domingo, 25 de janeiro de 2009

Exportações desabam na crise

Bruno Villas Bôas e Martha Beck
DEU EM O GLOBO

Brasil perde US$8,3 bilhões em apenas três meses

O desaquecimento do comércio mundial após o agravamento da crise econômica fez as exportações brasileiras perderem US$8,3 bilhões em apenas três meses, entre outubro e dezembro do ano passado. O tombo nas vendas externas reflete a menor procura por produtos no mercado internacional e a forte queda nos preços das commodities - efeitos da recessão nos países mais ricos e da desaceleração dos emergentes, como a China. A constatação é da Associação de Comércio Exterior do Brasil (AEB, que representa 300 empresas responsáveis por 90% da balança comercial brasileira), com base em estudo feito a pedido do GLOBO. Pelo valor médio diário das exportações no ano passado, seria como se o país tivesse suspendido seus embarques durante dez dias desde a piora da crise, em meados de setembro.

Pelos cálculos da AEB, os setores exportadores mais prejudicados foram mineração e metálicos (deixou de exportar US$3,349 bilhões no último trimestre de 2008), petróleo e derivados (US$2,454 bilhões), agronegócio (US$1,891 bilhão) e manufaturados em geral (US$651 milhões). Segundo José Augusto de Castro, vice-presidente da associação, as perdas surpreenderam o mercado, já que a retração era aguardada só a partir deste ano:

- Existe historicamente uma defasagem de três meses entre o início das crises e seus efeitos sobre a balança comercial. Mas essa crise é tão grave que nos atingiu muito antes. Contratos já foram renegociados ou suspensos, preços e volumes caíram. Muitos diziam que os emergentes não seriam atingidos. Mas não é o que estamos vendo.

"Não teremos só retração, mas competição brutal dos asiáticos"

O governo brasileiro reconheceu os prejuízos causados pela crise, mas defendeu que a queda foi menor. Segundo o Ministério do Desenvolvimento, as perdas somaram US$7,1 bilhões entre outubro e dezembro, valor que considera tanto a turbulência da crise quanto os problemas climáticos que afetaram a produção agrícola do Sul do país. Os prejuízos com as chuvas seriam de US$2 bilhões, segundo o governo, valor que a AEB considerou superestimado.

- A safra estava praticamente toda colhida quando ocorreram as fortes chuvas, e o preço dos produtos agrícolas teve uma variação muito pequena - afirma Castro.

As exportações de commodities foram as mais abaladas na crise. Só em minério de ferro a perda foi de US$1,58 bilhão, com menos 22 milhões de toneladas embarcadas. As vendas para a China, maior consumidor, caíram 10,86% em novembro e 1,7% em dezembro. No grupo petróleo e derivados, o petróleo bruto exportado pela Petrobras respondeu por US$1,98 bilhão do impacto total. Segundo Castro, o motivo foi a queda dos preços internacionais, de US$688,7 para US$320,2 a tonelada. O Brasil exporta o produto principalmente para os EUA.

Segundo o vice-presidente executivo da Associação Brasileira da Indústria Química (Abiquim), Nelson Pereira dos Reis, a turbulência foi maior em dezembro, quando foram embarcados 9% menos frente o mesmo mês de 2007. A redução ocorreu também com a menor procura na União Europeia (UE) e no Mercosul, onde as indústrias têm mais estoques.

- Uma das maiores quedas veio do consumo da indústria automobilística. Os bens duráveis estão neste momento mais problemáticos e afetaram o nosso desempenho, que era crescente - afirma Reis.

Mas as perdas foram generalizadas, e nenhum setor saiu ileso. No agronegócio, os prejuízos foram maiores em carnes suína (US$172 milhões), bovina (US$541 milhões) e de frango (US$469 milhões). Embora as exportações de alimentos processados tenham crescido 25% no ano, o economista da Associação Brasileira das Indústrias da Alimentação (Abia), Denis Ribeiro, lembra que o setor perdeu espaço no último trimestre. Ele representava 29,3% da pauta de exportações em outubro, 27% em novembro e 25% em dezembro. Segundo Ribeiro, vários contratos estão sendo revistos.

Os manufaturados também foram prejudicados, embora em menor escala. Houve perdas em autopeças (US$ 227 milhões), tratores (US$50 milhões), celulares (US$142 milhões) e veículos de carga (US$88 milhões). O setor de vestuário, que geralmente exporta mais em períodos de alta do dólar, perdeu US$31 milhões.

O diretor superintendente da Associação Brasileira da Indústria Têxtil e de Confecção (Abit), Fernando Pimentel, diz que a valorização do dólar foi acompanhada de uma queda sensível nas vendas, eliminando a possibilidade de crescimento:

- Não teremos só retração, mas uma competição brutal dos asiáticos, que estão com estoques altos e vão derrubar seus preços. Janeiro será mais difícil - avalia.

No pior cenário, perdas em 2009 podem chegar a US$40 bi Segundo o secretário de Comércio Exterior do Ministério do Desenvolvimento, Welber Barral, a balança comercial de janeiro vai mostrar o pior resultado dos últimos anos. Até agora, o déficit chega a US$390 milhões - algo que não ocorre desde março de 2001 em qualquer mês.

- Janeiro de 2009 será o pior (janeiro) dos piores - diz Barral, lembrando que além da crise, sempre há redução nas vendas no início do ano.

O secretário diz que, em função da volatilidade do câmbio, muitos exportadores não fecharam contratos em setembro e outubro, o que vai aparecer nas vendas de janeiro e fevereiro. Mas ressalta que o quadro deve melhorar no segundo trimestre.

Um estudo do Ministério do Desenvolvimento preparou cinco cenários para as exportações em 2009. No pior deles, haveria queda de US$40 bilhões neste ano (fechando em US$158 bilhões). Na melhor das hipóteses, as exportações chegariam a US$202 bilhões, ou seja, US$4 bilhões a mais que no ano passado.

O ex-ministro da Agricultura Roberto Rodrigues acrescenta que, além do desaquecimento da economia global, a escassez de crédito deixou os produtores sem capital. Ele afirma que a situação vai se agravar este ano, quando o total das exportações desse setor pode cair US$20 bilhões: - O saldo comercial do agronegócio é sempre positivo, mas esse ano pode haver um déficit.

Para o economista da Tendências André Sacconato, o efeito da crise nas exportações foi forte no fim de 2008, mas o quadro deve melhorar no meio do ano. Ele afirma que o momento é de incerteza, o que inibe o consumo, mas, com as ações que vêm sendo adotadas pelos governos para estimular a atividade, poderá haver uma retomada das vendas brasileiras ao exterior, mesmo que em menor patamar.

- O quadro atual não mostra o que vai ser o ano. A gente acredita numa retomada - diz Sacconato.

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