sexta-feira, 30 de janeiro de 2009

Números contam

Miriam Leitão
DEU EM O GLOBO

O Brasil pode ter uma queda de 10% na produção industrial de dezembro. O número sai semana que vem. Uma queda deste tamanho só aconteceu em 1996. O PIB do último trimestre pode cair 1,9%, a pior queda trimestral desde 1991. A contração neste quarto trimestre foi maior aqui do que nos EUA. Esses números devem levar o Banco Central a rever a posição sugerida na ata divulgada ontem.

As previsões acima de produção industrial e do PIB do último trimestre são do CSFB. O economista chefe do banco, Nilson Teixeira, disse que os dados têm surpreendido os mais pessimistas.

- Esperávamos uma desaceleração da economia brasileira, mas a contração está sendo maior do que nós calculávamos. Está caindo tudo, emprego, salário, produção. Na nossa leitura, o desemprego está subindo mais rapidamente do que achávamos, a contração acontecendo mais rapidamente. As empresas estão sem visibilidade do que vai acontecer na economia.

Na Tendências, o economista Gustavo Loyola, que foi presidente do Banco Central, prevê que daqui até a próxima reunião do Copom os dados de inflação que serão divulgados e os da economia podem surpreender.

- Os dados de inflação serão bastante tranquilos e os dados do nível de atividade vão mostrar que a conjuntura se deteriorou mais do que o esperado.

Um dado pode revelar a dimensão da queda brasileira. Nilson Teixeira acha que o PIB do quarto trimestre de 2008 vai mostrar que a economia brasileira contraiu mais do que a americana no último trimestre do ano passado. O número do PIB americano deve ter queda de 4,5%, na previsão do CSFB. Mas lá, eles apresentam os dados anualizados.

- Isso equivale a uma queda de 1,1% na nossa forma de medir, trimestre contra trimestre. Já nós, vamos ter uma queda de 1,9%, quase 2% no último trimestre.

O detalhe é que o dado do PIB brasileiro do quarto trimestre de 2008 vai sair perto da próxima reunião do Copom. É por isso que ele acha que o BC vai dar mais dois cortes de um ponto percentual nas próximas duas reuniões.

- E se não for 1 ponto percentual, eu acho que é mais provável 1,5 do que 0,75 ponto percentual. Essa é a minha leitura. Há leituras diferentes no mercado, mas eu acho que o BC, na próxima reunião, estará diante de um ambiente econômico mais deteriorado do que está prevendo. Um corte mais forte ajudará a restabelecer a confiança e aumentar a oferta de crédito - diz Nilson.

Esta é também a opinião de Gustavo Loyola. Ele acha que na próxima reunião o Banco Central deve reduzir de novo em um ponto percentual a taxa de juros, exatamente pela deterioração do nível de atividade.

A dúvida sobre o próximo passo do BC vem de alguns fatos. Primeiro, três dos diretores achavam que a velocidade consistente de queda dos juros era um corte de 0,75 ponto percentual. Segundo, a ata do Copom repete a expressão usada na nota divulgada após a reunião, de que "parte substancial" do corte já foi feito.

Gustavo acha que o BC repetiu essa expressão porque a intenção é a de fazer, no curto prazo, a maior parte do corte de juros, em vez de distribuir os cortes ao longo do tempo.

Nilson Teixeira acha que os dados a serem divulgados de agora até a reunião do Copom mostrarão que a queda é brusca demais.

- Nós estávamos crescendo a 7% na margem, vamos contrair 7% na margem. É como um carro que está acelerando e tem que dar marcha a ré - compara.

O desemprego de janeiro pode chegar a 9% na visão do CSFB. Isso significa sair de dezembro com 6,8% e ir para 9%. A Pesquisa Mensal de Emprego do IBGE sempre mostra alta do desemprego em janeiro, mas ele acha que, desta vez, o movimento será mais acentuado, porque os demitidos do fim do ano, que entraram na conta do Caged, devem entrar só agora na PME.

O cenário internacional também está sendo revisto para pior, em todos os bancos e consultorias.

- Cada vez que revisamos aqui o cenário internacional é para acentuar a queda. Em relação ao Brasil, a cada revisão o crescimento é menor. No fim do ano previmos 1,3% de crescimento e todos nos acharam pessimistas. Agora, outras previsões estão convergindo para este número e, se nós fôssemos rever, o número seria menor - diz Nilson Teixeira.

A ata do Copom divulgada ontem não tem qualquer relação com a da última reunião. O que era suspeita de crise virou certeza, o que era temor de alta de inflação virou a convicção de que as pressões inflacionárias estão em queda. O cenário mudou completamente. A certa altura, a ata diz que "as tendências contracionistas prevalecem sobre as pressões inflacionárias"; em outro momento, registra que há "pressões baixistas sobre preços do atacado a despeito do ajuste cambial".

Aquele quadro de excesso de demanda e risco inflacionário, que motivou o último aperto monetário, mudou radicalmente. Hoje, o risco é o inverso. E pelo que disseram os dois economistas que entrevistei: os dados a saírem nas próximas semanas vão mostrar que o quadro é ainda pior do que o descrito na ata do Copom. Isso levará, portanto, o Banco Central a fazer novos e fortes cortes nos juros no curto prazo.

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