domingo, 2 de novembro de 2008

O pato, a manada e as reservas


Clóvis Rossi
DEU NA FOLHA DE S. PAULO

SÃO PAULO - Dois econometristas saem para caçar patos. O primeiro atira e erra por meio metro à direita. O segundo dispara, erra por meio metro à esquerda e grita, eufórico: "Acertamos".

Seria engraçado, não fosse o fato de que os jornalistas passamos anos acreditando que, de fato, os dois haviam acertado. Reproduzimos passivamente previsões atrás de previsões sobre tudo (juros, câmbio, crescimento, inflação etc.), mesmo quando os "previsores" erram ano após ano.

Desprezamos um ensinamento básico, o de que a atividade econômica é, no fim das contas, o produto de decisões e atitudes de milhões (ou bilhões) de seres humanos, o que, por definição, torna prevê-las tarefa para oráculos -não para economistas, mesmo para os que se acham oráculos.

Comportamo-nos como manada ao repetir dia após dia, para citar só um exemplo, que os US$ 200 bilhões de reservas blindavam a economia. Só agora entra na agenda a dúvida, exposta aliás separada, mas coincidentemente por dois acadêmicos de extremos ideológicos opostos.

Escreve Cesar Benjamin, que foi candidato a vice-presidente pelo PSOL: "A maior parte dessas reservas foi formada com capital externo de curto prazo, atraído ao Brasil pelos juros altos e aqui distribuídos em ativos dotados de elevada liquidez. As reservas brasileiras são a contrapartida de um passivo líquido que, ao se mover, pode reduzi-las a pó".Ecoa Roberto Luis Troster, ex-economista-chefe da Febraban, no mais recente boletim Fipe:

"Preocupa o anúncio de que "US$ 200 bilhões de reservas blindam a economia" sem ressalvar que o volume de capital externo de curto prazo é quase o triplo desse valor".

Pode ser que ambos errem. Mas já engolimos tantos "acertamos" errados que não custa pelo menos parar para pensar.

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