domingo, 4 de janeiro de 2009

A balança e o balanço do dólar

Vinicius Torres Freire
DEU NA FOLHA DE S. PAULO

O dólar subiu muito e, em tese, ameaça a inflação; esse vai ser o problema do BC na decisão sobre os juros

NOS PRÓXIMOS meses haverá tiroteios a respeito do efeito do encarecimento do dólar sobre a inflação. Como quase todo mundo reconhece que o repasse da desvalorização do real para os preços do varejo costuma demorar (três meses? Seis? Quem dá menos?), as escaramuças ainda são suaves.

A desvalorização do real encarece produtos importados. Afeta ainda os preços domésticos de produtos que o país exporta. Como o exportador recebe mais reais pelos seus produtos, dada a desvalorização da moeda nacional, tende a "cobrar" mais também no mercado interno ou influencia os preços dos produtores que não negociam no mercado externo, "tudo o mais constante". O problema está, pois, aí, no "tudo o mais constante", pois os preços dependem ainda de outros fatores.

Os economistas estimam o repasse da desvalorização do real para os preços domésticos calculando como a inflação se comportou em episódios anteriores de perda de valor da nossa moeda. Em cálculos mais precisos, procuram levar em conta também fatores como a demanda doméstica e externa. Como há muitas variáveis em jogo, influenciando-se de modo diferente a cada momento, tais cálculos são imprecisos. Mas, no fim das contas, a gente sabe que desvalorizações da moeda não saem de graça. Quão mais caros os preços devem ficar é que são elas.

Nos 12 meses que correram até agosto de 2008, o preço das importações brasileiras (em dólar) tinha subido em média uns 20%. No mesmo período, o dólar perdera uns 18% de seu valor nominal em relação ao real (usamos apenas o dólar para simplificar o exemplo). Ou seja, os preços subiram em dólares, mas o real se valorizou. O efeito do encarecimento dos importados sobre os preços domésticos tendia então a ser "compensado" pelo do câmbio. Desde agosto, com a crise, o dólar subiu 40% (pela cotação média do mês, até novembro). O preço dos importados em dólar subiu 4,5%. Em tese, os importados ficaram quase 46% mais caros, em reais.

Quanto desse aumento de preços em reais é enfim repassado para o varejo? Há problemas variados nessa conta, como se dizia. Os empresários trabalhavam, de fato, com qual valor do dólar em agosto? Com R$ 1,60? Ou não reduziram seus preços quando o dólar caía (isto é, teriam "gordura" para queimar)? Trabalham agora com R$ 2,30? O dólar vai ficar por aí, vai cair ou vai subir? As empresas que lidam com produtos "comercializáveis" no exterior (exportação e/ou importação) vão conseguir repassar seus preços, tanto no mercado doméstico como externo? Desde outubro, a quantidade de produtos exportados pelo país vem caindo, e a demanda doméstica também deve cair. Com demanda menor, é mais difícil repassar aumentos para o consumidor.

No último trimestre de 2008, houve uma freada brusca na economia brasileira, por ora mais observada no "atacado" e em alguns setores do varejo, como o de automóveis e de alguns outros bens duráveis. A utilização da capacidade instalada das fábricas caiu muito e rápido. O comércio mundial não deve crescer em 2009. Mas o dólar subiu muito e, em tese, ameaça a inflação. Esse vai ser o problema do Banco Central, neste mês, na decisão sobre os juros.

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