quarta-feira, 11 de fevereiro de 2009

Casuísmo eleitoral

Nas Entrelinhas :: Luiz Carlos Azedo
DEU NO CORREIO BRAZILIENSE

A reforma política não passa no Congresso, só os casuísmos, como a janela para o troca-troca partidário

Não estou entre aqueles que consideram o nosso sistema eleitoral a matriz de todos os males da política brasileira. Temos a maior democracia de massas do mundo, com eleições limpas, voto direto, secreto e universal. A crise de representatividade dos partidos é um problema mais profundo, que independe do sistema eleitoral. Desconfio de reformas políticas aprovadas a toque de caixa, às vésperas das eleições. É um cacoete herdado do regime militar, que recorria aos casuísmos eleitorais para favorecer o status quo.

Por isso mesmo, a proposta de reforma política enviada ao Congresso pelo governo Lula, por mais bem-intencionada que seja, acabará virando mais um casuísmo eleitoral. Se a reforma política fosse mesmo fundamental para o governo, teria sido feita no primeiro mandato do presidente Lula ou logo nos primeiros meses do segundo. Ou seja, estamos diante de mais uma mudança nas regras do jogo às vésperas da eleição, o que não é novidade. Eis a reforma:

Lista partidária fechada

Os eleitores não votarão em candidatos a vereador, deputado estadual e federal, mas nos partidos, que concorrerão com listas fechadas de nomes. A cédula eleitoral terá espaço apenas para que o eleitor indique a sigla ou o número do partido em cuja lista pretende votar. Comentário: a proposta dá poderes ilimitados aos donos dos partidos.

Financiamento de campanhas

O Orçamento da União incluirá dotação destinada ao financiamento público exclusivo de campanhas. O TSE distribuirá os recursos da seguinte forma: 1% dividido igualmente entre os partidos registrados; 19% divididos igualmente entre os partidos com representação na Câmara; e 80% divididos entre os partidos proporcionalmente ao número de eleitos na última eleição para a Câmara. Comentário: só beneficia os grandes partidos.

Fidelidade partidária

Os parlamentares que mudarem ou forem expulsos de partido perderão os mandatos para os respectivos suplentes. Será permitida a desfiliação em caso de perseguição política ou mudança de programa partidário, desde que aprovada pela Justiça. Será possível mudar de partido para disputar a eleição subsequente. Comentário: abre-se uma janela para o troca-troca partidário.

Inelegibilidade

São inelegíveis candidatos condenados em segunda instância, seja por crime eleitoral ou por um rol de delitos, que inclui abuso do poder econômico ou político, crime contra a economia popular, contra a administração pública ou por tráfico de entorpecentes. A inelegibilidade valerá para a eleição à qual o candidato concorre ou foi eleito e para as que se realizarem no três anos seguintes. Comentário: contraria decisão do STF de que ninguém pode ser impedido de concorrer à eleição antes do processo ser concluído na última instância.

Coligações

Fim das coligações para eleições proporcionais (para deputado federal, estadual e vereador). A coligação das eleições majoritárias (para presidente, governador, prefeito e senador) disporá do tempo de rádio e televisão destinado ao partido com o maior número de representantes na Câmara. Comentário: liquida os pequenos partidos e redistribui os tempos de televisão dos partidos que não lançarem candidaturas próprias.

Cláusula de barreira

O mandato de deputado (federal, estadual ou distrital) só poderá ser exercido pelo candidato eleito cujo partido alcançar pelo menos 1% dos votos válidos, excluídos os brancos e os nulos, em eleição para a Câmara, e distribuídos em pelo menos um terço dos estados, com o mínimo de 0,5% dos votos em cada estado. Comentário: a representação dos pequenos partidos será cassada.

A reforma política não passa no Congresso, só os casuísmos, como a janela para o troca-troca partidário, sem a qual o fim das coligações e a clausula de barreira dificilmente serão aprovadas.

O voto em lista tem apoio no Senado, mas não na Câmara. Eleitos pelo voto proporcional uninominal, os deputados não entregarão a própria reeleição à burocracia partidária. O financiamento público enfrenta resistência pelo mesmo motivo. Quanto à inelegibilidade, é como falar de corda em casa de enforcado.

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