quinta-feira, 16 de abril de 2009

Covardia contra a população na linha do trem

Agentes agridem a socos e chicotadas passageiros dentro de vagões apinhados em Madureira

Rio - A greve dos ferroviários queria alertar para a falta de segurança nos trilhos, mas mostrou muito mais: o passageiro corre perigo também com socos, pontapés e chicotadas desferidos por agentes de controle, como são denominados os guardas que deveriam orientar a entrada nos vagões. Ontem, por volta das 7h30, câmeras de TV flagraram funcionários agredindo trabalhadores para forçá-los a entrar em vagões apinhados em Madureira. Um PM ajudou a empurrar os passageiros — sem agredi-los —, mas não impediu a ação dos guardas. As imagens chocaram a cidade. Em Assembléia que terminou no final da noite desta quarta-feira, em Deodoro, os ferroviários decidiram continuar em greve.

As cenas chocantes geraram uma série de denúncias. O Ministério Público, a Comissão de Transportes da Assembleia Legislativa e a Agetransp (Agência Reguladora de Transportes) receberam queixas de que agressões são rotineiras. A Agetransp abriu processo que pode terminar em multa ou recomendação de cancelamento da concessão da SuperVia.

Os seguranças usaram os crachás como chicotes nos passageiros para manter as portas das composições fechadas. Foto: reprodução

O governador Sérgio Cabral determinou a punição dos culpados e o presidente do TJ, Luiz Zveiter, recomendou que as vítimas processem os responsáveis. A SuperVia já demitiu três agentes — terceirizados — e ficou de decidir sobre outro, que presenciou a violência. A Delegacia de Serviços Delegados abriu inquérito e deve ouvir os agressores amanhã.

Apesar de a SuperVia ter emitido nota repudiando as agressões, repercutiram mal as declarações do diretor de Marketing José Carlos Leitão. “Havia um princípio de tumulto na estação. Convenhamos que quem segura as portas é marginal. Num momento desses não dá para chegar para a pessoa e pedir ‘por favor, o senhor gostaria de sair da porta?’”, disse ele em entrevista à Globo News. “Eles forçam a abertura da porta, que acaba quebrada, causando risco de acidentes para eles mesmos e para os passageiros”, acrescentou.

Mais tarde, porém, Leitão criticou os agressores: “Bater em passageiro não é um comportamento da SuperVia”. O presidente da empresa, Amin Murad, admitiu falhas no treinamento. “Essas pessoas não estavam preparadas. Nós vamos refazer a preparação. Essas imagens serão repetidas sempre como exemplo de como não proceder”, afirmou.

Por conta dos vagões lotados devido à greve dos ferroviários nos últimos três dias, passageiros viajaram pendurados nas janelas e portas, que mal eram fechadas. Assim que o trem parou, os funcionários da MS Agenciamento de Serviços atacaram os passageiros.

QUEM IA DESEMBARCAR FICOU SEM SAÍDA

Com socos e chutes, os agentes até empurraram de volta à composição passageiros que queriam desembarcar. Dois agentes ainda usaram os cordões que prendem seus apitos para chicotear as pessoas, enquanto o trem deixava o local. Feridos, dois passageiros registraram queixa de lesão corporal. A Polícia Militar tenta identificar o PM que estava no local e determinou atenção especial nos batalhões com estações em sua área de atuação.

“Eles agrediram pessoas que tentavam descer, que precisavam sair dali para trabalhar. Davam socos, chutes e tapas na cara até de mulheres”, contou o auxiliar de serviços gerais Carlos dos Santos Fernandes.

Os três agentes demitidos possuíam menos de um ano de casa. A demissão de Luis Carlos Belizário, 25, com um ano no serviço, ainda será decidida. Ele presenciou os ataques. Ontem, Belizário foi à polícia depor porque deteve Anderson Santos, 22, que viajava sobre o trem. O advogado da empresa, Luiz Eduardo Guimarães, disse que os guardas alegaram que haviam reagido a agressões.

A superlotação provocou uma crise de hipertensão na doméstica Maria Filomena Pereira Gaioso, 56. Ela foi levada para o Hospital Souza Aguiar. Ontem à noite, rodoviários de Nova Iguaçu e seis municípios da Baixada decidiram não entrar em greve. A categoria volta a negociar semana que vem.

AS REAÇÕES À BARBÁRIE

TRIBUNAL DE JUSTIÇA

O presidente do Tribunal de Justiça do Rio,Luiz Zveiter, classificou a ação dos agentes da SuperVia como “desequilibrada”. Para ele, “os funcionários são desajustados”. Zveiter orientou as vítimas a responsabilizar a empresa e os agressores na Justiça.

MINISTÉRIO PÚBLICO

O procurador-geral de Justiça, Cláudio Lopes, promete providências. “As provas de agressão gratuita contra pessoas indefesas são mais que convincentes”, diz.

DIREITOS HUMANOS

O presidente da Comissão de Defesa dos Direitos Humanos da Assembleia Legislativa, Marcelo Freixo (PSol), pediu cópias de gravações dos últimos 30 dias nas estações. “Com este material poderemos saber se este tipo de ato foi uma ação isolada ou se isso já vem acontecendo”, observa.

SECRETÁRIO DE TRANSPORTES

O secretário estadual de Transportes, Julio Lopes, reconheceu que atos de vandalismo, como subir nos trens, devem ser reprimidos. “Só que com a devida ação enérgica, mas, de forma alguma, violenta e desumana”, diz.

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