sexta-feira, 6 de fevereiro de 2009

Otimismo de resultados

Dora Kramer
DEU EM O ESTADO DE S. PAULO

Atitude propositiva é um dado da realidade, ajuda. O sucesso do Plano Real no combate à inflação deveu-se, em grande parte, à participação da sociedade que aderiu às fórmulas de transição da moeda, ergueu uma barreira contra a remarcação de preços e a coisa deu certo.

Portanto, partamos do princípio de que o tom corrente pra frente do presidente Luiz Inácio da Silva, no caso da crise econômica, além de evitar um ambiente de dispensável baixo-astral, não causa danos. Inclusive porque seus efeitos piores ou melhores independem da vontade presidencial e estão à disposição de quem quiser tomar conhecimentos deles - detalhada ou superficialmente.

Já não se pode fazer a mesma avaliação, contudo, dos tantos episódios em que o presidente da República abusou do direito de apartar sua figura simbólica das adversidades reais do País. A crise aérea foi o exemplo mais dramático.

Lula negou as agruras por que passavam milhares de passageiros nos aeroportos diariamente, apartou-se do tema até que foi obrigado a lidar com ele no pior contexto possível: o desastre da TAM em Congonhas.

Mesmo assim, pôde prosseguir na estratégia iniciada quando da eclosão do primeiro escândalo de corrupção, o caso Waldomiro Diniz, no início do segundo ano do primeiro mandato, e levada aos píncaros por ocasião da descoberta de que a direção de seu partido e integrantes de seu governo davam-se a práticas de quadrilha.

Qual estratégia? A de não atuar no molde de um presidente tradicional que compreende como inerente à função a administração da bonança e da tempestade. Lula optou, e com bons resultados políticos, por continuar atuando sob a ótica da simbologia de origem, forjada nos tempos de oposição: é o zelador da porta da esperança nacional.

Sendo assim, não há fundamento na perplexidade geral com os altos índices de popularidade do presidente. Ele só dá boas notícias e passa uma descompostura na adversidade sempre que ela se apresenta. Antes, era tudo culpa do governo ou "disso tudo que está aí"; agora, se há problemas, resultam da vontade da torcida contra ou da herança de malfeitorias nos últimos 500 anos.

Natural, portanto que seja identificado com o lado luminoso da vida. Lula tem dois tipos de atuação: quando as coisas vão bem, assume o presidente, aí sim, dono de todos os méritos, incluídos os externos e os do passado; quando vão mal, entra em cena o crítico do sistema, internacional e do passado, pouco interessando que este esteja em vigor, na forma de parceria com o presente e aquele tenha mantido, até outro dia, as vacas em regime de engorda.

A diferenciação dessas situações cabe à massa crítica de um País fazer. Como a que existe entre nós oscila entre o constrangimento, a rendição ao argumento de que a popularidade é o valor maior e o enfado, o exame de mérito não entra na avaliação do desempenho do presidente e do governo.

Não entra, mas de certa forma está - ainda que superficialmente - presente no sentimento de perplexidade diante de cada nova pesquisa registrando mais uma subida nos índices. Senão, vejamos: se o presidente e o governo tivessem uma aprovação incontestável, incutida naturalmente na convicção do senso comum, por que a surpresa?

As pesquisas não seriam acompanhadas de por quês nem a estupenda popularidade seria vista como um mistério a ser desvendado. Se assim ocorre é porque, de fato, não se enxergam razões objetivas para tanto sucesso.

E não são visíveis porque são subjetivas: têm a ver, de um lado, com a estratégia do otimismo de resultados e, de outro, com o abandono do salutar exercício do raciocínio que nos permite distinguir fato a ficção.

Incompatível

A proposta de transferir do Legislativo para o Judiciário o julgamento da conduta parlamentar tem a finalidade de tirar desses processos a celeridade e a visibilidade própria dos procedimentos políticos no ambiente livre do Congresso.

Muita gente defendeu essa ideia à época do mensalão e escândalos correlatos. Agora quem defende tal deturpação é o novo corregedor da Câmara, Edmar Moreira, sob o argumento de que, sendo o "vício da amizade" entre colegas, "absolutamente insanável", a Justiça livraria o Parlamento do ônus da parcialidade e, evidentemente, da cobrança pública.

Quer dizer, o responsável pelo zelo da compostura interna não vê nada demais na quebra do preceito constitucional da impessoalidade que preside o comportamento do agente público e ainda se apresenta como guardião do compadrio.

A incompatibilidade do deputado com o cargo de corregedor é "absolutamente insanável". Por essa profissão de fé na proteção a acusados e por outras mais, evidenciadas na declaração falsa de patrimônio à Receita e constantes no inquérito de que é alvo no Supremo Tribunal Federal sob a acusação de fraudar a Previdência em R$ 1 milhão.

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