terça-feira, 1 de junho de 2021

Opinião do dia: Fernando Henrique Cardoso*

E este é um dos problemas: não basta existir um regime democrático, é preciso construir uma cultura democrática que torne os cidadãos mais confiantes no valor das regras e faça com que elas sejam reivindicadas e cumpridas nos comportamentos e falas desses cidadãos.

*Fernando Henrique Cardoso, sociólogo, ex-presidente da República. “Um intelectual na política”, p. 195. Editora Companhia das Letras, 2021.  

Merval Pereira - Mais circo que pão

- O Globo

Aparentemente, não foi preciso subornar ninguém para trazer a Copa América para o Brasil, depois que países vizinhos, todos envolvidos em crises sanitárias e políticas, ficaram inviabilizados como sede de um torneio de futebol que pode não ter importância maior, mas que, na hora do vamos ver, fará com que os torcedores esqueçam a irresponsabilidade que é organizá-la num país às vésperas de uma terceira onda da Covid-19, com 463 mil mortes nas costas e 14 milhões de desempregados.

Uma jogada diabólica de Bolsonaro, em sentido político, mas também quase literal, dado o perigo de disseminação do vírus. A camisa verde e amarela da seleção brasileira, apropriada indevidamente pelos bolsonaristas, estará espalhada pelo país, dando a ilusão de que os adeptos do presidente são mais numerosos do que na realidade. Desde a Roma Antiga, pão e circo são fatores políticos fundamentais, aqui no Brasil temos hoje mais circo do que pão na mesa do cidadão comum, com a inflação e o desemprego em alta.

Carlos Andreazza - De miado em miado

- O Globo

O fanfarrão Jair Bolsonaro foi ao Supremo contra os decretos por meio dos quais governadores estabeleceram medidas restritivas de circulação. Nisso — num miado de gatinho — transformou-se aquele decreto valentão, que já estaria pronto, com que o presidente ameaçava sustar atos de governantes eleitos, atos todos submetidos a controle de constitucionalidade, atos legítimos de governadores que trata como tiranos usurpadores de liberdades individuais. Blá-blá-blá.

Não é novidade que Bolsonaro, o jactancioso, joga para a galera. Não pode ser novidade que sua condição de bravateiro não lhe exclui o caráter de autocrata em campanha permanente contra o equilíbrio institucional. As coisas se combinam, a primeira frequentemente camuflando o alcance da segunda. Já escrevi sobre o movimento pendular em que opera o presidente-caô. Enquanto, na ponta do mundo real, pressionado pela imposição da realidade, precisa ceder à aquisição de vacinas, filia-se ao Patriota e depende de Arthur Lira, Valdemar Costa Neto e de Roberto Jefferson, na outra extremidade, a delirante, arma discurso inflamado para alimentar, com compensações retóricas radicalizadas, sua base social sectária.

Zuenir Ventura - Até aqui tudo bem

- O Globo

Ou quase. Porque acho que só comigo vai tudo azul, como diz a canção de Caetano. Em redor, não se pode dizer o mesmo. Do ponto de vista pessoal, não tenho do que me queixar. Só nos últimos dez dias, além das lives, dei mais entrevistas que no ano inteiro — forma encontrada por mais de uma dezena de jornais e rádios do país para me homenagear pelos 90 anos. Se eu soubesse que receberia tanto carinho, teria feito antes. Ancelmo Gois, que é um gozador, diante de minha alegre disposição, previu que, pelo jeito, estes são “os primeiros 90 anos”.

Porém seria preciso ser muito insensível para se considerar completamente feliz vivendo num estado em que uma “gripezinha” já exterminou 50 mil pessoas e num país em que ela está fazendo o mesmo com mais de 460 mil. E que vive também um inédito acúmulo de crises: crise sanitária, com a pandemia; socioeconômica (com quase 15 milhões de desempregados); política (com um capitão desastrado e seu “gordinho” sinistro); ambiental (com o ministro do Meio Ambiente suspeito de contrabando de madeira da Amazônia).

A última notícia infausta atingiu diretamente a imprensa e em especial a mim: a morte de Mílton Coelho da Graça, o melhor exemplar de nossa geração, à memória de quem rendo a seguir minha homenagem.

