domingo, 22 de março de 2009

A proteção social de Lula e a crise

Vinicius Torres Freire
DEU NA FOLHA DE S. PAULO

Pibinho arranha presidente, mas rede luliana de benefícios sociais e salariais ficou ainda mais ampla e alterou a política

O PRESTÍGIO de Lula caiu. Seriam os primeiros reflexos do baile da crise, parece. Mas a reação política a períodos de dureza econômica não é previsível como a de um cão de Pavlov. De resto, quem pretenda estimar os efeitos do PIBinho na avaliação do presidente e, mais temerário, na eleição de 2010 terá de prestar ainda mais atenção à "rede de proteção social" de Lula. A ambiguidade é proposital: é proteção de Lula e dos desvalidos.

Mesmo em termos apenas quantitativos, os benefícios sociais vão muito além do clichê do Bolsa Família e não afetam apenas recipientes diretos de assistência. Em termos políticos, a rede social luliana parece ter redefinido o contrato entre pobres e governante; alterou a qualidade e a quantidade dos "mínimos sociais" que devem constar dos compromissos dos futuros candidatos.

A quantidade de pessoas colhida diretamente pela rede social luliana é imensa. São os 11 milhões de famílias do Bolsa Família (cerca de 40 milhões de pessoas). São os 17,8 milhões que recebem benefícios previdenciários e assistenciais de até um salário mínimo, que teve reajuste real de 45,5% no governo Lula.

Mesmo que não alterem a qualidade da economia de pequenas cidades, os benefícios previdenciários e de assistência social alimentam o pequeno comércio, os negócios caseiros e dão vazão a pequenas sobras da agricultura de subsistência. O "Bolsa Avós", a Previdência "rural", auxilia parentes e agregados. Entre Previdência e assistência, contados só programas de renda, são 37 milhões de beneficiados diretos.

O menos conhecido Pronaf concede, por ano, 1,5 milhão de financiamentos para agricultores familiares (média de R$ 5.000 para cada um). Há outros tantos no Proger, que auxilia micronegócios, mas que foi em parte desvirtuado e ajuda negócios maiores, o que dificulta o cálculo de beneficiados pobres (no total, são 2 milhões de operações por ano). O ProUni banca o ensino superior de 310 mil garotos. Há os assentados da reforma agrária, os quilombolas, os resgatados do trabalho infantil etc.

Uns 7% da população ocupada, 6,2 milhões, são funcionários públicos. Muitos servidores federais receberam aumentos sob Lula. Servidores estaduais e municipais tiveram os reajustes do mínimo, que também elevou o salário dos mais pobres.

Há mais empregos formais. O país não crescia tanto como no último quinquênio desde os cinco anos encerrados em 1981 ou em 1988 (este não conta muito, dados a hiperinflação, a base baixa de comparação e o estelionato do Cruzado). O nível de pobreza é o menor desde que se tem registro (isto é, em 32 anos).

Mesmo que não piore no resto do mundo, a crise ainda vai produzir coisas feias no Brasil. Até 2010. Mas a maioria vai absolver Lula, por considerar que ele cumpriu o "contrato" de aliviar a pobreza (tanto faz se mal ou bem, esse é um debate teórico, restrito a poucos)? Verá em Dilma Rousseff a herdeira dessa credibilidade política (caso a herança não se desfaça)? A memória dos "direitos adquiridos" vai fazer com que o eleitor queira mais, a ponto de arriscar o novo? Ou vai torná-lo conservador? Com qual programa a oposição convencerá a maioria pobre de que vai respeitar esse "novo contrato social" e ainda oferecer algo mais?

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