quarta-feira, 29 de outubro de 2025

O que a mídia pensa | Editoriais / Opiniões

Operação expõe limite estadual no combate ao crime

Por O Globo

Ou governo federal e estados se unem para enfrentar facções criminosas, ou então todos sairão derrotados

A resistência feroz que a polícia fluminense encontrou na operação desta terça-feira contra o Comando Vermelho (CV) nos complexos do Alemão e da Penha, no Rio, é demonstração eloquente dos limites enfrentados pelos governos estaduais no combate às organizações criminosas. A ação reuniu 2,5 mil policiais e deixou ao menos 60 mortos, entre eles quatro policiais, 56 suspeitos, além de vários inocentes feridos. Diante da incursão, os criminosos ergueram barricadas, incendiaram veículos e fecharam vias essenciais paralisando a cidade. Usaram até drones com explosivos para intimidar a polícia.

O secretário de Segurança do Rio, Victor Santos, reconheceu que o governo do estado não tem condição de enfrentar o tráfico. “Não dá para enfrentar sozinho”, afirmou. “É preciso que, sem ideologia, estado, União e município se sentem à mesa.” O governador Cláudio Castro cobrou “um trabalho de integração muito maior com as forças federais”. Ele disse que pediu apoio de blindados do Exército por três vezes e que os pedidos foram negados. O governo federal afirmou que não houve pedido de ajuda para a operação atual.

Segurança exige união e inteligência, por Vera Magalhães

O Globo

Não é mais possível abordar o problema pelo receituário clássico da esquerda, que preconiza ações de longo prazo, mas resposta exige atuação conjunta de entes federados

Um enfrentamento efetivo ao crime organizado e à rápida e preocupante expansão de seu domínio de territórios e atividades econômicas no Brasil, além da infiltração em instituições de Estado, exige mais que megaoperações como a desta terça-feira no Rio de Janeiro, que registrou a maior letalidade da História, levou o caos à cidade e descambou, mais uma vez, para um jogo de empurra entre autoridades.

O caminho mais consistente, que permitirá resultados de longo prazo, para além das baixas de integrantes das facções e de parte de seu arsenal —ambos passíveis de rápida e constante reposição, mantida a lógica atual —, envolve investimento em inteligência e forçosamente uma coordenação sofisticada de esforços entre Poderes e instâncias governamentais.

O que se viu nos complexos do Alemão e da Penha passou longe pelo menos da segunda dimensão. O governo federal e a prefeitura da capital não foram informados da operação. Ao longo do dia, Rio e Brasília protagonizaram uma disputa de versões a respeito da negativa atribuída à gestão Lula a oferecer ajuda pedida pelo estado. No fim, o governador Cláudio Castro reconheceu que os pedidos não foram relativos à ofensiva atual e acabou telefonando à ministra Gleisi Hoffmann para se retratar.

Castro aposta no bangue-bangue, por Bernardo Mello Franco

O Globo

Após maior matança da história do estado, governador critica ministérios e STF

Ainda não era meio-dia quando a equipe de Cláudio Castro abasteceu as redes com um vídeo sobre a operação de ontem. A peça foi embalada com trilha sonora de filme de ação. Exibia policiais de uniforme camuflado, viaturas em alta velocidade e um fuzil repousado no asfalto.

Estrelado por forças públicas, o vídeo tinha fins particulares. Ao fundo, uma marca-d’água convidava o visitante a seguir o perfil pessoal do governador. Um instantâneo da política na era do Instagram, em que até matanças viram material de autopromoção.

Castro apostou alto na megaoperação que mobilizou 2.500 agentes com o objetivo declarado de combater o Comando Vermelho. A ação se concentrou nos complexos da Penha e do Alemão. Resultou num banho de sangue nunca antes visto no Rio: ao menos 64 mortos, sendo quatro policiais.

A territorialização do crime organizado no Rio é uma patologia social e política, por Luiz Carlos Azedo

Correio Braziliense

Tríade território-sociabilidade-economia ilícita é o eixo estruturante do poder paralelo no estado. Eis a anatomia do patológico: o crime como forma de organização social

Por décadas, o Rio de Janeiro conviveu com a ideia de que a violência urbana é parte da paisagem. A naturalização das armas, dos tiroteios, das rotas interditadas e das mortes diárias se consolidou como uma anomalia que deixou de chocar — e, como ensinou Émile Durkheim, fundador da sociologia moderna, o momento em que o patológico se torna normal é o instante em que uma sociedade começa a adoecer profundamente.

A territorialização do crime no Rio não é apenas uma questão de segurança pública: é uma patologia social e política, resultado da corrosão prolongada dos mecanismos de solidariedade e da incapacidade das instituições de exercerem, de forma integrada, o monopólio legítimo da força. O ex-deputado Alfredo Sirkis, pioneiro do movimento ambientalista e ex-militante da resistência armada, diagnosticou o fenômeno há décadas: “Os traficantes têm uma topografia adequada, uma base social enraizada e uma fonte inesgotável de financiamento”.

