terça-feira, 2 de setembro de 2025

O que a mídia pensa | Editoriais / Opiniões

Julgamento de Bolsonaro reflete força da democracia

O Globo

Pela primeira vez em 135 anos de República, acusados de golpe de Estado estarão no banco dos réus

O julgamento que começa hoje no Supremo Tribunal Federal (STF) não tem precedente. Pela primeira vez em 135 anos de República, um ex-presidente e militares das mais altas patentes responderão por tentativa de golpe de Estado. A conjuntura global torna o fato ainda mais notável. Os Estados Unidos, outrora bastião dos ideais republicanos e democráticos, têm, sob Donald Trump, adotado rumo preocupante na direção do autoritarismo. A Primeira Turma do STF começará a julgar Jair Bolsonaro e os demais implicados na intentona sob os olhos do planeta e sob pressão do governo americano. Em tal contexto, torna-se essencial a mensagem que o Supremo transmitirá. É preciso que ela reflita sobriedade, o exame técnico das provas, o escrutínio aprofundado das acusações e, acima de tudo, justiça.

Dia histórico, por Merval Pereira

O Globo

Julgamento produzirá uma decisão da mais alta Corte de Justiça do país que deverá ser acatada por todos, inclusive pelos militares

Começa hoje um julgamento que entrará para a História do país por suas características absolutamente inéditas. Da redemocratização até hoje, o Brasil teve nove presidentes da República, e três vices assumiram por questões distintas. José Sarney assumiu no lugar de Tancredo Neves, que morreu sem tomar posse; Itamar Franco e Michel Temer assumiram porque os presidentes eleitos, Fernando Collor de Mello e Dilma Rousseff, foram impedidos pelo Congresso depois de processos comandados pelo Supremo Tribunal Federal.

Dos nove, quatro foram presos: Lula e Temer, já soltos, Collor, que cumpre pena em prisão domiciliar, e Bolsonaro, que começa a ser julgado hoje, em prisão preventiva também em casa. Não é um histórico louvável, mas a diferença do julgamento de Bolsonaro é que, pela primeira vez, militares da mais alta patente — um almirante e três generais de quatro estrelas — envolvidos na tentativa golpista serão julgados por um júri civil, cinco ministros do Supremo Tribunal Federal (STF).

Setembro traz primavera quente, por Fernando Gabeira

O Globo

É possível dizer que teremos flores e pólen da estação e, ao mesmo tempo, um julgamento que condenará um ex-presidente

Chegou setembro, que nos traz a primavera e um julgamento histórico com resultado previsível. Nem sempre é assim. As estações do ano se repetem com regularidade, mas a História costuma surpreender.

É possível dizer que teremos flores e pólen da primavera e, ao mesmo tempo, um julgamento que condenará um ex-presidente e alguns altos oficiais por tentativa de golpe de Estado. A maioria esmagadora, talvez a unanimidade, dos observadores conta com a condenação.

Pela primeira vez na História recente do Brasil, uma tentativa de golpe será punida. Mas, também pela primeira vez, ela nunca teve respaldo tão militante e articulado. Igualmente de forma inédita, um presidente dos Estados Unidos se coloca claramente contra o júri e pede o fim do processo. Daí a imprevisibilidade das consequências.

Entre a história e a ameaça externa, por Míriam Leitão

O Globo

Sob ameaça de Trump e cobrança da história, STF inicia julgamento histórico dos que tentaram destruir a democracia

O mundo está olhando para nós. Sessenta e seis jornalistas estrangeiros estão credenciados para a cobertura. Foram fartas as matérias nos jornais mais influentes do planeta sobre o julgamento que começa hoje. De um lado, o Brasil está sob pressão da maior potência do mundo para não realizar o julgamento. De outro, diante da cobrança da História para que o processo seja exemplar. O presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, vê no que acontece no Brasil um “péssimo exemplo”. Afinal, um candidato a autocrata pode ser condenado. A História do Brasil é repleta de golpes e quarteladas que sempre terminaram em anistia. O julgamento pode mudar este destino.

Um convite à bandidagem, por Chico Alencar

O Globo

No Parlamento, há muitas iniciativas que podem contribuir para a lisura pública. Ou para sua opacidade

Há muitos modos e meios de o crime organizado se infiltrar na política institucional. A megaoperação contra o PCC — do Ministério Público, da Polícia Federal, da Receita Federal, da União e de estados — escancarou um esquema gigantesco: entre 2020 e 2024, foram R$ 52 bilhões “lavados” ou sonegados em postos de combustíveis e usinas, além de recursos passando por fintechs e fundos da Faria Lima — movimentações que somam até R$ 140 bilhões.