Renan Calheiros* - O eclipse do negacionismo

- O Globo

O trabalho da CPI para iluminar os escombros, resgatar a verdade e inculpar eventuais responsáveis é longo e promissor. Os timoneiros são os fatos. Em respeito ao direito de defesa, ao contraditório, é prematuro apontar os culpados pelo morticínio. Mas já é possível, com dados sujeitos a confirmação, fazer um balanço parcial. O saldo revela quanto a omissão, dolosa ou não, impactou as mortes e perdas irreparáveis. Cada ato deliberado e negacionista, cada equívoco, cada sabotagem à ciência se eternizou em mortes.

Após a primeira etapa de depoimentos, podemos afirmar que milhares de vidas poderiam ter sido preservadas com escolhas sensatas, responsáveis e científicas. Ao fim dos trabalhos, teremos como quantificar o número de óbitos evitáveis, que redundaram em lágrimas e destruição de famílias. A estatística assombrosa poderia ter sido atenuada se maiores tivessem sido a compreensão e o engajamento do governo. As escolhas vão desde a compra tempestiva de vacinas até recomendações elementares, como distanciamento, uso de máscaras, ações orgânicas com estados e renda digna e continuada para quem precisa.

Guilherme Amado - Governo Bolsonaro faz água e sangrará mais em alguns meses

- Metrópoles 

Duas notícias vão agravar ainda mais essa crise, uma em julho e outra em setembro.

Quase meio milhão de pessoas foram às ruas no sábado, dia 29 de maio, e acrescentaram mais um ingrediente a uma crise que vem crescendo faz tempo. Cabe lembrar que essas pessoas ainda não estão totalmente vacinadas, ainda sentem medo de se aglomerar e ficam receosas de ir às ruas. Mas mesmo assim foram protestar contra o presidente.

Bolsonaro vem, de pouco a pouco, perdendo o controle de áreas do governo.

Primeiro, na Polícia Federal, houve a insurgência de um delegado, superintendente da PF no Amazonas, contra o ministro do Meio Ambiente.

Esse delegado foi afastado, mas depois, sem que o diretor-geral da Polícia Federal e que o procurador-geral da República, Augusto Aras, aliado de Bolsonaro, fossem avisados, a PF pediu a Alexandre de Moraes, que deu a ordem para uma operação de busca e apreensão contra Ricardo Salles.

Ricardo Noblat - A palavra final sobre a Copa América no Brasil será de Lewandowski

- Blog do Noblat / Metrópoles

Em meio a uma pandemia que matou mais de 460 mil pessoas, infectando 16,5 milhões, Bolsonaro quer futebol para distrair

anúncio que a Copa América, um torneio caça-níquel, será realizada no Brasil, este ano, não foi “coisa para a internet”, como disse o general Eduardo Pazuello, ex-ministro da Saúde, para justificar arroubos do presidente Jair Bolsonaro e decisões que o mandatário toma e volta atrás no momento seguinte.

De vez que a Argentina e a Colômbia recusaram-se a sediar o evento, o presidente da Confederação Sul-Americana de Futebol telefonou para o presidente da Confederação Brasileira de Futebol, que telefonou para Bolsonaro, que em 10 minutos comprou a ideia, acionou ministros e deixou vazar a informação.

Não contava, porém, com o tamanho da onda negativa que se levantaria contra ele nas redes sociais, na mídia em geral e dentro do Congresso. Como realizar um evento desse porte em um país à espera do recrudescimento da pandemia que matou até agora mais de 462 mil pessoas, infectando 16,5 milhões?

Carlos Melo* - O outro lado da rua surgiu na foto

- O Estado de S. Paulo

No delicado momento de pandemia, foi Jair Bolsonaro quem acionou o dispositivo das ruas. Insistiu em mostrar força e pouco caso com a Covid-19. Natural que cedo ou tarde o antibolsonarismo revidasse, na convicção de que mais letal que o vírus é a postura do presidente. A resistência explodiria inevitavelmente e retiraria o monopólio que ilusoriamente o bolsonarismo acreditava ter sobre o que chama de “povo”.

