka é a nossa terra natal. E o que traz equilíbrio à nossa mente pode ser resumido numa palavra: tradição”, esclarece o protagonista da peça. Dirigido por Norman Jewison, com roteiro de Joseph Stein, a versão para o cinema, lançada em 1971, também fez grande sucesso e ganhou quatro Oscar: fotografia, som, direção de arte e trilha sonora.

Vinicius Torres Freire – Como Bolsonaro pode ganhar o jogo

- Folha de S. Paulo

Vítimas potenciais da Covid podem estar vacinadas até maio, economia despiora

A vacina do Brasil depende da boa vontade da China e da Índia. Ainda assim, não é descabido estimar que até meados de abril seja possível vacinar aqueles grupos de pessoas em que morrem 75% das vítimas de Covid-19 neste país.

Os adversários de Jair Bolsonaro deveriam prestar atenção nessa hipótese razoável, assim como deveriam moderar ilusões sobre uma catástrofe econômica que estaria para triturar o prestígio presidencial já em 2021.

Em primeiro lugar, as vacinas. Lá pela metade de abril, talvez tenha sido possível vacinar uns 38 milhões de pessoas, aquelas de 60 anos ou mais, pessoal da saúde e indígenas. É quase um quarto da população com mais de 18 anos.

A conta considera o limite inferior da produção do Butantan, o cronograma que a Fiocruz divulgou na sexta-feira (5), as doses já disponíveis e o 1,6 milhão de doses da Covax, chutando um desperdício de 5%, otimista. Podem vir mais doses: mais da Covax ou mais 28 milhões das vacinas russa e indiana que o governo diz negociar.

Se os insumos empacarem de novo na China, será mesmo um desastre. Pode ser também que abril esteja muito longe, revoltando os três quartos sem vacina até lá. No entanto, a perspectiva e o fato da redução do número de mortes devem causar alívio social e econômico. De resto, a vacinação continuará a partir de maio, quando 90% das vítimas potenciais da Covid podem estar imunizadas.

Janio de Freitas – A vitória é cara e não é tudo

- Folha de S. Paulo

Não sendo vitória política, dívida é igual a cobrança, e cobrança em política é incerteza e instabilidade

Os que viram o fim da possibilidade de impeachment na entrega da Câmara a comando bolsonarista, ou antes estavam esperançosos demais, ou agora estão conclusivos demais. Apesar da aparência, o que Bolsonaro obteve não foi uma vitória política. Antes e mais, está para negócio bem-sucedido, como podem ser os negócios que operam à margem dos formalismos legais.

Mas não faltaram os formalismos próprios de certa clandestinidade. E deles resultou que Bolsonaro está com centenas de dívidas, é provável que até perto de umas três, a pagar aos deputados que venderam seus votos por cargos e verbas. Bolsonaro não pagará essa dívida, não tem como pagá-la a mais do que uma parte dos credores.

Não sendo vitória política, fruto de liderança e não de corrupção, dívida é igual a cobrança e cobrança em política é incerteza e instabilidade. Já no primeiro momento da nova presidência, isso se mostrou: Arthur Lira não conseguiu assegurar a presidência da Comissão de Constituição e Justiça, a principal, à extremista Bia Kicis, como exigido por Bolsonaro no acordo de ambos.

Ainda assim, o butim de Bolsonaro deu-lhe o que queria —a obstrução do novo presidente a pedidos de impeachment (os problemas criminais da família, citados por muitos, na verdade transitam fora do Congresso, em mãos investigatórias e judiciais).

Hélio Schwartsman - A era da desinformação

- Folha de S. Paulo

O jornalismo precisa cuidado com o chamado 'outro lado' em controvérsias científicas.

Caro leitor, como você sabe que a Terra é redonda? Bem, você só sabe disso porque alguém lhe contou e você confia nessa pessoa.

Com efeito, nossa experiência do dia a dia é muito mais sugestiva de um planeta achatado do que de um arredondado. Não sentimos a esfericidade em nenhum de nossos deslocamentos ordinários. Só acreditamos na redondez porque foi o que nossos professores nos ensinaram, e essa é uma crença que a comunidade em geral sanciona.