Dia da Memória das Vítimas da Corrupção, Cristovam Buarque

Correio Braziliense

É estranho criar um dia para lembrar as vítimas do comunismo na União Soviética quando, no Brasil, os comunistas sempre foram as vítimas

Ao criar o Dia da Memória das Vítimas do Comunismo, o governador do Distrito Federal se refere, provavelmente, às vítimas do regime comunista da antiga União Soviética, que desapareceram há quase meio século. Não está considerando as vítimas da Rússia capitalista na Ucrânia, nem os 6 milhões — quase todos judeus — mortos pelo regime de direita nazista na Alemanha. Tampouco considera os 1.700 israelenses mortos e os cerca de 300 sequestrados, vítimas do terrorismo do Hamas, nem os 70 mil mortos e condenados à fome por Israel no gueto de Gaza. Ainda menos, não leva em conta as dezenas de milhares de presos, torturados, exilados ou os mortos pela ditadura militar de direita capitalista no Brasil.

Interseção entre as crises da Venezuela e do Rio, por Fernando Exman

Valor Econômico

Uma eventual queda do regime de Maduro pode levar milicianos a se livrarem das armas, abrindo uma grande oportunidade para as facções brasileiras

Enquanto se aproximava da costa venezuelana o USS Gerald R. Ford, maior porta-aviões do mundo e símbolo da projeção de poder dos Estados Unidos, a imprensa oficial da ditadura de Nicolás Maduro transmitia imagens de cidadãos comuns com fuzis na mão recebendo treinamento. É a Milícia Nacional Bolivariana, que, segundo os números muito provavelmente inflados pelo governo local, conta com 4,5 milhões de integrantes.

São homens e mulheres de todas as idades, armados e sem experiência militar, mas que juram fidelidade ao seu líder e disposição para enfrentar uma força invasora. São, portanto, um obstáculo para os planos dos EUA e, de forma indireta, também um potencial problema para a segurança pública brasileira: as Forças Armadas temem que esse arsenal possa entrar ilegalmente no Brasil, em caso de colapso do Estado venezuelano.

Impacto na investigação dos EUA sobre Pix, por Lu Aiko Otta

Valor Econômico

O entrelaçamento de cadeias de produção, principalmente na indústria, é característica marcante da relação com os Estados Unidos e que o Brasil não repete om outros parceiros

A reação química que transformou o diálogo entre Brasil e Estados Unidos também produziu uma névoa de dúvida em torno da investigação aberta pelo Representante de Comércio dos Estados Unidos (USTR, na sigla em inglês) sob o abrigo da Seção 301 da Lei de Comércio de 1974. É aquela que cita o Pix, o comércio da rua 25 de Março, o desmatamento e tarifas sobre o etanol, entre outros, como práticas brasileiras que prejudicam a competitividade americana.

Nos bastidores, a investigação segue vista como uma possível ferramenta dos americanos para limitar o comércio com o Brasil caso, por exemplo, a Suprema Corte decida que o tarifaço é ilegal. No entanto, o cenário hoje é diferente do que havia quando a investigação foi aberta, e isso cria incerteza sobre como será conduzida de agora em diante. O tom político que a pautou, junto com o tarifaço de 40%, foi trocado no último fim de semana por um claro comando do presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, no sentido de se buscar rapidamente um acordo.

O que Lula quer com Boulos no Planalto, por Vera Rosa

O Estado de S. Paulo

Novo ministro provoca alas do PT, que o veem fortalecido para furar a fila no pós-Lula

A entrada de Guilherme Boulos na “cozinha” do Palácio do Planalto é uma aposta do presidente Lula com muitos desdobramentos políticos. É cedo para dizer que Lula quer Boulos como seu sucessor, mas esta é uma hipótese no tabuleiro, apesar das resistências no PT.

Escolhido para comandar a Secretaria-Geral da Presidência, Boulos toma posse na tarde de hoje, com a tarefa de religar a conexão perdida entre o governo e os movimentos sociais. Terá duas grandes missões: 1) ser uma espécie de “mascate” digital, anunciando as boas-novas do governo nas redes sociais e fazendo a disputa política e 2) investir nos territórios populares, com um olhar atento para a juventude e o novo mundo do “empreendedorismo”.

O Brasil barbarizado pelo crime privado e pelo crime estatal, por Vinicius Torres Freire

Folha de S. Paulo

Por que o país se acostumou à violência, problema até para quem se ocupa só de dinheiro?

