quarta-feira, 17 de dezembro de 2008

Condutor e passageiros

Dora Kramer
DEU EM O ESTADO DE S. PAULO

O governo pode não saber direito se as medidas pró-consumo terão algum efeito real sobre os efeitos da crise econômica no Brasil, mas o presidente Luiz Inácio da Silva sabe perfeitamente o que faz quando pega no microfone e enche a alma do brasileiro de otimismo, dando à crise um sentido de intriga da oposição.

Os resultados das últimas pesquisas de avaliação de desempenho mostram com nitidez a habilidade de Lula no manejo de emoções. Sem um dado preciso para embasar as opiniões, 62% das pessoas consideram que as medidas do governo estão no rumo certo e apenas 29% já sentem conseqüências negativas no dia a dia.

Compare-se a quantidade de entusiastas ao contingente de afetados e não será difícil compreender a ascensão dos índices de popularidade de Lula à casa dos 80%. Se a maioria ainda não sentiu o problema no bolso, natural que a maioria prefira acreditar que nada de mau acontecerá.

O equívoco de quem se surpreende com a capacidade de Lula de ficar no alto na adversidade é acreditar que popularidade está necessariamente ligada a razões objetivas, enquanto quase sempre guarda relação com motivações subjetivas.

Lula pegou a coisa no ar quando a crise explodiu nos Estados Unidos. Jogou a culpa no colo de George Bush, depois transferiu responsabilidade ao “sistema” neoliberal e, enquanto apontava seus adversários políticos como torcedores do desastre, montava com capricho o nicho de onde reina quando é preciso tirar o corpo fora.

De um lado, anunciando medidas para não vir a ser acusado de apatia governamental e, de outro, construindo o discurso triunfalista em ritmo de Brasil grande.

Resultado, a maioria, quando perguntada, não tem dúvida: a crise é grave, mas o governo faz a sua parte.

Uma brevíssima reflexão ensejaria a dúvida a respeito de qual parte mesmo se trata, mas no mundo das percepções captado pelas pesquisas, convenhamos, isso não passa de detalhe.

Quase tão irrelevante quanto a relação direta entre os índices de preferência eleitoral obtidos pelo rol de possíveis candidatos a presidente e o comportamento do eleitorado daqui a um ano e dez meses.

Só influem nas movimentações partidárias em torno dos pretendentes. Fora isso, vale quase zero saber que a oposição venceria qualquer candidato que não fosse Lula, que Dilma Rousseff é desconhecida por 48% das pessoas a despeito de sua exposição praticamente diária como candidata há dez meses e que 43% poderiam votar em quem o presidente pedisse.

A transferência automática de votos observada na recente eleição municipal falou bem melhor sobre a distância entre o ato da venda e a decisão de compra do produto eleitoral.

Bolha

Um tantinho demasiada a interpretação de alguns senadores de que a pretensão do presidente do Senado, Garibaldi Alves, de se reeleger poderia abrir espaço à idéia de um terceiro mandato para governantes em geral - Lula em particular.

A questão de Garibaldi não é institucional, embora seja matéria constitucional. Além disso, o plano diz respeito a um segundo e terceiro mandato.

Como as excelências estão cansadas de saber disso, há má-fé por parte dos intérpretes: tanto dos que recorrem à alegação para não assumir a rejeição a Garibaldi Alves de novo, quanto dos eternos praticantes do “se colar, colou”.

A história é simples de ser resolvida. Se o PMDB quiser mesmo lançar o nome dele, uma rodada de consultas informais a ministros do Supremo Tribunal Federal resolve o problema da segurança jurídica.

As condições e conveniências políticas da candidatura podem ser obtidas mediante sondagens no Senado mesmo. Considerando que o partido não vai entrar numa empreitada dessas para comprar briga com a Constituição nem com as intenções de voto dos senadores, a celeuma é desnecessária.

A menos que haja no PMDB e no PT gente interessada em alimentar o contencioso entre os dois partidos para amanhã transformá-lo em pretexto.

Cerca Lourenço

A motivação dos pemedebistas para o acirramento do conflito com os petistas seria 2010. Hoje o partido arrasta um bonde pela candidatura de José Serra não por amor às suas olheiras, mas por carinho ao primeiro lugar nas pesquisas.

Uma minoria assume, a maioria faz juras de fidelidade ao presidente Lula a fim de manter uma política mais que de boa vizinhança, de ótima permanência.

Entre os minoritários assumidos estão as seções do partido em São Paulo, Pernambuco, Rio Grande do Sul, Piauí e Roraima.

Entre os majoritários enrustidos se incluem todos os ministros, governadores e demais interessados nas verbas e nos cargos, cujo desfrute ainda se estende por mais dois anos. São facilmente reconhecíveis pelos elogios enfáticos em público e a descrença veemente em particular à candidatura Dilma Rousseff.

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