Esse mecanismo de validação social se aplica não só ao formato do planeta mas também a quase todas as "verdades científicas". É um bônus (não precisamos refazer todas as descobertas de nossos antecessores) e um ônus (de vez em quando, ideias falsas, como a da existência de uma planta comestível com aspecto, cheiro e gosto de cordeiro, são aceitas como verdadeiras por séculos).

Bruno Boghossian – A direita abraça a extrema direita

- Folha de S. Paulo

Partidos estendem tapete para reeleição e tratam com mansidão até figuras mais reprováveis do bolsonarismo

A maioria dos deputados americanos decidiu excluir a republicana Marjorie Taylor Greene das comissões que ela integrava no Congresso dos EUA. Eles entenderam que uma extremista que propaga teorias da conspiração e apoia a violência contra políticos não deve exercer funções relevantes por lá.Eleita no ano passado, Greene defendia a rede de militantes lunáticos do QAnon. Ela afirmava que os atentados de 11 de Setembro eram uma farsa, que democratas participavam de rituais satânicos e que empresários judeus A deputada só vai ficar fora das comissões de orçamento e educação do Congresso porque os democratas votaram em peso para removê-la. 

Apesar do repertório delirante de Greene, 199 dos 211 parlamentares republicanos tentaram manter a O Partido Republicano aplaudiu por quatro anos um populista como Donald Trump e acreditou que conseguiria tirar proveito de sua presidência. Apesar de todos os prejuízos, esses políticos ainda são capazes de manter laços com radicais que compõem suas fileiras. Quando o establishment político começa a dar passos para as extremidades, os limites vão ficando para trás.

A maioria dos deputados americanos decidiu excluir a republicana Marjorie Taylor Greene das comissões que ela integrava no Congresso dos EUA. Eles entenderam que uma extremista que propaga teorias da conspiração e apoia a violência contra políticos não deve exercer funções relevantes por lá.

Bernardo Mello Franco - Triste fim da Lava-Jato

- O Globo

Na semana em que o bolsonarismo subiu ao altar com o Centrão, a Lava-Jato anunciou que deixa de existir. A nota divulgada na quarta-feira não causou surpresa nem comoção. A operação já havia caído no ostracismo, esvaziada pelo grupo político que ajudou a instalar no poder.

Lançada em 2014, a Lava-Jato prendeu dois ex-presidentes e colaborou com a eleição do atual. Ele mastigou seu maior símbolo, Sergio Moro, e nomeou um procurador de estimação para desmontar a força-tarefa.

O ex-juiz também contribuiu para o desmanche. Trocou a toga pelo palanque e se desmoralizou ao conviver com corruptos e milicianos. Quando tentou dar meia-volta, foi despejado do governo e massacrado nas redes. Hoje é sócio de uma consultoria que lucra com os resultados da operação.

A revelação dos diálogos entre Moro e os procuradores removeu o que restava do verniz ético da Lava-Jato. O ex-juiz tabelou com a acusação e comemorou denúncias contra réus que desejava condenar. A pretexto de combater a roubalheira, atropelou a lei e abandonou o dever da imparcialidade.

Conversas divulgadas nos últimos dias reforçam a afinidade entre os investigadores e o submundo bolsonarista. O procurador Januário Paludo concluiu que o sítio de Atibaia pertencia a Lula “porque a roupa de mulher era muito brega”. “Decoração horrorosa”, acrescentou. Deltan Dallagnol chamava o ex-presidente de “9”. Um deboche com o acidente de trabalho que deixou o petista com nove dedos nas mãos.

Míriam Leitão - O diplomata que virou pária

- O Globo  

No Itamaraty, a expectativa é a de que Ernesto Araújo deixe de ser ministro em março. Seria um alívio para várias gerações de diplomatas, porque ele feriu normas essenciais da boa diplomacia. Um dos problemas para tirá-lo é saber para onde ele pode ser removido. Ele gostaria de ir para Paris, mas o risco é o governo de Emmanuel Macron não dar o agrément, que é o consentimento do país que recebe. Outro risco é o de constrangimento em sessão do Senado, que recentemente rejeitou o nome do embaixador indicado para Genebra, num recado para Araújo. Por isso, uma das possibilidades aventadas é a OCDE, posto que não exige sabatina, já que é uma espécie de embaixador alterno.