As jornadas do antibolsonarismo não devem parar por aí. Quem vacinado foi às ruas tende a repetir a dose; quem, sem a vacina, correu riscos continuará com a mesma disposição. E quem por falta de vacina se absteve, vacinado, pode aderir a novos protestos. A paisagem se alterou, o lado da Rua que faltava surgiu na foto.

Pedro Fernando Nery* - O plano Lula

- O Estado de S. Paulo

Apesar de moderno, plano Lula ignora a infância no documento de mais de 200 páginas

Há um ano o PT anunciou o “Plano Lula para o Brasil”, que seria elaborado ao longo de 2020 como um conjunto de propostas para o País. A partir do final do ano, o que foi formalmente chamado de “Plano de Reconstrução e Transformação do Brasil” foi apresentado em lives com o ex-presidente Lula. De lá pra cá Lula ficou elegível e disparou nas intenções de voto para 2022. Se é cedo para especular planos de governo, o Plano Lula é o documento que melhor se aproxima de um: passados mais de dez anos desde que saiu do governo, que ideias norteariam um novo governo Lula? O que é novo? E velho?

Há um bom número de propostas com a cara de millennials no documentado elaborado pelo que parece uma oxigenada Fundação Perseu Abramo – braço do partido que está sob nova direção. Há protagonismo para a mudança climática: estão ali propostas por um New Deal Verde e a tributação do carbono – um tema atual, mas esquecido nas atuais discussões da reforma tributária. 

Também se defende taxar álcool, açúcares e gordura. É uma simpática lembrança dos hiatos entre a tecnocracia e os políticos: Lula tem prometido churrasco e cerveja quando critica os preços atuais. Os técnicos querem mais tributos para o carbono do boi, sua carne e os componentes da bebida (frise-se que as propostas estão em linha com o que tem se praticado em países desenvolvidos).

Ana Carla Abrão* - Não temos tempo a perder

- O Estado de S. Paulo

Parte do mundo pode experimentar algo próximo do normal, mas Brasil não está incluso

A vacinação é a forma mais rápida, mais eficaz e menos custosa de diminuir a contaminação, reduzir o número de mortes e promover a retomada da economia. A isso, finalmente, até os negacionistas (de hoje ou de outrora) se renderam. Muito nos custa ainda essa longa via de convergência, mas aqui estamos.

Países onde a vacinação foi prioridade nacional, como IsraelReino Unido ou os Estados Unidos de Joe Biden e Kamala Harris, já experimentam a volta à normalidade. Com a maior parte da população-alvo vacinada, não é de se surpreender que os índices econômicos reajam rapidamente e as perspectivas revertam o movimento de queda obstinada observado nesses longos meses de pandemia. Junte-se a isso a perspectiva de retomada integral das atividades escolares no próximo semestre e a contenção na escalada dos problemas de saúde mental observados nos últimos meses. Tem-se a sensação de que parte do mundo pode, finalmente, experimentar algo próximo do normal.

Mas esse mundo não contém o Brasil, ao menos não por ora. Apesar de termos um dos sistemas mais eficientes de vacinação do mundo, a escassez de vacinas – só explicada pela desídia do governo federal em investir nesse caminho – responde pela lentidão e relativa timidez da nossa recuperação. Há mais o que fazer mesmo na escassez, como bem mostrou Daniel Leischsenring em recente artigo no Brazil Journal. Segundo cálculos do autor, tivemos uma redução de 32% no ritmo de vacinação em maio, se comparado ao pico de abril, apesar de uma disponibilidade de vacinas que nos permitiria dobrar o ritmo atual.

Paulo Hartung* - Educação profissional e tecnológica, demanda e oportunidades

- O Estado de S. Paulo

Este é um momento decisivo. Nunca foi tão importante investir na formação da juventude

 “Adolescente, olha! A vida é bela! A vida é bela... e anda nua... Vestida apenas com o teu desejo.” O alerta poético de Mario Quintana aos jovens sobre a importância do desejo na construção da vida merece um olhar atualizado dos que tornam viável um dos mais decisivos meios para a efetivação dos sonhos da juventude, a educação.

