sexta-feira, 22 de agosto de 2008

A COCA-COLA JÁ TERIA DESCOBERTO


DEU NO VALOR ECONÔMICO
Maria Cristina Fernandes

Marta Suplicy (PT) apareceu com um conjunto de blusa e casaco de malha rosa bebê, decote arredondado rente ao pescoço, mais para Luiza Erundina do que para o figurino arrojado que a caracteriza; Gilberto Kassab (DEM) chegou batendo com recortes de jornal denunciando a herança petista; e Geraldo Alckmin (PSDB) reprisou a campanha presidencial com a imagem de bom genro do médico de Pindamonhangaba.

O enfado da primeira reação - a quem eles pensam que ainda enganam - não sobrevive à estréia da campanha televisiva. Teve audiência maior que "Jornal Nacional" em tempos de mensalão - 57% na Grande São Paulo - entre outras razões porque o eleitor brasileiro, fartamente exposto às artimanhas da linguagem televisiva, sabe que a criancinha nos braços é para emocionar e os aplausos, para impressionar, mas assiste querendo, sobretudo, se informar.

Prova disso é o levantamento inédito que o professor da Fundação Cultural de Belo Horizonte, Luiz Lourenço, fez com duas amostras de municípios - com e sem horário eleitoral gratuito - nas disputas de 2000 e 2004. O grupo de pesquisas que coordena analisou 226 pesquisas eleitorais em todas as capitais e outros 14 municípios com mais de 100 mil habitantes.

Chegou à conclusão de que naqueles municípios onde há horário eleitoral gratuito o patamar de indecisos cai dez pontos percentuais com o início da programação. Na amostra de Lourenço, nas cidades onde a inexistência de retransmissora de TV priva os eleitores de programação eleitoral local, o patamar de indefinidos permanece alto ao longo da campanha e só cai às vésperas das urnas.

Em São Paulo, os indefinidos - pelo último Ibope, somam 33% do eleitorado - foram expostos a estratégias bem distintas. O programa de estréia de Marta fez uso comedido de sua imagem, optando por sua voz em off como locutora em tom confessional de cenas da cidade. Destinado a diminuir sua rejeição, foi direto ao ponto: "Sou hoje uma pessoa muito mais madura e preparada"; "o tempo foi me mostrando que os problemas cresciam tanto..", "aprendi a pensar grande, como São Paulo"; "quero governar de modo moderno e ágil, de modo diferente", "ela quer voltar a governar São Paulo para melhorar o que já fez".

Floreou recursos de outras campanhas - "Esta cidade nasceu pobre e se tornou rica. Esta mulher nasceu rica e resolveu dedicar sua vida aos mais pobres" - e só colocou o tailleur para receber o apoio do presidente operário. Preencheu toda sua cota de incredulidades com a proposta do gabinete cercado de monitores capazes de identificar problemas de segurança e trânsito em tempo real para reagir instantaneamente.

Ainda não inventaram propaganda melhor

O recurso ao refrão "deixa ela trabalhar", alusão direta ao da campanha presidencial de 2006, banalizou-se ainda mais porque também foi usado pelo programa de Gilberto Kassab, que lhe sucede. O prefeito abusa de propaganda negativa e atira para todos os lados - "Você não me viu criando taxas ou em cima do muro" - mas seu alvo preferencial é a candidata petista.

É clara a estratégia de se firmar como candidato anti-petista que tem tido, ao longo das duas últimas décadas, eleitorado cativo na cidade. Num programa acanhado e sem referências a Marta, Paulo Maluf (PP) não parece disposto a manter a titularidade do anti-petismo.

Kassab citou Serra cinco vezes no programa e abusou da primeira pessoa do plural - "Acabamos com a taxa do lixo". Apareceu nas mais variadas situações com o governador - abraçado, de mãos erguidas, no metrô, no meio da rua - e contrapôs a dependência da aliança ao "pulso forte" que implantou o rodízio de caminhões e o Cidade Limpa, "enfrentando poderosos" e "contrariando interesses".

Alckmin entrou confiante de que o baixo índice de rejeição é seu maior ativo. Ao contrário de Marta e Kassab, que abusaram de imagens da cidade, ele apareceu o tempo inteiro. "É o mais simpático", dizia o locutor, em off. O programa focou antes na identificação pessoal entre eleitor e candidato do que no que pretende para a cidade. Por enquanto, limita-se a explorar a confiança do eleitor de que ele dará melhor rumo à cidade. É "São Paulo na mão certa" e "São Paulo na melhor direção".

Eles terão 40 dias para convencer o eleitor. A campanha não se resume à telinha. A TV ajuda as boas campanhas e enterra as más. Luiz Lourenço encerra a discussão sobre o impacto da propaganda eleitoral na eleição citando o publicitário Chico Malfitani: "Se tivessem inventado algo melhor que a televisão para fazer propaganda, a Coca-Cola já teria descoberto".

Maria Cristina Fernandes é editora de Política. Escreve às sextas-feiras

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