sábado, 18 de abril de 2009

Ação de moderados procura conter Chávez

Gilberto Scofield Jr.* e Eliane Oliveira
DEU EM O GLOBO


Lula se destaca entre os líderes que agem para atenuar os conflitos com a Casa Branca, e negocia parceria estratégica

PORT OF SPAIN e BRASÍLIA. Apesar das tentativas do presidente venezuelano, Hugo Chávez, de roubar a cena, a diplomacia da maioria dos países participantes da Cúpula das Américas aposta que os gestos conciliatórios recentes entre os EUA e Cuba e a ação de líderes latinos considerados moderados - como o presidente Luiz Inácio Lula da Silva, do Brasil, Michelle Bachelet, do Chile, e Felipe Calderón, do México - serão capazes de evitar que Chávez, com seu discurso virulento, ameace a elaboração de uma proposta de ações comuns entre as nações.

Prestigiado com os sucessivos elogios de Obama, o presidente Lula tende a ser o contraponto de um possível duelo entre o líder americano e Chávez. Os EUA esperam mais do que uma parceria estratégica com o Brasil no campo bilateral. Obama já deixou claro seu desejo de que Lula use sua liderança na região para atenuar os conflitos entre alguns vizinhos e a Casa Branca.

Lula, contudo, deverá cobrar algo em troca, de preferência um compromisso mais firme de Obama em relação ao etanol. Apesar do distanciamento de George W. Bush da América do Sul, o ex-presidente americano sempre foi favorável -- e com ações concretas -- a um trabalho conjunto com o Brasil no campo do etanol e outros combustíveis renováveis. Para o governo brasileiro, seria fundamental que os dois países investissem em projetos desenvolvidos em países mais pobres, com ênfase no Caribe.

Líderes da Alba veem no G-20 um "grupo de exclusão"

Ontem, os países que integram a Aternativa Bolivariana para as Américas (Alba) e até quinta-feira estavam reunidos em Cumaná, na Venezuela, divulgaram dois documentos em que afirmam ser inaceitável e insuficiente a resolução a ser divulgada pela Cúpula das Américas, por não responder satisfatoriamente à crise econômica mundial e deixar de fora Cuba. Um dos documentos chega a criticar aquele que é considerado uma das maiores conquistas da diplomacia brasileira, o G-20, acusado ser um "grupo de exclusão" em cujo interior são tomadas decisões à revelia de outros países.

Não está claro ainda se a estratégia do grupo de países - que inclui, além da Venezuela, Nicarágua, Bolívia, Honduras, Dominica e Cuba - é esvaziar a resolução, recusando-se a assiná-la e condenando-a, ou apenas condenar o documento mas assiná-lo do mesmo jeito, caso consigam alterar um ou outro ponto no texto final do encontro nas discussões de hoje e amanhã. Chávez deve tentar enfraquecer a Cúpula com palavras raivosas antiamericanas, como fez ontem durante cerca de 45 minutos o nicaraguense Daniel Ortega em seu discurso na noite de abertura.

- Mas ele vai ter um cenário um tanto mais difícil, ou ao menos mais constrangedor, para fazer seu barulho habitual - diz um diplomata presente às negociações. - Simplesmente porque Obama tem enorme popularidade entre os países latinos agora e vem acenando com um rompimento na relação distante, quase inexistente, que os EUA tinham com o continente.

Na manhã de hoje , em Trinidad e Tobago, os líderes da União Sul-Americana de Nações (Unasul) tentarão passar seus recados, anseios e reivindicações durante uma reunião inédita, de apenas 45 minutos, com o presidente americano. Para representantes do governo brasileiro e alguns especialistas, o encontro com Obama pode até não render decisões e compromissos, mas todos vão querer conquistar espaço no evento que marca uma aproximação política da região com a Casa Branca. Afinal, desde o início da década, a diplomacia americana colocou a América do Sul no pé de sua lista de prioridades.

O encontro com Obama, a ser realizado a pedido do presidente americano, está marcado para as 8h (9h de Brasília), seguido pelas reuniões plenárias dos chefes de Estado e de governo que participam da Cúpula.

- Essas reuniões em nível de presidentes são simbólicas, servem mais para fotografias. É mais um gesto, uma mensagem midiática. Ninguém toma decisão - comentou o ex-ministro das Relações Exteriores, Luiz Felipe Lampreia.

No meio diplomático, espera-se que a presidente do Chile tenha algum trabalho ao mediar as discussões e amansar os mais cáusticos, como Hugo Chávez, Rafael Correa (Equador) e Evo Morales (Bolívia). As atenções deverão estar voltadas ao que Chávez pode dizer a Obama - depois do cordial aperto de mãos de ontem.

- Não descartamos um confronto direto entre Chávez e Obama, mas esperamos que isso não aconteça - afirmou um embaixador brasileiro.

(*) Enviado especial

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