terça-feira, 4 de novembro de 2008

Fidelidade de resultados


Dora Kramer
DEU EM O ESTADO DE S. PAULO


As teorias circulantes sobre traições partidárias esperadas para muito em breve por ora não passam de teorias. No papel, agüentam-se firmes, chegam mesmo a fazer sentido. Quando cotejadas com a realidade, porém, revelam-se desprovidas de lógica e não param em pé.

Comecemos pelo caso mais notório, o do PMDB. A propagada hipótese de o partido transferir seu apoio do governo à oposição não é uma fabulação; tem base no modo de operação pemedebista e sustenta-se nos gestos e nas palavras de lideranças do partido.

Nenhuma delas se preocupa em disfarçar o entusiasmo com a desventura do PT em São Paulo nem se empenha em esconder que a aliança não é incondicional, muito menos implica adesão automática à candidatura presidencial governista em 2010.

Mas dessas lideranças e de outras menos desinibidas lideranças não se ouviu, nem se ouvirá tão brevemente como se imagina, uma palavra sobre a disposição do partido de devolver ao Palácio do Planalto seus seis ministérios, a presidência, a diretoria comercial e a diretoria de tecnologia e de infra-estrutura dos Correios, a presidência de Furnas, a vice-presidência de governo do Banco do Brasil, a presidência da Eletronorte, a presidência da Transpetro e a coordenação do projeto de transposição das águas do Rio São Francisco.

Em valores absolutos, os pemedebistas ocupantes desses cargos estão sentados sobre o equivalente a R$ 40,5 bilhões em recursos federais. Isso para só falar dos melhores postos, desconsiderando todo o plantel de menor, mas substancioso, porte.

Não faz o menor sentido imaginar que o PMDB esteja sequer cogitando a sério da possibilidade de dar, agora, um salto no escuro deixando para trás tudo o que conquistou ao custo de uma revisão doutrinária radical.

Dizer num dia cobras e lagartos de um presidente e, no outro, passar a vê-lo sinceramente como um gênio é tarefa extenuante. Requer, no mínimo, um período de gozo e relaxamento.

Se tiver de acabar, não será antes de o partido conseguir montar seu esquema de eleições estaduais para tentar repetir com os governadores o desempenho obtido agora com os prefeitos.

Para isso talvez não precise do governo quando a disputa estiver bem perto e, se na ocasião, os oposicionistas estiverem arrebatando corações eleitorais. Mas, daqui até lá, não vai dispensar os instrumentos necessários à construção de uma boa base de operações.

Por esse raciocínio, é óbvia a conclusão: não obstante todo o jogo de aparências, no momento ao PMDB não interessa sair. Ao contrário, nessa altura gostaria de mais espaço para entrar.

A tese sobre o golpe de mão que o DEM, uma vez fortalecido na Prefeitura de São Paulo, daria no PSDB em geral e em José Serra em particular nem carece de bons argumentos para se contraditar.

O partido chegou lá por obra e graça da fidelidade ao governador tucano que, não tendo nascido exatamente anteontem, não descuida do controle. Além disso, sozinho o DEM não vai a canto algum. Seus experientes e realistas dirigentes não perdem de vista que, com os tucanos, podem voltar ao poder federal.

Ainda que pudesse trair, não seria a opção mais sábia. A conversa do DEM não é de independência. A questão ali é segurar os defensores da fusão com o PSDB, convencendo-os de que a posição de anexo dos tucanos é de ótimo tamanho para a atual dimensão do partido.

Unidade e ação

O crescimento do PMDB desde a adesão total ao governo Lula desmente a história de que o partido é forte porque está sempre dividido.

Lição sobre a força na união absolvida, até por pragmatismo, o PMDB pode surpreender e ficar todo junto de um lado só, o potencialmente vencedor.

Marionete

Os prefeitos eleitos do Rio e Belo Horizonte andam precisando de um bom amigo que lhes informe a diferença entre a fidelidade e a subserviência desmedida.

Para se eleger, Eduardo Paes seguiu a cartilha do governador Sérgio Cabral; correu literalmente atrás de uma palavra amiga do presidente Lula, foi humilhado por Marisa Letícia, pegou na mão de quem antes jamais pegaria.

Depois de eleito, Márcio Lacerda já se fez duas vezes porta-voz de provocações ao governador de São Paulo, José Serra: comparou em tom pejorativo a tendência paulista de “centro-direita” à ação mineira de “centro esquerda” e acusou a existência de “apoio financeiro vindo de São Paulo” na campanha de seu adversário, Leonardo Quintão.

Compreende-se que ambos sejam gratos aos governadores de seus Estados, sem os quais nem sonhariam em chegar à frente das respectivas prefeituras.

Mas, considerando que provocações e bajulações são atos pessoais e intransferíveis, o prestador de serviços corre riscos. Um deles é perder o respeito do público; outro é contratar inutilmente inimigos para o dia de amanhã.

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