Crime organizado se fortalece, propaganda direitista de cometer massacre policial também

Esta terça, 28 de outubro, é um dia, um de tantos, em que pessoas em tese dedicadas a discutir os assuntos brasileiros devemos dizer algo sobre a violência, mesmo que não tenhamos novidades ou conhecimento especializado. Seria um ritual, um minuto de silêncio, bandeira a meio pau, oração, meditação. Pelo menos.

Sim, um momento de meditação sobre o que aconteceu no Rio de Janeiro. Para quase todos nós, que não somos especialistas ou suficientemente informados, não seria o caso ou hora de aplicar sociologias, antropologias, economias, criminologias, histórias, direitos ou políticas para explicar mais este dia de horror, este outro surto sintomático de um mal de todos os dias, cotidiano, mas que vai piorar, ao qual nos acostumamos, de alguma maneira. Nos acostumarmos ao mal também não é surpresa.

A guerra do Rio virou paisagem, por Mariliz Pereira Jorge

Folha de S. Paulo

Todos ficam à espera de que a chuva passe, os corpos sejam recolhidos e o sangue seque; e eu me incluo nessa crítica

Enquanto o governador segue sentado sobre uma política de segurança pública falida, nós estamos aqui, aplaudindo o pôr do sol

violência no Rio de Janeiro parece uma chuva de verão. Quando engrossa, as pessoas evitam sair de casa para não ficarem presas num alagamento, mas depois a vida volta ao normal.

Ainda mais que os tiroteios, os mortos e o sangue só escorrem bem longe daqui —do lado limpinho da cidade. A morte é vizinha de todos que nasceram em CEP longe dos cartões-postais do Rio. Depois de passar o dia afundada em reuniões —dentro de casa, claro—, procurei por notícias em grupos diversos.

Cláudio Castro promove 'matança produzida pelo Estado', diz nota conjunta de quase 30 entidades, por Mônica Bergamo

Folha de S. Paulo

Organizações de direitos humanos dizem que ação expõe fracasso da política de segurança fluminense

Ação é a mais letal da história do estado; além das vítimas, 81 homens foram presos

Quase 30 organizações de direitos humanos e coletivos da sociedade civil divulgaram, nesta terça-feira (28), uma nota conjunta em que afirmam que a Operação Contenção, realizada nos complexos do Alemão e da Penha, no Rio de Janeiro, e que deixou ao menos 64 mortos, foi uma "matança produzida pelo Estado brasileiro".

As entidades dizem que a ação —a mais letal da história fluminense— "expõe o fracasso e a violência estrutural da política de segurança pública" e "coloca a cidade em estado de terror". O texto responsabiliza diretamente o governador Cláudio Castro (PL), que, segundo a nota, "detém o título de responsável por quatro das cinco operações mais letais da história do Rio de Janeiro".

PSB defende ação sobre favelas criticada por Castro e diz que governador tenta esconder incompetência

Por Folha de S. Paulo /Painel

Partido foi o autor da ADPF que regulamentou operações policiais em 2020

Chefe do Executivo fluminense afirmou que medida que disciplina trabalho policial dificulta combate ao crime

Ex-presidente nacional do PSB, Carlos Siqueira diz que o ataque feito pelo governador do Rio de Janeiro, Cláudio Castro (PL), à chamada ADPF das Favelas é uma tentativa de camuflar o fracasso de sua gestão no combate à ação das facções no estado.

A ação foi proposta pela legenda ao Supremo Tribunal Federal em 2020, quando Siqueira a comandava. Atualmente, ele preside a Fundação João Mangabeira, ligada ao partido.

"O governador Cláudio Castro, com esse ataque ao PSB, está tentando esconder a incompetência do seu governo em lidar e reprimir o crime organizado", afirmou ele ao Painel.

Ação no Rio joga segurança no centro da campanha de 2026, por Igor Gielow

Folha de S. Paulo

Castro tenta culpar Planalto por um erro seu, expondo flanco numa área em que o discurso bolsonarista é mais conhecido

Esquerda tem dificuldade para lidar com a questão da violência, como a frase do presidente sobre traficantes prova

A operação da polícia fluminense contra o Comando Vermelho, necessária que tenha sido, escancara uma politização do tema da segurança pública que verá o assunto como candidato a prioridade dos rivais na campanha presidencial de 2026.

Há anos isso é dito, mas a questão é que, apesar da atribuição constitucional sobre o assunto recair mais sobre estados, na prática o poder federal tem se envolvido crescentemente no tema, da primeira GLO (Operação de Garantia da Lei e da Ordem) em 1992 ao pacote antifacção proposto pelo governo Lula (PT) na semana passada.

Num país em que a urgência de se lidar com o crime organizado parece ter virado preocupação nacional, num continente no qual uma superpotência nuclear tem explodido barcos atribuídos a traficantes sem perguntar a ninguém, é natural que seja assim.

