quarta-feira, 29 de outubro de 2008

Para quando o carnaval passar


Rosângela Bittar
DEU NO VALOR ECONÔMICO

De imediato, não será, como nunca foi o tempo de ação do presidente Luiz Inácio Lula da Silva para este tipo de providência. Critério pré-definido, não existirá, e quem forçar vai irritar o chefe. Pode não haver desejo, mas reconhecimento da necessidade. Assim, a cautela recomenda não esperar reforma ministerial abrangente, muito menos agora, no calor das mágoas eleitorais e antes do Natal, como o presidente não gosta. Mas quando o ano novo chegar, após as eleições das Mesas da Câmara e do Senado, em fevereiro, com a definição sobre o que será o governo nos dois anos finais de mandato do presidente Lula, ficará evidente a exigência de ser feito um arranjo na tropa governista para armar as batalhas da sucessão. O presidente já tem, e terá ainda mais, razões de sobra para trocar peças do seu governo. E vai fazê-lo.

O que se tem dito hoje não conta. Alguns políticos com acesso ao presidente informam que ele não fará reforma ministerial nenhuma. Outros comentam que haverá "mudanças pontuais", mas derrotados não receberão posto. Um critério, por sinal, que nunca foi o do presidente Lula. Ele formou seu primeiro staff praticamente só com derrotados.

Há um consenso nas informações: Marta Suplicy (PT), derrotada na disputa da Prefeitura de São Paulo, não voltará ao governo, "de onde saiu por sua conta e risco" para uma empreitada incerta. Ora, o presidente não desestimulou sua candidatura, empenhou-se pessoalmente para elegê-la, e o PT não tem nomes novos sobrando no Estado para produzir candidaturas em futuro próximo. Não se consegue perceber por que vai rifar a Marta, que ainda tem milhões de votos, deixando-a sem palanque durante dois anos inteiros, nem que seja para tentar, por exemplo, uma cadeira no Senado.

Haverá também a pressão do grupo de petistas mais próximos a ela para que lhe seja destinado um cargo que permita a exposição máxima. Provavelmente não retomará o Ministério do Turismo. Mas uma solução virá. Para formar novos nomes do partido em São Paulo, o governo federal não pode se dar ao luxo de desprezar os já conhecidos, e Marta é o que restou de mais importante.

Como seus principais adversários do PSDB, que também precisam consolidar nomes para as novas disputas, o governo registra que tem algumas promessas para o futuro. Luiz Marinho, prefeito eleito de São Bernardo depois da campanha mais rica de toda a sucessão municipal, é um emergente que terá apoio para se transformar em opção. Emídio de Souza, a partir de Osasco, é outro nome nos planos prospectivos do presidente Lula. Há os que já eram citados antes, como Arlindo Chinaglia, hoje na presidência da Câmara mas fora dela no ano que vem, e José Eduardo Cardozo, secretário geral do PT. E, sempre, Antonio Palocci. Se absolvido, Lula vai levá-lo de volta ao governo, confirmou isto para mais de um interlocutor, e não necessariamente como ministro da Economia. Em qualquer ministério que esteja, Palocci freqüentará o centro do poder, o Palácio do Planalto, como já faz hoje. Mas ganhará um posto formal.

Há outros emergentes no partido do presidente que precisam de foco. Fernando Pimentel, revigorado com a eleição de um afilhado desconhecido no segundo turno, em Belo Horizonte, e desde o início um entusiasta da candidatura Dilma Rousseff à sucessão de Lula, não merecerá o ostracismo. Há o PT da Bahia, um caso especial, que não dá mostras de arrefecimento na sua competição com o PMDB local. O tamanho e profundidade da ruptura que houve ali entre os dois partidos aliados a Lula, só o presidente poderá reparar. O PMDB venceu, mas o feito do PT foi enorme ao chegar ao segundo turno desbancando o tucanato e o carlismo. Como vai se sustentar este PT para pleitear a reeleição ao governo do Estado, uma vez que a derrota desqualifica Jaques Wagner para a sucessão presidencial, é algo que exige ajuda do processo político e eleitoral que o presidente toca.

O PT revelou outras estrelas, como Luizianne Lins, no Ceará, e João Paulo, em Pernambuco, mas, vitoriosos, terão palanques naturais nestes próximos dois anos para seu grupo. Não se sabe de onde o presidente tirará mais cargos para todo o PT, mas o partido pressiona até com as vagas do Tribunal de Contas da União, instância que quer enquadrar às suas regras e projeto.

O PMDB volta com uma sede correspondente ao sucesso eleitoral que teve. Já começa querendo mais no Congresso, onde senadores anunciam que, além da presidência da Câmara, que o PMDB terá por acordo, o partido faz questão da presidência do Senado. No Planalto já se comenta que se o PMDB quiser as duas Casas, pode ficar sem nenhuma.

Não é lenda o horror que o presidente Lula tem a demissões, afastamentos, dispensas. Ele gosta de contratar e aumentar salários. Trocar ministro em véspera das festas de fim de ano sempre conseguiu evitar. Diz agora, oficialmente, que não haverá reforma ministerial, até porque, se admiti-la, não suportará a voracidade dos principais partidos da sua aliança.

Mas vai fazer. Além de acomodar forças do PT, tem a conquista definitiva do PMDB para sua aliança em 2010, a solução da crise que restará das escolhas dos presidentes da Câmara e do Senado, as consequências da crise econômica sobre seu plano de governo, os dois últimos anos de administração e a construção de um discurso para a campanha em que, já anunciou a muitos, pretende eleger seu candidato, custe o que custar. A maioria no Congresso é absolutamente necessária, e não é para aprovar a reforma tributária. Esta já chegou à fase da desconstrução do caminho andado, tendo em vista sua eterna inviabilidade. Mas precisa de maioria para aprovar as medidas destinadas a combater a crise financeira.

O teorema implica a melhora da gestão, tendo em vista os dois últimos anos de mandato. E são claros os sinais de insatisfação com alguns ministros. Márcio Fortes, das Cidades, que não responde aos investimentos feitos pelo PAC em sua área, é um destes. José Temporão, da Saúde, apesar da torcida dos amigos, continua sem dizer o que faz no governo. E Tarso Genro, da Justiça, que não demonstra intimidade com os acordos entre a Polícia Federal e a Agência de Inteligência (Abin). Não será por falta de quem demitir que o presidente ficará sem vagas para a reforma ministerial.

Rosângela Bittar é chefe da Redação, em Brasília. Escreve às quartas-feiras

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