Nesse sentido, é preciso que o País abra espaço e avance de forma efetiva na seara da educação profissional e tecnológica, uma estratégica oportunidade a mais que se deve somar às possibilidades de construção do futuro de nossas atuais e próximas gerações de brasileiras e brasileiros. A revolução que testemunhamos no paradigma produtivo oferta novidades e oportunidades à formação profissional e, em consequência, ao mundo do emprego e da renda. Mas essas possibilidades, que ecoam tanto no campo da demanda por mão de obra atualizada quanto no universo desejante dos mais novos, ainda não encontram suficiente acolhida no nosso sistema educacional.

Os dados sobre educação e juventude no Brasil são alarmantes: apenas 20% da população de 18 a 24 anos cursam o ensino superior. O restante, sem qualificação, ocupa postos precários ou engrossa as estatísticas de desemprego, que chega a 30% nessa faixa etária, o dobro da média geral. A pandemia agravou o quadro, levando 4 milhões a abandonar os estudos no ano passado. De acordo com o Datafolha, dos que estavam no ensino médio, 26% não têm intenção de voltar. A evasão mais que dobrou no período, passando de 4,8% a 10,8%.

Andrea Jubé - O Brasil respira, mas falta ar para todos

- Valor Econômico

Queiroga admite crise de oxigênio em Pernambuco

Está tudo fora da ordem mundial no combate à pandemia. No momento em que os brasileiros voltam a se assustar com a falta de oxigênio, o governo oferece o país como palco para um campeonato de futebol, a esquerda ocupa as ruas após criticar apoiadores do governo pelo mesmo comportamento, e o presidente da República aciona no Supremo Tribunal Federal três governadores que tentam conter o avanço do vírus, quando é remota a oferta de vacinas para todos.

São três movimentos inoportunos em uma realidade em que o país não respira sem a ajuda de aparelhos, e os cientistas alertam para uma terceira onda da pandemia que se avizinha. Não faz dois meses desde o dia 4 de abril, quando o Brasil bateu o recorde de óbitos pela doença: 4.211 vítimas fatais em 24 horas.

Há cinco dias, 17 pacientes tiveram que ser transferidos às pressas do hospital público municipal de Lajedo, município de 40 mil habitantes na região agreste de Pernambuco, para não morrerem asfixiados. O episódio foi grave, e acendeu o sinal amarelo no Estado, que já está em “lockdown” parcial.

Luiz Gonzaga Belluzzo* - Primeiro, o Um; depois, o Dois

- Valor Econômico

A crise econômica, social e política só vai recuar se as intolerâncias forem dissolvidas no compromisso

Nelson Jobim foi escolhido por Ulysses para acompanhar a elaboração da Constituição nos idos de 1988. Lembro-me bem de sua faina em aperfeiçoar a redação de artigos, parágrafos e incisos que seriam debatidos nas plenária da Assembleia Constituinte.

Jobim voltou a exercer a força democrática que habita seu espírito ao convidar Lula e Fernando Henrique para um jantar. Não sei como foi a degustação das iguarias, mas o noticiário sobre a ágape exalou uma brisa reconfortante nesse momento de maus odores na Terra Brasilis.

Na posteridade do evento não faltaram os narizes torcidos dos partidários do Um e do Outro. Torcer o nariz não é tão grave quanto tapar o nariz diante do Outro Semelhante. Uns e Outros certamente tiveram de conviver com repulsas explicitadas em gestos de tapar o nariz quando o Outro se atreve a frequentar os ambientes supostamente reservados para os “homens bons”. Pois foi o que aconteceu no elevador de um famoso e eficiente hospital de São Paulo. Carregada em uma cadeira de rodas, a senhora de cabedais tapou o nariz quando um enfermeiro negro ousou entrar no transportador.

Falar em Ulysses Guimarães desperta imediatamente a lembrança de seu apego à multidão de Outros. Em um domingo paulistano, logo após a derrota das eleições diretas, Ulysses reuniu mais uma vez em sua casa os que estiveram com ele no combate persistente contra a ditadura. Vou invocar aqui o testemunho dos meus amigos João Manuel Cardoso de Mello, Luciano Coutinho e José Gregori. Também me recordo da presença de Fernando Henrique Cardoso.

