segunda-feira, 6 de outubro de 2008

Campanha que remou contra a maré e virou onda

Chico Otavio
DEU EM O GLOBO

Sem imagem do presidente Lula e apelo popular, candidato ciclista é o fenômeno das eleições cariocas


Para chegar ao segundo turno das eleições cariocas, os candidatos seguiram estratégias parecidas, como um discurso de forte apelo popular e a vinculação da imagem à do presidente Luiz Inácio Lula da Silva. Só Fernando Gabeira, da frente PV-PSDB-PPS, preferiu outro caminho. Em nome de uma campanha limpa, evitou até espalhar a própria imagem em cartazes pela cidade. E é justamente ele, o candidato da bicicleta, que enxotou Severino Cavalcanti do Congresso Nacional, a surpresa que emerge das urnas.

Ontem, quando a pesquisa de boca-de-urna confirmava o fenômeno, cientistas políticos, marqueteiros e aliados procuraram explicá-lo.

A campanha começou centrada no discurso pela ética na política, com imagens de Gabeira enfrentando Severino no plenário da Câmara. Mas o candidato foi além. Soube cativar a empatia dos jovens, apostou na transparência (foi o primeiro a divulgar a lista parcial dos doadores), fez da campanha pela cidade limpa uma metáfora na defesa da ética e abandonou a cautela ao falar sobre a necessidade de conter o processo de favelização.

- Os eleitores viram que o apelo de barrar as favelas vinha pelo lado ecológico e não udenista, de que é preciso simplesmente conter - disse a cientista política Marly Motta, da Fundação Getulio Vargas.

O publicitário Lula Vieira, marqueteiro da campanha, disse que um dos méritos de Gabeira foi mostrar que um político honesto pode ser também um bom governante. E tudo isso sem uma estratégia de marketing:

- Os marqueteiros tiveram participação mínima. Gabeira é exatamente como se exibiu para o eleitor.

O ex-deputado tucano Márcio Fortes, um dos padrinhos da aliança com o PV, disse que a candidatura Gabeira foi a melhor opção para enfrentar o que chama de "cansaço da população" com a política tradicional:

- O que encantou foi o diferente. A população já não agüentava mais o mesmo. E ele correspondeu. Inventou um enredo, não sujar a cidade, e não teve medo de usar outros meios, como TV e internet, para se apresentar.

Identificado com o eleitorado da Zona Sul, o candidato procurou burilar a imagem para tentar ir além do Túnel Rebouças. O Gabeira que, nos anos 70, já usou tanga na Praia de Ipanema, apareceu agora de terno, sério e cercado da família no horário eleitoral. E, pelo resultado de ontem, conseguiu seduzir camadas mais populares da cidade.

- Gabeira já mostrou estar bem cotado junto à classe média e ao eleitor de centro-esquerda, que estava à procura do candidato ideal. Mas, no segundo turno, terá de fazer discurso para o povão - diz o cientista político Ricardo Ismael, da PU-Rio.

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