sábado, 8 de novembro de 2008

O TECNICISMO COMO FIM


Wilame Jansen
Escritor, paraibano


Darwin tinha razão. Meu micro ficou velho aos 3 anos de idade. Tive de substituí-lo por um jovem poderoso, veloz e com mais utilidades que bombril. Meu televisor está condenado à morte ainda na flor da idade, vem aí o digital.

Aposentei uma coleção de máquinas de calcular que me acompanharam na profissão por longo tempo. Elas ficaram, a cada geração, mais capazes, mais velozes e, ao longo do tempo, diminuíram de tamanho até... desaparecerem.

Hoje, encontram-se escondidas em computadores, celulares e até em máquinas fotográficas. Não falo da velha Kodak (velho já era), falo das novas, das que fazem tudo em tempo real: fotografam e remetem imagens para visualização ou impressão.

Não é a mudança que é importante, e sim, a velocidade da mudança. Na telefonia, a operadora X troca o celular do cliente a cada 6 meses, sem custo. São atitudes surpreendentes da agressiva competição globalizada. A operadora X está apenas fazendo o que as outras fazem

Não há tempo a perder, o mercado – novo ente transcendental – é ávido por novos produtos. As pessoas querem comprar qualquer coisa nova. Comprar não é mais um meio desse consumidor contumaz. É um fim, é a própria felicidade. Uma vez alcançada, essa efêmera e frustrante felicidade tem necessidade de perseguir nova compra. E o ciclo da competição globalizada se completa em suposta harmonia, cada vez mais veloz. E essa velocidade custa caro às empresas, obrigadas a comprar ou desenvolver tecnologias para atender a esse ritmo alucinante, se quiserem apenas sobreviver.

Hoje, até a pesquisa nos dá a impressão de se voltar exclusivamente para atender essa urgência constante da técnica em atender à competição. E a técnica em si não está, como nunca esteve, preocupada com os objetivos superiores da humanidade. Por outro lado, era a Ciência quem nos prometia a felicidade pelo conhecimento do mundo. Refiro-me aos modernos: iluministas, positivistas - esses nomes significativos inventados pelos geniais Descartes, Look, Kant, etc. Mas zombaram da harmonia cósmica, parcelaram o mundo para melhor analisá-lo e apostaram no desenvolvimento da humanidade exclusivamente pela técnica. E deu no que deu.

E aí? Como interferir nessa ciranda? O capitalismo globalizado fragiliza as nações e só permite a interferência dos governos nas crises por ele mesmo criadas. Quando o negócio fica preto, desenterram Keynes, como agora, socializando os prejuízos. As pessoas que entram no pesado jogo do consumismo só se preocupam em ganhar dinheiro, o máximo que puder, e administrar seus cartões de crédito a fim de alcançarem aquela felicidade efêmera e, por isso, frustrante.

Aparentemente, são indivíduos isolados que, mesmo residindo em médios e grandes centros urbanos, não participam de qualquer tipo de associativismo e não se interessam por assuntos que digam respeito ao destino da humanidade. Digo aparentemente, porque me parece não ser o comportamento da maioria.

A eleição, ontem, de Barak Obama me faz reportar (noutra dimensão, claro) a votação extraordinária de Gabeira, no Rio. Ambas deverão ser objeto de muita reflexão e estudos pra quem é do ramo.

Em seminário de avaliação das últimas eleições brasileiras, semana passada, em Brasília, tive a oportunidade de assistir o depoimento do companheiro Raulino, assessor da campanha de Gabeira, explicando a estratégia utilizada para o sucesso daquela campanha. Em síntese: Gabeira, um intelectual antenado com o mundo, deixou de lado a lógica dos partidos (o que a população já fez há anos) e falou para as redes sociais de interesses comuns, ou seja, praticou o que os teóricos estão chamando de a democracia das minorias. E foi ouvido.

Três cientistas sociais de fama internacional escreveram sobre o assunto: Marilyn Fergusson (Conspiração Aquariana), Anderson e Alvin Toffler (A Terceira Onda), por coincidência, todos em 1980. Portanto, há 28 anos discutiram coisas que os partidos brasileiros, até hoje, nem desconfiam.

Alguns movimentos sociais fazem parte dessas redes, mas não são apenas eles. Há redes permanentes e redes temporárias, que lutam por um objetivo e se extinguem tão logo alcançam o que querem. Há toda uma teoria que justificam as redes, em cima dos novos paradigmas (abordei o assunto no livro Na curva do rio). Alguns marxistas apontam as mudanças nas relações de produção como a causa mais profunda desses movimentos.

Pois bem, Gabeira falou para essa gente, por fora e por cima dos partidos. E foram essas redes que defenderam ele e o Kassab, quando os dois foram agredidos por preconceituosos.


Wilame Jansen lançou recetemente, em Recife, seu novo romance, "Na Curva do Rio"

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