Há uma maioria sólida de adversários de Araújo dentro da carreira, mas os últimos acontecimentos aumentaram a indignação. Os olhos dos diplomatas brasileiros acompanharam com estupefação a atitude de Ernesto Araújo na cena em que Jair Bolsonaro berrou palavras sórdidas contra jornalistas numa churrascaria. O ministro aplaudiu, deu gargalhadas, gritou “mito”. Isso provocou repulsa generalizada. Não é nem mais uma questão de gostar ou não do governo, disse uma fonte diplomática, aquilo aviltou a própria Casa, até porque houve matérias no exterior descrevendo a baixeza da cena.

José Sarney* - A crise da democracia representativa

- Blog do Noblat / Veja

Assistimos à destruição do único instrumento que assegura a estabilidade dos governos, os partidos políticos

Uma crise que já vinha se arrastando há bastante tempo era a perda de prestígio dos parlamentos do mundo inteiro, sujeitos a crítica permanente sobre a eficiência das instituições e a conduta dos representantes.

No Brasil, essa crise estava superposta à outra muito mais grave, a desorganização administrativa das duas Casas, Câmara dos Deputados e Senado Federal. Recordo-me que, quando assumi a Presidência do Senado pela primeira vez, em 1995, o registro da presença dos senadores era feito pela portaria, à proporção que iam entrando na Casa. Isso fazia que o plenário ficasse quase sempre vazio, embora houvesse o pagamento integral, sem desconto, das diárias que regimentalmente eram calculadas pelo comparecimento às sessões plenárias, gerando crítica permanente da imprensa. O Diário do Congresso era publicado com grande atraso, e eu naquele tempo encontrei o Senado com as atas atrasadas seis meses. Não se sabia que matérias seriam discutidas, porque não existia pauta antecipada: ela era feita na véspera das sessões. Corrigimos então esses problemas fazendo o registro em plenário, durante as sessões, e programando, juntamente com as lideranças e com muita antecedência, a pauta.

Com o advento da internet, estes problemas se agravaram, pois era um novo instrumento de fiscalização e crítica das duas Casas. Discutia-se muito, não só no Brasil como no exterior, que com o seu crescimento, passando a ser fortemente digital, a mídia entrou como novo interlocutor da opinião pública. E se perguntava: quem representava a opinião pública era o Parlamento, cujos representantes eram eleitos de quatro em quatro anos, ou a mídia, que exercia vigilância diária e daria legitimidade às votações das matérias controvertidas? Era a famosa “voz das ruas”, que existia desde séculos e que agora tinha ganhado nova formatação.

Somava-se a esta outra crise, a dos partidos políticos. No Brasil, sobretudo porque o regime militar tinha tomado o que considero sua pior decisão: a extinção dos partidos políticos tradicionais, criando por decreto dois partidos, o MDB e a Arena.

Cristovam Buarque - Desorientação dos terracubistas

- Blog do Noblat / Veja

Os partidos progressistas não sabem para onde ir

Em recente entrevista, o ex-presidente Fernando Henrique disse temer que o PSDB esteja em decadência. Na verdade, seu partido está desorientado, tanto quanto os demais partidos democratas progressistas, de centro ou de esquerda. Eles não entendem, ou não aceitam, que suas ideias e propostas perderam prazo de validade diante das mudanças que ocorrem na história; ou tentam se adaptar de maneira incompleta.

Percebem que o Estado tem limitações de recursos, mas não sabem como atender às necessidades sociais sem gastar além dos limites responsáveis. Não sabem como colocar a solidariedade necessária dentro da aritmética possível.

Descobriram os limites ecológicos ao crescimento, mas não conseguem oferecer um tipo de bem-estar que substitua a ânsia pelo consumo. Não conseguem colocar o PIB dentro da ecologia.