Não é apenas caso de polícia: quando o crime organizado entra no coração financeiro do país, contamina também a política. Como isso se dá já há tanto tempo? Financiando candidaturas, apresentando ou barrando projetos de lei, propondo emendas. O jornalismo investigativo e organizações de defesa da ética pública revelarão quem são esses “legisladores” das negociatas. Há Excelências “sensíveis” a excrescências e, “com gravata e capital”, acreditam que nunca se darão mal...

Como o Supremo pode julgar Bolsonaro e conter o bolsonarismo, por Maria Cristina Fernandes

Valor Econômico

Promessa de indulto de Tarcísio vale tanto quanto uma nota de 30 e desespero de Bolsonaro o leva a procurar Lira por uma anistia

Supremo Tribunal Federal começa a julgar o ex-presidente Jair Bolsonaro e a cúpula da trama golpista, mais da metade dos quais militares das mais altas patentes das Forças Armadas, sob a reiterada promessa de indulto do governador Tarcísio de Freitas.

O julgamento transformará Bolsonaro no nome mais poderoso da oposição até 4 de abril, quando se encerra o prazo para registro de candidaturas de uma disputa em que o antilulismo passa bem, obrigado. Como Bolsonaro terá que indicar o ungido, Tarcísio parece ansioso em persuadi-lo.

A promessa de indulto, porém, vale tanto quanto uma nota de 30. O ex-presidente baixou um decreto de indulto para o ex-deputado Daniel Silveira, ato sem precedente desde a Constituição de 1988. O Supremo o invalidou e o parlamentar continua preso. Como faz apenas dois anos dos fatos, parece improvável que o governador os tenha esquecido. Como foi Bolsonaro quem teve seu ato revisto, tampouco deve acreditar em Tarcísio.

O Tarcísio de Lula e o Tarcísio de Eduardo, por Carlos Andreazza

O Estado de S. Paulo

Lula disse, na sexta, que Tarcísio de Freitas é nada sem Jair. Em entrevista à Itatiaia, tratou o governador de São Paulo como boneco do ex-chefe, que “vai fazer o que Bolsonaro quiser”. O presidente torce para que assim seja. Não é apenas torcida. Também caracterização do oponente.

É o sonho de Eduardo Bolsonaro – que Tarcísio vire cavalo e seja, incorpore, o que os Bolsonaro quiserem. Sonhar custa nada. Desconfiar tampouco, já que o chamado Centrão prepara a sela do cavalo que se oferecerá à montaria de Tarcísio. Ele vai?

O bolsonarismo não confia. Eduardo tem certeza. Certeza de que Tarcísio vai. Certeza também de que Tarcísio nada será sem – mais que Bolsonaro – o bolsonarismo. Por via das dúvidas, trabalha para que Trump não perceba que existe alternativa à família. Todos – adversários, aliados, filhos – se organizando em função do pós-Bolsonaro. Jair, afinal, não disputará a eleição no ano que vem.

Trump, a China e o dólar, por Luiz Gonzaga Belluzzo

Valor Econômico

O futuro promete solavancos e colisões nas relações comerciais e financeiras entre as nações

As vítimas do tarifaço de Donald Trump buscam encontrar formas de resistir aos danos que seriam causados pela intempérie tarifária. Entre os esforços cogitados pelos países atingidos sobressaem os projetos para restaurar o multilateralismo nas relações comerciais e financeiras.

O imediatismo que impera no debate das redes sociais pretende assegurar o caráter inédito dos incômodos causados pelo tarifaço do Agente Laranja.

Suspeito que a história das relações econômicas e políticas internacionais não assegura tal ineditismo. Peço licença ao leitor do nosso Valor para perpetrar a ousadia de considerar a sucessão de episódios conflitivos, uma reiteração do aparente paradoxo que afirma: “são diferentes, mas semelhantes”.

A versão moderna de 'crescer o bolo para depois dividir', por Guilherme Klein Martins

Folha de S. Paulo

Avanços de cidadania e redução da desigualdade não podem ser feitos mais tarde, mas quando oportunidade aparece; foco deveria ser a justiça tributária

"Fazer o bolo crescer para depois dividi-lo." A frase, atribuída a Delfim Netto, ministro da Fazenda entre 1967 e 1974, tornou-se um marco no debate econômico brasileiro.

