quarta-feira, 29 de abril de 2009

Enfermidade fortalecerá a campanha ou abrirá espaço para outra candidatura

Jarbas de Holanda
Jornalista


Amparado pelo clima de solidariedade humana e de condicionamento político oposicionista que se gerou com o anúncio da quimioterapia a que será submetida a ministra Dilma Rousseff, o presidente Lula utilizou uma agenda de atos administrativos dos governos federal e do Amazonas, realizados anteontem em Manaus (e desdobrados ontem) como verdadeiros comícios em favor da candidatura dela. O que o Globo resumiu em reportagem com o título “Lula leva doença de Dilma ao palanque” e a seguinte abertura: “Em clima de campanha eleitoral, em que o pano de fundo era a doença da ministra, o presidente não teve problema em levar aos palanques o câncer de sua candidata. Num dia de vários eventos ao lado de Dilma, e após declarar que ela vai ‘enfiar a cabeça nesse PAC’ para ajudar na sua cura, Lula ergueu a mão da ministra”. Mas a capitalização por Lula da quimioterapia de Dilma como arma de envolvimento emocional do eleitorado (que pode funcionar bem, pelo menos durante algum tempo), combinada com incisiva reafirmação de que ela é sua candidata, não está conseguindo conter outro efeito do referido anúncio: o desencadeamento de especulações e já de algumas articulações em torno de possível substituição da pré-candidata presidencial lulista. Assim tratadas na coluna de ontem de Eliane Cantanhêde, na Folha de São Paulo: “A palavra de ordem de Lula é ‘nada muda’. A da oposição é que ela vai sair dessa. Mas todos sabem que tudo depende de como Dilma vai atravessar o duro teste de quimioterapia, a cada três semanas, por quatro meses, com um outro prazo pairando no ar: certezas, só depois de cinco anos. O linfoma foi descoberto muito precocemente, dizem uns médicos. Mas é do tipo agressivo, ressalvam outros”.

Abordagens mais detalhadas das implicações da enfermidade da ministra candidata foram feitas pelos jornalistas Raymundo Costa, do Valor, e Merval Pereira, do Globo, em suas colunas da terça-feira. Trechos do artigo do primeiro, intitulado “Ponto de inflexão na sucessão de 2010”: “Queira ou não o presidente da República, o fato é que a doença da ministra Dilma Rousseff recolocou a questão da candidatura do PT à sucessão de 2010 no radar dos políticos. Nada ‘abominável’, como sugeriu o presidente. Apenas um dado novo da conjuntura política. Pode dar em nada mas no momento é o que agita os bastidores de Brasília. À primeira vista, vencendo o câncer Dilma pode até sair com sua candidatura fortalecida. Mas o cenário da próxima eleição presidencial sem o nome da chefe da Casa Civil na chapa é assunto sobre o qual não é nem ‘infundado’ nem ‘desrespeitoso’ especular. Mais adiante: “É certo que o PT imagina a ministra bem à frente (do que está) nas pesquisas, já agora no fim de abril. Mas não pensava em substitui-la... Dilma nunca foi uma candidata orgânica. Ela é candidata de Lula e do governo. O PT se rendeu a ela. Sem a ministra, o nome da base aliada que salta aos olhos é o de Ciro Gomes (PSB), veterano de duas campanhas e atualmente à frente da ministra nas pesquisas. É um nome do qual Lula já esteve mais próximo e que o PT não engole. O PT, nessa hipótese tem mais de um nome para colocar no pano verde. O PMDB imagina poder cooptar o tucano Aécio Neves, com o auxílio de Lula, mas este é um cenário ainda mais favorável a José Serra, o atual líder das pesquisas – a avaliação política é que é muito difícil a adesão de grande parte do PT e a da parcela serrista do PMDB ao governador de Minas Gerais”. Mais dois trechos do artigo de Raymundo Costa: “Resumo da ópera: com Ciro, Aécio e o PT com dois ou três nomes, o Palácio do Planalto não tem uma opção capaz de catalizar o governismo”. Aí ele avalia “que se abre o caminho para aventuras que se julgava passadas, como a reapresentação da proposta de terceiro mandato para o presidente da República, no segundo semestre”.

Merval Pereira iniciou seu artigo – “Imagem” – afirmando: “Como era inevitável, a doença da ministra Dilma Rousseff passou a ser o principal tema político do país, e partiu dos próprios petistas o sinal para que o tratamento do câncer entrasse para o rol dos fatos políticos ponderáveis na sucessão do presidente Lula”. Outros trechos da avaliação: “Ora, com o consentimento da própria, tudo indica que está sendo armado um esquema em torno da doença, provavelmente para controlar a tendência inevitável de setores políticos começarem a especular sobre um eventual plano b, caso ela não consiga prosseguir no papel de candidata”. “O PMDB já começa a querer a cabeça da chapa caso a ministra não possa se candidatar, na presunção de que todos no PT são “japoneses”, na definição do ministro José Múcio, e se a “japonesa” não puder concorrer, não há porque improvisar outro “japonês”, seja ele Patrus Ananias, Fernando Haddad ou Tarso Genro. O PMDB se arvora em dar a cabeça da chapa mesmo sem ter um japonês melhor do que o PT. Talvez sonhando novamente com o governador de Minas Aécio Neves. Mas seria essa uma manobra tão radical que é difícil de se concretizar”.

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