Luiz Sérgio Henriques* - Raimundo Santos, um homem e suas obsessões

Ao nos deixar no dia 19 de outubro deste infausto 2020, Raimundo Santos, intelectual discreto e operoso, extremamente fiel aos seus temas de eleição e às convicções de toda uma vida, deixa um legado precioso de coerência, generosidade e solidariedade. Ele era um daqueles intelectuais que se juntaram na revista Presença, nos anos 1980, aferrados ao patrimônio “eurocomunista” à brasileira. Homens e mulheres diferentes entre si, com variada inserção na vida política e acadêmica, mas reunidos pelo empenho de indagar como é que o seu peculiar comunismo podia servir ao País, como é que se poria a serviço da grande causa democrática, sem se perder em discussões doutrinárias tão ao gosto de muitas correntes do marxismo e, inevitavelmente, do próprio PCB.

Tendo estudado Ciência Política na Flacso (Faculdade Latino-Americana de Ciências Sociais) e se doutorado na Unam (Universidade Nacional Autônoma do México) ainda nos tempos do exílio, Raimundo por quase dez anos seria professor da Universidade Federal da Paraíba (em Campina Grande), transferindo-se depois para a Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro, especificamente para o CPDA (Programa de Pós-Graduação de Ciências Sociais em Desenvolvimento, Agricultura e Sociedade).

No CPDA, a sala do Raimundo, atulhada de livros e papéis de todo tipo – ele que, entre outras coisas, se autointitulava um “revisteiro” e era um dos principais responsáveis pela revista Estudos Sociedade & Agricultura –, a sala do Raimundo, dizia, tinha na parede um retrato de Ivan Ribeiro, precocemente falecido com o ministro da Agricultura, Marcos Freire, em desastre de aviação. Ivan, outro professor do CPDA como ele, outro singular comunista como todos nós, pouco afeito a proclamações revolucionárias e mais envolvido na aposta de uma lenta e constante democratização dos processos societais. Havia naquele retrato do Ivan, pendurado na salinha do Raimundo, um sentido altíssimo de continuidade e de fidelidade, que se impunha de modo forte, mas silencioso e sem afetação. Era preciso continuar o Ivan, assim como se devia preservar/superar o legado de gente como Alberto Passos Guimarães, Nelson Werneck Sodré e, em especial, Caio Prado Jr.

O velho Partidão havia passado e se impunha aceitar realisticamente este fato. Organismos históricos nascem, vivem e num certo momento perdem a razão de ser, não importa a marca que tenham deixado em momentos críticos da História ou que esta mesma História não possa ser contada sem eles. No entanto, para Raimundo o pecebismo sobrevivia ao partido e devia seguir de pé, inspirando a ideia da centralidade da política, a necessidade vital de fazer política para além de rígidas demarcações classistas, mas sempre em benefício dos setores subalternos que dependem essencialmente das formas democráticas para ter condições dignas de vida material e espiritual. E o objetivo de fazer sobreviver uma tradição toda atenta à política só poderia ser o de levar a esquerda, ou a nossa parte da esquerda, a sair de guetos minoritários e a participar plenamente da vida nacional, influenciando-a no sentido semelhante àquele apontado, décadas a fio, por Caio Prado Jr. – a nacionalização da economia e da sociedade, a internalização dos centros decisórios, o atendimento das carências da maioria da população. Tudo isso num contexto de reformas graduais e incessantes, a serem conduzidas dentro da legalidade e da ordem constitucional, fora das quais, para Raimundo, pode até haver salvadores da pátria, mas nunca salvação nem risorgimento nacional.

O lema gramsciano, aqui, não é por acaso. Raimundo era devotado leitor do famoso Caderno 19 do pensador sardo, um caderno voltado para as vicissitudes da formação tardia da nação italiana, conduzida, como se sabe, pelos conservadores do “partido cavouriano”. Por terem uma consciência mais elaborada de si mesmos e de todos os demais atores, eram capazes de se pôr à frente da unificação e, por isso mesmo, dirigir a ala esquerda do movimento segundo os ditames da revolução passiva – categoria sofisticadamente revista e atualizada por Gramsci, a partir de processos de transformação frustrados total ou parcialmente, como foi o caso do próprio Risorgimento. Para Raimundo, no entanto, havia aqui uma preciosa sugestão inerente à possibilidade de trocar o sinal daquele tipo de revolução, transformando-a de signo de fraqueza das forças mudancistas em sabedoria tática e visão estratégica, em capacidade de estabelecer “alianças pluriclassistas”, que, ao fim e ao cabo, implicariam uma ideia bastante inovadora da mudança social contemporânea. O socialismo, para usar a palavra incandescente, agora passaria a ser entendido como “um processo desdramatizado de reforma da sociedade, que se construiria numa dialética complexa e de muitas mediações entre gradualismo e ruptura, a partir da plena aceitação da alternância no poder, em processos falibilísticos de avanços e recuos” (Caio Prado Jr. na cultura brasileira, Rio de Janeiro, 2001, p. 262). Se bem observarmos, nesta e em muitas outras passagens o contido “marxismo da revolução passiva” sustentado por nosso autor era, e ainda é, uma revolução copernicana muito distante de ser plenamente entendida no campo progressista, que não raro se atrapalha com caudilhos e miragens rupturistas.