A ideia era simples: gerar riqueza e expandir a economia antes de implementar políticas redistributivas —sob o risco de que estas prejudicassem o crescimento. Na prática, serviu de justificativa para arrocho salarial e repressão a movimentos trabalhistas. Entre os mais bem-intencionados, havia a esperança de que o crescimento por si só traria uma melhora posterior na distribuição de renda.

Não acredite no que vê, por Pedro Doria

O Globo

Nano Banana começou a circular pelas redes faz duas semanas. Não era óbvio encontrá-lo. Primeiro foi no site LMArena, que permite a usuários escrever um mesmo comando simultâneo para duas inteligências artificiais que geram imagens. É para comparar o que uma e a outra constroem. Aleatoriamente, por vezes um dos resultados vinha dessa IA nova com nome engraçadinho. E os resultados chocavam: um modelo muito melhor que qualquer outro que existe por aí. Na semana passada, o criador desse Nano Banana enfim apareceu. É o Google. E, nesse campo, das imagens, tem um novo campeão na praça. Não é só isso. O Gemini 2.5 Flash Image, nome oficial do bicho, muda todas as regras do jogo.

Supremo inicia o julgamento dos “predadores” da democracia, por Luiz Carlos Azedo

Correio Braziliense

A tentativa de internacionalizar a defesa do ex-presidente Bolsonaro reforçou a percepção interna e externa de que se tratou de um atentado à soberania democrática do país

O julgamento de Jair Bolsonaro e de outros sete réus pelo Supremo Tribunal Federal (STF) é um momento decisivo da nossa história. Trata-se não apenas de apurar responsabilidades criminais pela tentativa de golpe de Estado de 8 de janeiro de 2023, mas também de medir a capacidade institucional de o Brasil responder ao avanço de forças autocráticas que, em escala global, têm corroído as bases da democracia liberal. O ex-presidente e outros sete réus, entre os quais três generais de Exército e um almirante de esquadra — fato inédito na República —, podem ter punição de até 43 anos de prisão.

Depois de Bolsonaro, por Joel Pinheiro da Fonseca

Folha de S. Paulo

O poder necessário para se vencer uma nova ameaça torna-se ele próprio uma ameaça

Bolsonaro será condenado. Alguém tem alguma dúvida? Há críticas válidas a diversos aspectos do julgamento —como se explica, por exemplo, que o alvo de tentativa de assassinato esteja julgando os mandantes? Nada disso muda, contudo, os fatos inegáveis de que o ex-presidente se sentou com generais para persuadi-los a impedir a posse do novo governo, que sua PRF tentou impedir eleitores de votar, que ele e seus asseclas travaram uma campanha mentirosa para desacreditar o resultado das urnas e que, por fim, alimentaram o extremismo fanático dos acampados na frente dos quartéis. Fizeram por merecer o que virá.

'Em breve vamos empurrar extremismo para a margem da História', diz Barroso

Por O Globo

Ex-presidente foi denunciado pela Procuradoria-Geral da República de liderar tentativa de golpe após pleito de 2022

O presidente do Supremo Tribunal Federal, Luís Roberto Barroso, criticou nesta segunda-feira o extremismo presente na política brasileira. Ele previu que em breve ele "será empurrado para a margem da História" e não fará mais parte do cenário, que contará com visões divergentes, mas que respeitam a alternância de poder. As declarações acontecem um dia antes do julgamento do ex-presidente Jair Bolsonaro na Primeira Turma da Corte, que foi denunciado pela Procuradoria-Geral da República (PGR) de liderar uma tentativa de golpe após perder o pleito de 2022.

Brasil sobe a ladeira da memória, por Dora Kramer

Folha de S. Paulo

Solavancos de setembro não serão suficientes para abalar um país que já superou inúmeras adversidades

Serão dez dias marcados por tensão política e ineditismo histórico, de 2 a 12 deste setembro trepidante.

Haverá solavancos, mas não suficientes para abalar um país que já enfrentou dois impeachments de presidentes, passou por um século de episódios golpistas, sofreu duas ditaduras, articulou uma transição democrática e agora está prestes a superar na Justiça uma tentativa de interrupção destes 40 anos de legalidade. O Brasil apanha e resiste. É como o samba: "Agoniza, mas não morre".

Razões para ser bolsonarista, por Hélio Schwartsman

Folha de S. Paulo

Por mais fundamentada que venha a ser condenação de ex-presidente, muitos de seus simpatizantes a considerarão ilegítima

Dentro de mais alguns dias, conheceremos os votos dos ministros do STF encarregados de julgar Jair Bolsonaro e a pena imposta ao ex-presidente. O preocupante é que, por mais bem fundamentada que venha a ser a condenação, parcela não desprezível do eleitorado a considerará ilegítima.

