domingo, 12 de abril de 2009

CPI em seu labirinto

Dora Kramer
DEU EM O ESTADO DE S. PAULO

Aberta em dezembro de 2007, se não houver novo pedido de prorrogação, a CPI dos Grampos fecha as portas dentro de mais ou menos 20 dias. Criada para investigar o festival de escutas clandestinas que assola a República, tende a acabar sem explicar o principal: a que tipo de interesse atende a grampolândia.

Há fortes suspeitas entre os integrantes da CPI de que o manancial de informações recolhidas pela rede subterrânea de espionagem destinava-se originalmente à confecção de dossiês para uso em disputas políticas, uma espécie de estoque de material para eventualidades eleitorais.

A suspeita se baseia em depoimentos informais e sigilosos de autoridades do aparato de segurança. O problema é que o que se presume extraoficialmente não se escora em provas que sustentem conclusões oficiais.

No curso das investigações - primárias, a julgar pela avaliação da CPI de que teve acesso a menos de 5% do material coletado produzido pela polícia e em poder da Justiça -, apareceram interesses cruzados no mundo dos negócios públicos e privados.

Nada, porém, que se consiga apresentar na forma de um relatório com começo, meio, fim e responsabilidades bem delineadas, como ocorreu com a CPI dos Correios, que deu toda a base da denúncia do mensalão feita pelo procurador-geral da República e transformada em processo no Supremo Tribunal Federal.

Quem acompanha os trabalhos desde o início, não tem dúvida: o aparelho clandestino é amplo, perigoso e descontrolado. "Percebe-se nitidamente a existência de um monstro que armazena em suas entranhas material suficiente para provocar um fuzuê na República", diz o deputado Raul Jungmann, que vê na Agência Brasileira de Inteligência o centro de onde se irradia a rede.

"A Abin é uma entidade independente sobre a qual a sociedade não tem o menor poder de fiscalização", afirma. Culpa, acrescenta, em boa medida do Congresso que tem uma comissão de fiscalização e controle desde a criação da agência, em 1999, mas nunca se reuniu.

Ou melhor, nesses dez anos fez duas reuniões. Ambas no ano passado, quando foi descoberta escuta ilegal no telefone do presidente do Supremo Tribunal Federal, Gilmar Mendes. Não influíram nem contribuíram no processo que, depois disso, voltou a ignorar.

A corroborar a opinião do deputado há a própria decisão do governo, também por ocasião do episódio envolvendo o presidente do Supremo, de afastar liminarmente a direção da agência por sugestão do ministro da Defesa, Nelson Jobim, e pressão de Gilmar Mendes.

A contrariar aquela mesma decisão, há a nomeação do diretor demitido (Paulo Lacerda) como adido policial na embaixada brasileira em Lisboa, e ausência de responsáveis oficialmente apontados no inquérito da Polícia Federal até agora não concluído.

E se a PF não achou, ou não quis apontar, culpados, a CPI tampouco terá condições de fazê-lo em seu relatório final.

Está, hoje, em um labirinto: "Como não temos acesso a informações sobre o processo de Daniel Dantas e as informações sobre a atuação da parceria entre PF e Abin são públicas, fica parecendo que a CPI protege o banqueiro e é contra o delegado que o investigou na Operação Satiagraha. Ocorre que as infrações cometidas no curso daquela investigação são sinais dessa degeneração do trabalho de inteligência", argumenta Jungmann.

Isto posto, até aonde pode ir a CPI?

Se não houver fatos novos, não muito longe. O último depoimento de Protógenes Queiroz nada acrescentou, a nova convocação do delegado Paulo Lacerda, se atendida, provavelmente será também inútil e, portanto, a ida de Daniel Dantas de nada adiantará.

Ainda assim, o relatório desta vez deve avançar um pouco em relação ao anteriormente pretendido pelo relator Nelson Pelegrino, que não indiciaria ninguém.

Agora, a expectativa é de que Protógenes e Lacerda sejam indiciados por terem mentido à CPI, e Daniel Dantas pelo uso da empresa Kroll para serviços de espionagem. Se o relatório oficial não contiver essas conclusões, um grupo de parlamentares fará um voto em separado para pedir o indiciamento dos três ao Ministério Público.

Pior a emenda

A Câmara ainda discute qual a melhor maneira de repudiar, mas o Senado, esperto, já encontrou o que acredita ser a forma ideal de lidar com as denúncias de suas transgressões internas. Informações agora devem ser solicitadas por meio de ofício com prazo de cinco dias para retorno.

As solicitações devem ser acompanhadas de cópia autenticada da carteira de identidade, comprovante de residência, motivação detalhada do pedido, mais um termo de responsabilidade assinado e autenticado.

Quer dizer, corrigir o errado nem pensar. Nos meios e modos a farra continua. Com a diferença de que os congressistas agora, além de infieis depositários da função pública, serão vistos pela sociedade como obtusos caudatários da burocracia.

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