O que a mídia pensa: Opiniões / Editoriais

Crime e castigo – Opinião | O Estado de S. Paulo

A má conduta de Bolsonaro é amplamente documentada. Não é exagero considerar que várias de suas ações podem constituir crime de responsabilidade.

A Procuradoria-Geral da República (PGR) abriu investigação preliminar para verificar se há indícios de que o presidente Jair Bolsonaro e o ministro da Saúde, Eduardo Pazuello, cometeram “práticas delitivas” na atuação do governo federal no combate à pandemia de covid-19. No mesmo dia, um grupo de senadores entregou um pedido de abertura de Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) também para investigar a atuação do governo. A comissão já é chamada de CPI da Covid.

Como se sabe, Bolsonaro passou os últimos meses dedicando-se a construir uma blindagem tanto na PGR como no Congresso, razão pela qual não são pequenas as chances de que ambas as iniciativas deem em nada.

No primeiro caso, o procurador-geral da República, Augusto Aras, indicado para o cargo por Bolsonaro, informou que a abertura da investigação é apenas praxe, isto é, não significa, por ora, que haja indícios de que Bolsonaro e Pazuello cometeram algum dos crimes apontados no pedido, feito por deputados do PCdoB.

Os parlamentares acusam o presidente e o ministro da Saúde de prevaricação e de colocar em perigo a vida e a saúde dos brasileiros. O foco é o drama dos moradores do Amazonas e do Pará, onde dezenas de doentes de covid-19 morreram asfixiados por falta de oxigênio nos hospitais, sem que isso despertasse especial mobilização do governo federal. “O descompromisso de Bolsonaro e Pazuello com o enfrentamento à Covid-19 deixou gestores locais à deriva, tendo que administrar por conta própria fluxos e demandas que, via de regra, dependem de uma lógica conjunta – a mesma que orienta o Sistema Único de Saúde (SUS), que opera de forma tripartite, envolvendo União, Estados e municípios”, informa a ação.

Poesia | Joaquim Cardozo - Os mundos paralelos

Existe um EU dentro de mim
que não me pertence
não é meu.

Mas pode estar em mim;
do outro lado de mim.
Lado que comigo não tem contato.
Um EU antagônico para o meu ser de agora
Agora e agônico.

O que faço está mais além desfeito:
É um fazer contrafeito que morre
E renasce, depois, no meu peito.

Nada me vem contra o que está de mim vizinho.
O que me vem é contra o que de eterno em mim me oprime
— Aquilo que está no que era de outra vez;
E que esteve noutro sentido e ainda perdura e se antepõe
E que me destrói, me impõe, me presume e suprime.

Todos os meus atos são atos reflexos
No projetivo espelho tempo/espaço, no fechado não denso.
Correspondência injetiva, deprimente, fria, de interno entorno.

Ouço a voz paralela a minha voz,
Ouço o canto que é um eco do que, outrora, foi meu.
Em conflito com o que poderia ser silêncio
Se este pudesse fluir lentamente como o tempo
E ser, se pudesse, confundidamente tempo-silêncio

No que aqui é doce, no paralelo é amargo
No que aqui é macio no paralelo é áspero
Mundo paralelo!
afogar
Nele é que vou me apagar, me sumir, me perder,
Me esconder, para sempre, no esquecer.
Noitemente amanhecer.

In: CARDOZO, Joaquim. Poesias completas. 2.ed. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 1979. p.160-161.