No plano objetivo e abstraindo quaisquer considerações jurídicas, é zero a dúvida de que Bolsonaro atentou contra a democracia. Apenas tentar produzir razões "legais" para não entregar o poder após ter perdido uma eleição, algo que ele admite que fez, já viola as regras do jogo institucional. A essência da democracia é justamente fazer com que governantes que perdem eleições deixem o poder sem resistir.

A história, a política e a precipitação dos analistas, por Carlos Melo

Política Democrática, nº 58.

A política pune a precipitação e faz apressados morderem a língua. Há pouco menos de 60 dias, o governo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva estava nas cordas e não faltaram desavisados que apontavam Lula como aquilo que os norte-americanos chamam de “pato manco”. Agora, a mais de um ano da eleição de 2026, esses espíritos já indicam o presidente como virtualmente reeleito. Não fosse a experiência, a prudência lhes recomenda calma.

Recuperemos o processo. São conhecidas as deficiências do governo: não há um projeto de país tendo em vista o mundo deste vertiginoso século XXI. Não se articula o enorme potencial econômico e social brasileiro às exigências do modelo que vai se impondo em torno da revolução tecnológica dos últimos 40 anos e da emergência política, social e econômica da China, a partir do início do século.

Com aval de Bolsonaro, Tarcísio nacionaliza discurso e faz movimentos por candidatura ao Planalto em 2026

Por Luísa Marzullo / O Globo

Governador tem articulado a anistia aos envolvidos no 8 de janeiro de 2023

O ex-presidente Jair Bolsonaro autorizou o governador de São Paulo, Tarcísio de Freitas (Republicanos), a assumir protagonismo em temas de alcance nacional, especialmente na articulação pela aprovação da anistia a condenados pelos atos de 8 de janeiro de 2023. A estratégia, ainda que informal, sinaliza a tentativa de consolidar Tarcísio como um ator relevante no cenário político de 2026. O governador é tratado por partidos ligados à direita como principal opção a Bolsonaro na disputa presidencial do ano que vem.

O aval de Bolsonaro ocorreu durante a visita de Tarcísio ao ex-presidente em prisão domiciliar, no último dia 7. A articulação é vista com entusiasmo por aliados no Congresso Nacional, que vinham pleiteando que o governador fosse o herdeiro de seu espólio na disputa nacional. Procurado, Tarcísio não comentou.

A família, contudo, ainda apresenta ressalvas. Ao GLOBO, o senador Flávio Bolsonaro (PL-RJ) confirmou a sintonia entre os dois aliados, mas evitou antecipar qualquer definição sobre candidaturas presidenciais:

— Eu e Tarcísio estamos nos falando com frequência e nosso foco agora é a aprovação da anistia — afirmou — Todos os movimentos dele são na direção de ajudar o país a retomar alguma normalidade. Há consenso entre várias lideranças de que o primeiro passo é a anistia, e Tarcísio tem sido essencial nessa articulação.

Por uma bela despedida da vida, por Ricardo Marinho

Filme: Costa-Gavras. Uma Bela Vida (Título original: Le dernier souffle). França: KG Productions, 2024. 1 hora e 37 minutos.

Para Luis Fernando Verissimo

No último dia 18 de agosto, a Fundação Casa de Rui Barbosa (Botafogo) recebeu estudantes do Colégio Estadual Profª Jeannette Mannarino (Campo Grande).

O evento, promovido pelo amigo e pesquisador da instituição Júlio Aurélio Vianna Lopes e conduzido por Vagner Gomes de Souza, o professor desses estudantes e doutorando do Programa de Pós-graduação em Ciência Política (PPGCP) da Universidade Federal do Estado do Rio de Janeiro (UNIRIO). Antes, num encontro rápido com o professor e seus alunos e alunas, houve uma brincadeira entre nós e dela surgiu essa indicação fílmica de Uma Bela Vida.

O filme nos apresenta uma amizade que se constrói entre o médico Augustin Masset, chefe de uma unidade de cuidados paliativos, e o escritor-filósofo Fabrice Toussaint, que acaba de fazer uma ressonância magnética onde se identifica um tumor, e nessa amizade nascente discutem o fim da vida um com o outro. Ao longo do filme o médico mostra a diversidade de reações e atitudes de seus pacientes (símiles aos dos estudantes), e o escritor-filósofo observa situações que ecoam seu próprio destino.