Ulysses levantou-se e respondeu aos que tentavam convencê-lo das conveniências da disputa no Colégio Eleitoral. Dentre tantas, guardei as frases que provocaram lágrimas em sua mulher, Dona Mora, sentada em um sofá mais distante da pequena aglomeração de companheiros de seu marido. “Para o Colégio Eleitoral eu não vou. Seria uma facada nas costas do povo que se mobilizou nas praças e nas ruas para participar dos comícios pelas Diretas Já. Digo a vocês, a conquista da democracia não será completa sem a manifestação da vontade popular”.

Hélio Schwartsman - Bolsonaro sangraria até 2022?

- Folha de S. Paulo

Parece-me precipitado contar com um Bolsonaro exangue em 2022

Os protestos de sábado não disseram nada que já não soubéssemos pelas pesquisas: hoje a maioria dos brasileiros desaprova o governo de Jair Bolsonaro. Mas, como certas pessoas são incapazes de entender um texto se ele não estiver acompanhado de um desenho, as manifestações tiveram papel didático.

Dado, porém, que a epidemia não foi embora e há sinais de que irá agravar-se nas próximas semanas, sugiro aos organizadores que, para as próximas edições, adotem a greve geral como forma de protesto. Ela tem longa tradição nas esquerdas e contribuiria para restringir a circulação do vírus em vez de ampliá-la.

A grande questão diante das oposições é se vale a pena insistir no impeachment de Bolsonaro ou se é melhor enfrentá-lo nas urnas. Lula pode até dizer que defende o afastamento, mas sua chance de voltar ao Planalto é numa disputa contra Bolsonaro. Sem o fantasma do capitão reformado, a alta rejeição do líder petista volta a dar as cartas.

Cristina Serra - Imprensa, protestos e pandemia

- Folha de S. Paulo

Manifestações mostram que parcela significativa da sociedade se moveu

As capas dos jornais O Globo e O Estado de S. Paulo, no último domingo, vão figurar na história da imprensa como exemplos do que não deve ser feito no jornalismo. Milhares de pessoas saíram às ruas, em 200 cidades, em repúdio a Bolsonaro e à sua política de extermínio, que arrastou para o cemitério quase meio milhão de brasileiros.

As manifestações mostram que parcela significativa da sociedade, finalmente, se moveu. Apesar do medo, arriscou-se a sair de casa, tentou se proteger da melhor maneira possível e foi às ruas: para protestar, para compartilhar seu luto, suas dores e suas perdas, mas também sua força e sua esperança de vislumbrar um horizonte azul no meio dessa tormenta sem fim.

Alvaro Costa e Silva -Vacina e impeachment

- Folha de S. Paulo

Oposição nas ruas em meio à pandemia recupera território da extrema direita

Com a popularidade em queda e tendo pesadelos e alucinações com Lula, Bolsonaro queimou a largada para 2022. Na semana passada, deixou Brasília entregue ao gabinete paralelo que cuida do enfrentamento da Covid e agora da realização da Copa América para cumprir agenda oficial em São Gabriel da Cachoeira (AM). Inaugurou uma ponte de madeira de 18 metros de comprimento e 6 metros de largura, pinguela sobre um igarapé, numa estrada de terra pouco usada.

Em outro ato de campanha, promoveu aquele desfile de motos a favor do vírus na orla do Rio —algo tão macabro que teve efeito reverso. Bolsonaro conseguiu o que parecia improvável em meio à pandemia. Fazer com que a oposição, em resposta, saísse às ruas, território que até então era exclusivo da extrema direita com suas pautas antidemocráticas.

Joel Pinheiro da Fonseca - A volta do impeachment?

- Folha de S. Paulo

Ou mais cidadãos levantam essa bandeira ou não adianta reclamar depois

Defendo o impeachment de Bolsonaro desde março de 2020, quando ele disse ter provas de que as eleições de 2018 foram fraudadas.

Esse tipo de ataque frontal a outro Poder não pode ser tolerado. Concedo, contudo, que suas ações de lá para cá na pandemia foram muito mais graves.