O silêncio dos incompetentes, por Dora Kramer

Folha de S. Paulo

A abertura de canal real entre Lula e Trump deixou a oposição entre silenciosa e desengonçada

Se a direita continuar amarrada à tornozeleira de Bolsonaro, poderá dar adeus ao projeto de poder

reação de bolsonaristas à aproximação dos presidentes Luiz Inacio da Silva e Donald Trump mostrou como são desengonçados na arte de transformar vitórias em derrotas. São bons em aproveitar erros e vacilos dos adversários, mas não têm traquejo para aceitar os acertos nem requinte para usar algum tipo de fino ricochete.

Contrariamente às evidências de que na economia o Brasil é parceiro importante e de que na política Trump não daria a Lula a chance de ganhar apoio popular diante de alguma grosseria, Eduardo Bolsonaro festejou os primeiros dois contatos como sinal de armadilha adiante. Depois da reunião na Malásia, na falta do que dizer, disse que Lula saiu sem nada.

‘Centrão’ é um rótulo que protege siglas, por Wilson Gomes

Folha de S. Paulo

Camuflagem poupa quem deveria responder por cargos e barganhas

Sem identificação, surge uma espécie de ente metafísico do fisiologismo

Diz-se há muito tempo que, no Brasil, não se governa sem o centrão. Que ele é fisiológico, chantagista, faminto por cargos e dinheiro. O que normalmente não se nota, porém, é que o mesmo jornalismo que o fustiga em reportagens, colunas e editoriais acaba lhe concedendo o benefício com que todo investigado sonha: proteção de identidade.

O leitor lê que "o Planalto precisa dos votos do centrão para aprovar matérias de interesse" ou que "integrantes do centrão admitem desacelerar o desembarque da gestão petista". Aprende que há ali um poder decisivo, mas mascarado por um rótulo genérico. Entende que "um cardeal do centrão" trama nos bastidores, mas sem saber se o religioso atende por PPUnião BrasilRepublicanosMDB ou até mesmo PSD. O grupo aparece como classe profissional, mas sem nome no crachá.

Levantei, ao longo de um mês, 51 menções ao centrão na Folha. Em 84% delas, centrão é apenas "o centrão", uma espécie de ente metafísico do fisiologismo, designado sem que se diga quais partidos nele se abrigam.

Liberdade, liberdade, por Ivan Alves Filho

Predomina hoje uma concepção que restringe a ação do homem baseada somente em uma questão de escolha. Sob essa ótica, quase tudo se torna prisioneiro do mercado, dos objetos que se compra na esquina de casa ao voto exercido a cada quatro anos pelos cidadãos. Na realidade, muitas das nossas opções são impulsionadas pela busca do lucro e do poder. Segundo dados revelados pelo Instituto Federal de Tecnologia, da Suíça, apenas 147 mega corporações 
controlam 40% de toda a economia no mundo. Não creio ser preciso dizer muito mais. Até mesmo o exercício do voto obedece a determinadas leis da propaganda e ao controle dos mecanismos de indicação por parte de minorias encasteladas nos partidos políticos. Ou seja, o voto como mercado pura e simplesmente.

A realidade como cópia imperfeita das ideias, por Aylê-Salassié Filgueiras Quintão

-  Rei morto, rei posto!...
-  Sabemos muito bem onde estamos. Sabemos muito bem onde eles estão.

Não é um diálogo. Essas duas frases,  resumem o dito pelo não dito, na  conversa, na Malásia, de 45 minutos, entre os presidentes Lula e Trump. Eram agendas diferentes.
 
Nas falas acima, observa-se uma desconfiança mútua. Evidencia-se o fato de que os pares  hemisféricos, convivem num universo de   tensão constante,  inspirada não em  arsenais bélicos,  mas em   discursos inoportunos,  palavras mal colocadas , agressivas e verdades omitidas, como se  tudo voasse pelos ares, sem nenhuma consequência (Verba volant) . Faz lembrar a advertência do filósofo Michel Foucault: "As palavras geram ações!";  ou de Platão para quem a realidade (inteligível) é configurada  pelos pensamentos ditos ou não ditos. No Brasil tivemos um grande  jornalista e político, Carlos Lacerda, que   toda vez que abria a boca para dizer alguma coisa, mesmo óbvia,  gerava uma consequência. 

De fato, assusta a autoridade de um outro país, que não o seu,  sair de  um restaurante da 5a. Avenida de Nova York, de madrugada,  apelando , em  altos brados, às Forças Armadas do País anfitrião  para  desobedecer ao seu Presidente  .  A democracia é o lócus da liberdade de expressão, mas nem tudo pode ou deve ser feito ou dito, mesmo em lugares  isolados e na calada da noite. Espera-se dos cidadãos  respeito e  bom senso. No discurso, as palavras transitam dentro de um campo semântico, com muitos significados identificáveis... e voam.