terça-feira, 3 de fevereiro de 2009

Passada a crise, o emprego volta?

José Pastore
DEU EM O ESTADO DE S. PAULO

Essa pergunta me atormenta. Sei que é um pouco cedo para tal, porque o fim da crise está longe. Ainda assim me preocupo.

Será que as empresas que estão sem caixa, sem crédito, sem demanda e sem perspectivas - mergulhadas num verdadeiro tsunami - vão se animar a remontar o quadro de pessoal que tinham quando a economia estava a todo vapor?

Passo ao leitor algumas observações corriqueiras. Perguntei a um motorista de táxi se a crise estava afetando o seu negócio. Ele me disse: "Está, e muito. As empresas com as quais eu tenho contrato permanente para atender seus funcionários, agora, só permitem a utilização do táxi mediante autorização do alto escalão. Poucos usam. Perdi 70% da minha receita."

Passada a crise, será que essas empresas vão revogar essa nova regra? Elas vão continuar com a liberalidade que tinham para contratar taxistas, decoradores, eventos sociais, treinamentos, etc.? Elas manterão os mesmos quadros de pessoal, que geram despesas de monta tanto para contratar como para despedir?

Suspeito que parte dos trabalhadores despedidos não será recontratada. Os altos custos de contratação (103% do salário) farão as empresas pensarem duas vezes, e as elevadas despesas de demissão, três vezes.

Vejam o caso hipotético de um funcionário que ganha R$ 1 mil por mês e tem cinco anos de trabalho na mesma empresa. Se a sua dispensa for feita longe da data-base e com o gozo do aviso prévio em tempo, só com o FGTS a empresa terá uma despesa de R$ 8.388,89 - oito salários. Se for perto da data-base e com o aviso prévio pago em dinheiro, serão R$ 10.669,96 - mais de dez salários!

Demitir é caro, e não só por conta do FGTS. A empresa gasta muito na capacitação dos seus colaboradores. Formar uma equipe competente, harmoniosa e conhecedora da cultura da organização leva anos e investimentos continuados no capital humano. Ou seja, despedir envolve perdas de grande vulto.

Com uma crise tão profunda, muitas empresas serão tentadas a reformular a sua política de emprego. A retomada do crescimento será feita com menos empregos fixos (e internos) na empresa, mais trabalho eventual (externo) e com muita automação.

As atividades estratégicas devem continuar entregues a um pessoal fixo, leal e competente - é claro. Outras atividades, porém, serão realizadas com base em contratos de empreita ou de prestação de serviços - que têm começo, meio e fim (regidos pelo Código Civil, e não pela CLT) -, ou por meio de trabalho temporário (Lei nº 6.019), por prazo determinado (Lei nº 9.601), por cooperativas (Lei nº 5.764), ou ainda por meio de terceirização decente, se for regulamentada a tempo. Isso já vem ocorrendo. A crise intensificará essa tendência.

A se confirmar essa especulação, só me resta dizer que, infelizmente, uma parte do desemprego atual veio para ficar. Será mais um passo no processo de reestruturação das empresas, com profundas implicações aos trabalhadores. Para entrar no quadro fixo, a concorrência será brutal.

O rigor no recrutamento aumentará muito. Os candidatos precisarão estar muito bem preparados na sua profissão e nos conhecimentos gerais que hoje se exigem das pessoas mais qualificadas.

O rigor aumentará também para os que forem contratados externamente, pois as empresas procurarão monitorar melhor os contratos que fizerem, para com isso terem mais segurança jurídica.

E para os que não forem contratados como fixos nem como prestadores de serviços restará o trabalho por conta própria, que também enfrentará desafios da concorrência.

O desemprego atual não é meramente friccional. No caso deste, quando a tormenta passa, o presente continua parecido com o passado e quase todos voltam ao trabalho. Quando há reestruturação tecnológica ou administrativa o mundo é outro: o presente fica bem diferente do passado, criando novas formas (cada vez mais austeras) de produzir e trabalhar.

Para ter chance neste novo mundo, recomendo aos jovens investirem pesadamente na sua preparação. Não parem de estudar durante a crise. Ao contrário, acelerem. Estudem além da sua profissão. Busquem a formação ampla, sem descuidar da especialidade. Se aparecer um estágio, aproveite, mesmo que não seja o dos seus sonhos. Na crise temos de pegar o que existe, que nem sempre é o que queremos.

*José Pastore é professor de relações do trabalho da Universidade de São Paulo

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