Pela sabotagem ao isolamento social e ao uso de máscara, pela negligência na compra de vacinas (imaginem como estaríamos na vacinação não fossem os esforços do Governo de São Paulo), pela promoção de um remédio ineficaz como se fosse panaceia. Já estamos no top 10 mundial em mortes por milhão de habitantes nessa pandemia e continuamos subindo.

Os protestos de sábado, prudentes ou não do ponto de vista da saúde pública, reacenderam a esperança do impeachment. Foram grandes —ao menos o de São Paulo— e fizeram o Planalto estremecer.

Bolsonaro chegou ao poder atacando o establishment, mas agora é (ou melhor, revelou-se) parte dele.

Mirtes Cordeiro* - O Dia do Basta!

- Blog Falou e Disse

Estaremos vigilantes, porque a vontade de viver é bem maior que o medo!

Foi bonito, demais…

Se por um lado não devia, por outro era necessário, afinal de contas nosso povo só é escutado quando sai  às ruas, a história tem demonstrado.

As ruas de mais de 200 cidades em 24 Estados brasileiros ficaram cheias de esperança; pessoas nas ruas em defesa da vida.

As pessoas saíram às ruas em defesa de se ter vacinas contra um vírus que vem matando indiscriminadamente mães, pais de famílias, jovens, crianças, não apenas por sua letalidade, mas porque o presidente da República não comprou as vacinas no tempo certo, nem permitiu que institutos como o Butantan as fabricasse, propagando as suas decisões em suas lives pessoais.

Foi o Dia do Basta!

Dia em que o povo saiu às ruas porque passou a ter mais medo do mandante de plantão do que do vírus, como anunciavam alguns cartazes exibidos nas caminhadas.

Dia em que o povo começou a se despir da apatia que tomou conta deste país, desde a eleição de 2018, e se confrontou com um governo que lhe vem arrancando um a um todos os seus direitos, até chegar ao ponto de negar o direito à vida.

O que a mídia pensa: Opiniões / Editoriais

EDITORIAIS

As manifestações contra Bolsonaro

O Estado de S. Paulo

Foram muito significativas as manifestações do sábado passado contra o presidente Jair Bolsonaro, não somente em razão da dimensão – houve passeatas em quase todas as capitais e no Distrito Federal, além de cidades menores – e da numerosa participação, mas principalmente pela realização, em si mesma, do protesto.

Afinal, não é trivial ir às ruas para expressar descontentamento com o governo em meio a uma pandemia, que dá todos os sinais de um novo recrudescimento. Até agora, as ruas eram uma espécie de monopólio da militância radical bolsonarista, desde sempre à vontade para desafiar as orientações sanitárias para demonstrar seu apreço por Bolsonaro e sua hostilidade às instituições democráticas.

Já a oposição ao presidente, com a fundada preocupação de que aglomerações poderiam contribuir para a disseminação ainda maior do vírus, demorou a mobilizar os muitos descontentes com Bolsonaro; afinal, não era uma decisão fácil ir às ruas depois de passar meses criticando os bolsonaristas e o presidente por incentivarem ajuntamentos irresponsáveis. Como resultado dessa hesitação, os bolsonaristas investiram na narrativa segundo a qual as manifestações promovidas por eles – sem nenhuma resposta da oposição, salvo inócuos panelaços – provavam que o “povo” estava com o presidente.

Mas isso agora mudou. A detalhada exposição pública, na CPI da Pandemia, da irresponsabilidade do governo Bolsonaro na condução da crise certamente encheu muitos brasileiros de vergonha. Ao mesmo tempo, o presidente mais uma vez causou indignação ao participar ativamente de um comício no Rio de Janeiro em que a pandemia foi ignorada, coadjuvado pelo sorridente ex-ministro da Saúde Eduardo Pazuello, símbolo da desídia na administração da pandemia.

Essa caracterização explícita do desprezo bolsonarista pelos brasileiros em geral parece ter sido a gota d’água que levou parte dos grupos de oposição a Bolsonaro a deixar de lado a prudência e convocar manifestações de rua.