quarta-feira, 1 de abril de 2009

Cenários distorcidos

Rosângela Bittar
DEU NO VALOR ECONÔMICO

A exatamente um ano do início efetivo da temporada eleitoral de 2010, marcado pelo prazo de desincompatibilização para quem vai se candidatar, os cenários das disputas apresentados nas três pesquisas de opinião divulgadas na última semana, dos Institutos Datafolha, Ibope e Sensus, permitem registrar, em geral, estagnação do quadro geral com alguns poucos atores em movimento.

Estes estão, principalmente, nos levantamentos sobre sucessão estadual. Uma evidência inesperada é o desempenho de Geraldo Alckmin (PSDB) junto ao eleitorado de São Paulo, que o colocou na liderança da disputa para o governo do Estado. Ele tinha, em retrospecto, boa avaliação em pesquisas para a sucessão estadual, mas sua baixa performance na campanha para a prefeitura, ano passado, criou a impressão, que revelou-se falsa, de que precisaria de tempo para se recuperar.

O desempenho na eleição municipal não lhe fez tão mal assim: os candidatos adversários, Marta Suplicy e Gilberto Kassab, atacaram-se mutuamente e com isto mantiveram preservada a imagem do ex-governador tucano.

Outro destaque das atuais pesquisas é a boa situação de Hélio Costa (PMDB) na disputa pelo governo de Minas. O ministro das Comunicações não teve papel importante nas eleições municipais, surge agora como líder em qualquer cenário.

O preliminar candidato do popular governador Aécio Neves (PSDB), Antonio Anastasia, atual vice-governador, terá sua hipotética candidatura colocada em hibernação por um período, de forma a permitir melhor análise do quadro estadual com a ocupação do espaço protagonizada por Hélio Costa. Porém, esta não é uma situação consolidada. Não se pode imaginar que a campanha vá manter Aécio, seu candidato e seu apoio fora do jogo da sua própria sucessão. Impossível.

Os cenários da Bahia, de Pernambuco e alguns dos levantamentos sobre a sucessão presidencial estão distorcidos pela composição da disputa, mas revelam também indícios de movimento. O governador baiano Jaques Wagner (PT) está em primeiro lugar no pleito da reeleição, com 36%, e seu ex-aliado do primeiro mandato Geddel Vieira Lima (PMDB), que com ele vem disputando a rédea do poder, está apenas no quarto lugar. Parecia ter mais apoio popular.

Não é isto, porém, que desvirtua a situação. Entre os dois a pesquisa inclui, na mesma disputa, Paulo Souto (DEM), com 19% e Cesar Borges (PR), com 10%. Além de ambos terem o mesmo eleitorado (são ex-governadores formados no antigo PFL e egressos do carlismo), não há decisão sobre a candidatura Borges. Estas intenções de voto, para retratarem uma situação real, teriam que estar somadas.

Caso semelhante pode-se registrar em Pernambuco, onde o atual governador, Eduardo Campos (PSB), lidera com 40% das intenções de voto. O ex-governador Jarbas Vasconcelos (PMDB) marca 34%, mas na mesma lista está incluído o seu aliado José Mendonça (DEM), com 10%, que tem eleitorado em comum.

O presidente Lula tem feito um apelo à unidade na sua base aliada e demonstrado a importância de convergirem todos para um único candidato, mas isto não deveria ter sido suficiente para não fazer constar os candidatos Dilma Rousseff (PT) e Ciro Gomes (PSB) da mesma lista de opção de voto. Não há decisão sobre a candidatura única e a entrada de Ciro no cenário pode alterar bastante o quadro de intenções de voto tanto para o PT quanto para o PSDB.

As atuais pesquisas retratam ainda uma situação delicada para a candidatura governista à sucessão presidencial no que se refere ao desempenho dos candidatos nos Estados. Em 2006, com altos índices de popularidade e sendo ele próprio candidato, o presidente Lula podia ter candidatos fracos nos Estados que ajudaria a levantar e crescer. A ministra Dilma Rousseff não possui este condão, ao contrário, precisa ter candidatos fortes nos Estados, os mais fortes do ranking, para ajudá-la a avançar na preferência do eleitorado. Ainda não os tem.

Duas outras coisas se notam a um ano da desincompatibilização: nenhum potencial candidato apresenta a esta altura um projeto digno de conquistar multidões; e muitos deles estão crescendo pela evidente antecipação das campanhas em todos os níveis. Esta antecipação seria uma características de eleições em que quem já é conhecido e popular, como Lula, não pode ser candidato. Desde cedo é preciso fortalecer um nome para torná-lo competitivo.

Palavreado

O deputado Ciro Gomes (PSB-CE), depois de um período de afastamento da política, reassumiu no último fim de semana presença no debate sucessório, mas não parece transformado pela fase de recolhimento. Contraditório, em entrevista à revista Isto É destaca sua fraterna amizade com a ministra Dilma Rousseff, candidata à sucessão do presidente Lula, que considera uma administradora "sem par", embora ataque sua administração. "O Brasil precisa de administração profissional e meritocrática. A administração pública não vai bem. O desempenho do PAC é sinal disso. Hoje tem muito mais dinheiro que capacidade de fazer".

E o palavreado continua também o mesmo. As alianças são presididas pela "fisiologia, clientelismo, concessão à safadeza, à ladroeira". E a palavra "estúpida" volta com força para qualificar a legislação de meio ambiente, de licitações, de controle de contas, além da inflação de demanda. Os admiradores do vocabulário do deputado só sentiram falta do "otário".

Ato de vontade

Passou desapercebida e sem desdobramentos ou explicações entrevista do presidente Lula à CNN, no domingo, em que ele confessa que, graças ao elevado índice de popularidade de que dispõe poderia disputar mais um mandato. Bastaria, receitou, propor que um deputado apresentasse uma emenda de terceiro mandato (seu amigo Devanir Ribeiro, do PT, já a apresentou). Mas simplesmente não quis.

Rosângela Bittar é chefe da Redação, em Brasília. Escreve às quartas-feiras

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