quarta-feira, 7 de janeiro de 2009

A esperança das utopias

Nas Entrelinhas: Luiz Carlos Azedo
DEU NO CORREIO BRAZILIENSE


No curto período de três meses, o mundo virou de pernas para o ar. Houve uma derrocada da concepção que entendia a globalização como fusão da desregulamentação do mercado com o fim da história e das ideologias, sob tutela de uma superpotência

Neste ano que ainda não começou — à espera da posse do presidente eleito dos Estados Unidos, Barack Obama —, como disse domingo passado, aposto na esperança das utopias. Sem voluntarismo. Elas são como a alavanca de Arquimedes: podem mover o mundo. A utopia da paz no Oriente Médio, por exemplo, com a convivência entre Israel e um novo Estado palestino, ambos com sede em Jerusalém, até para facilitar o diálogo e a cooperação entre os dois governos.
A guerra

Do que dependeria a paz no Oriente Médio? Segundo minha cara amiga Dina Lida Kinoshita, que tem sobrenome japonês mas é judia, como os filhos de olhos rasgados, depende muito mais da força da política internacional do que da política da força. No sábado passado, 150 mil israelenses foram às ruas protestar contra a guerra. Milhares de jovens judeus estão presos por se recusarem a prestar serviço militar. Não é pouco para um país de 6 milhões de habitantes, dos quais a metade é árabe. “Não há outro caminho para a paz no Oriente que não seja a aplicação da decisão da ONU de novembro de 1947 pela partilha da Palestina e criação de dois Estados: o Estado de Israel e um Estado Palestino. O primeiro foi criado em maio de 1948; o outro, até hoje, não saiu do papel”, sustenta Dina, doutora em física teórica e professora da USP.

Em 1967, na Guerra dos Seis Dias, Israel ocupou as Colinas do Golan (que pertenciam à Síria), Jerusalém Oriental, a Cisjordânia, Gaza e o Sinai. Ainda nos anos 80, devolveu o Sinai ao Egito e selou a paz com esse país. Mas a direita nacionalista e os fundamentalistas religiosos de Israel não permitem a solução de ‘paz por terra’. Os fundamentalistas palestinos do Hamas, da Jihad e do Hizbolah, bem como os países árabes que os financiam, não querem reconhecer o Estado de Israel. “Devemos lutar por dois Estados para dois povos com fronteiras seguras. Devemos lutar por uma solução pacífica e negociada através do diálogo para que os palestinos tenham o seu Estado nos territórios ocupados desde 1967 e o Estado de Israel seja reconhecido por árabes e palestinos. A história vem mostrando que a via militar não resolve mais os conflitos que surgem no mundo. O Hamas tem utilizado população civil palestina como ‘escudo’ para lançar mísseis e atingir alvos civis em território israelense. A resposta violenta do Estado de Israel só faz aumentar a espiral de violência. Mas há o ‘campo da paz’ na região tanto entre árabes e palestinos como em Israel. E é neles que devemos apostar”, argumenta Dina, veterana militante do movimento “Paz Agora”, com sua utopia.

O cenário

No curto período de três meses, o mundo virou de pernas para o ar. Houve uma derrocada da concepção que entendia a globalização como a fusão da desregulamentação do mercado com o fim da história e das ideologias, sob tutela de uma superpotência responsável pela segurança do mundo. Tudo foi por terra com a crise global. Há um novo cenário mundial. Seu desenvolvimento ainda está agrilhoado ao passado, como no Oriente Médio, mas dá sinais de que pode se libertar. A melhor maneira de compreendê-lo é aprender com a História. A nova liderança europeia, seja ela conservadora ou social-democrata, conhece as nefastas consequências das grandes crises de 1872 e 1929, que resultaram na proliferação de regimes nacionalistas e autoritários e em duas guerras mundiais.

O colapso do unilateralismo hegemonista de Bush e da desregulamentação do mercado financeiro cria condições para uma certa “governança mundial” baseada no multilateralismo.

Quem protagoniza essa possibilidade é a Comunidade Europeia, com um olho no Atlântico e outro no Mediterrâneo. Quais são os problemas com os quais o mundo globalizado se depara?

Primeiro, a necessidade de reduzir as desigualdades e resguardar os direitos humanos.

Segundo, respeitar a democracia, a liberdade e o papel civilizatório das grandes correntes religiosas.

Terceiro, reorientar a economia mundial de modo a enfrentar o problema ambiental e superar o padrão energético imposto pela utilização do carbono.

A eleição de Obama pelos norte-americanos, saudada em todo o mundo, foi o sinal de que a nova ordem mundial pode emergir.

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