quarta-feira, 6 de agosto de 2008

DEU EM O GLOBO


A CLASSE MÉDIA VAI AO PARAÍSO
Merval Pereira


NOVA YORK. O estudo da Fundação Getulio Vargas que revela que a classe média brasileira passou a ser maioria, incluindo quase 52% dos cidadãos, coloca o país com a mesma proporção dos Estados Unidos, onde recente pesquisa do Pew Research Center identificou 53% de cidadãos que se dizem de classe média. O crescimento da classe média brasileira, por outro lado, confirma um estudo da Goldman Sachs sobre a explosão da classe média mundial. Organizado pelo seu economista-chefe, Jim O"Neil, criador dos Bric, o estudo estima que nada menos de dois bilhões de pessoas, ou 30% da população mundial, estarão na classe média em 2030.

Dos países que formam a sigla Bric, China e a Índia têm o papel mais importante neste cenário, mas também o crescimento da classe média brasileira está previsto, ficando de fora apenas a Rússia. O crescimento constante da renda e do poder de compra nos próximos 20 anos fará com que, segundo a Goldman Sachs, por volta de 2050 esses três países e outros seis do grupo denominado Next-11 respondam por cerca de 60% do PIB mundial, medido pela paridade de poder de compra (PPP em inglês): Egito, Filipinas, Indonésia, Irã, México e Vietnã.

Confirmando os estudos divulgados em 2003 sobre os países que dominarão a economia mundial no futuro, a Goldman Sachs prevê que Índia, Brasil, Rússia, Indonésia, México e Turquia substituirão Japão, Alemanha, França, Itália, Espanha e Canadá no ranking das dez maiores economias do mundo em 2050.

Ao contrário do que acontece em muitos países desenvolvidos, inclusive nos Estados Unidos, onde a classe média tem reduzido seu poder de compra, a Goldman Sachs vê um movimento contrário nos países em desenvolvimento, onde estaríamos diante de uma explosão sem precedentes, inclusive com uma melhora generalizada na redução das desigualdades sociais.

Segundo o estudo da Goldman Sachs, o crescimento da classe média a nível mundial está levando a mudanças econômicas, sociais e políticas a nível não visto desde a segunda metade do século XIX, quando do surgimento da classe média nos países desenvolvidos.

No estudo da Fundação Getulio Vargas, a classe média brasileira é formada por uma renda mensal entre R$1.069 e 4.951. No estudo da Goldman Sachs, com base na paridade do poder de compra, a classe média dos países emergentes é medida por um salário anual que vai de US$6 mil (cerca de R$9.600) a US$30 mil (cerca de R$48 mil). Nos Estados Unidos, a classe média vai desde US$20 mil por ano (cerca de R$32 mil) até US$100 mil (cerca de R$160 mil).

No entanto, segundo recente pesquisa do Pew Research Center, a classe média, tida como motor do desenvolvimento e decisiva nas eleições, passa por momentos difíceis nos Estados Unidos, ou pelo menos alguns de seus grupos.

Para começar, a pesquisa encontrou não uma, mas quatro classes médias, cada qual com hábitos, comportamentos e situações financeiras distintos, e muitas vezes colidindo com os estereótipos criados em torno da imagem do que seria a classe média.

A camada superior da classe média americana, chamada no estudo de "Topo da Classe", tem predominância de homens, bom nível de educação, mas desproporcional, e é segura financeiramente. Este é o maior grupo dos quatro, abrangendo cerca de 1/3 da classe média.

Cada membro seu ganha pelo menos US$50 mil por ano, média de vencimentos que nenhum membro de um outro grupo, a "classe média batalhadora", ganha.

Os "batalhadores", na maioria mulheres e representantes de minorias, "sentem-se" classe média, mas muitos deles têm mais em comum com a classe baixa do que com os outros três grupos que formam a classe média. Às vezes, têm uma renda familiar menor do que alguns entrevistados que se colocam na parte inferior do estrato social.

Cerca de 1/6 dos entrevistados se incluiu nessa categoria, que é caracterizada principalmente pela falta de dinheiro. Cerca de 30% têm renda familiar anual de menos de US$10 mil.

Se comparamos seus vencimentos com os dos que, na mesma pesquisa do Pew Research Center, se identificam como "classe baixa", a situação fica ainda mais estranha, pois entre os menos afortunados americanos, menos que 1/3 tem renda familiar anual menor que US$20 mil.

Esse grupo ainda tem duas outras características que o distinguem dos que compõem a classe média: é o único em que a maioria não tem casa própria, e também o que tem a menor proporção de membros casados, apenas 23% deles, comparados com 53% da classe média.

O terceiro grupo é chamado de "classe média satisfeito", que se caracteriza por ter tudo, menos dinheiro. A renda comparativamente modesta não alterou a visão otimista do futuro de seus membros e a satisfação com a vida de maneira geral.

Esse grupo tem proporções iguais de velhos e moços, com 34% acima de 65 anos e 31% abaixo de 30. Quase 40% são aposentados e 57% deles já pagaram a sua casa. A grande maioria (84%) tem renda familiar anual entre US$20 mil e US$50 mil.

O último grupo, denominado "classe média ansiosa", que responde por cerca de 23% da categoria, é o mais caracteristicamente classe média de todos, pelos padrões de renda, educação, idade, emprego e situação familiar.

Ao mesmo tempo que têm algumas das vantagens dos que estão no topo da classe média, têm o mesmo sentimento negativo dos que compõem a "classe média batalhadora".

Embora ninguém nesse grupo ganhe menos do que US$30 mil por ano, e pelo menos 1/3 tenha renda familiar superior a US$75 mil anuais, o "classe média ansioso" é o mais inclinado entre todos os membros da classe média americana a se declarar descontente com a situação do país, e apenas 16% deles estão "altamente satisfeitos", índice que é a metade da média da classe de maneira geral.

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