terça-feira, 14 de abril de 2009

Poupança de oposição

Raymundo Costa
DEU NO VALOR ECONÔMICO


O governo tem razão ao antever uma dura reação da oposição às mudanças que precisa fazer na remuneração da caderneta de poupança. Há gente de tocaia para comparar qualquer medida ao confisco decretado por Collor no início dos noventa, logo agora que a poupança se tornou um investimento atrativo - a evolução do estoque é crescente desde 1999 e, em 2008, atingiu a marca de R$ 215,4 bilhões. Mas há também, na oposição, quem pense que a equação não é tão simples e se disponha a dar uma mãozinha ao presidente Luiz Inácio Lula da Silva na tarefa de reformar a caderneta de poupança.

"Não basta dizer "olha, o Lula está tungando a nossa poupança", não é isso, não dá para ser assim", diz o deputado federal Rodrigo Maia (RJ), presidente do Democratas (DEM), partido desde o PFL identificado como aliado da banca. "A gente pode se beneficiar politicamente de falhas do governo e de muitas outras coisas que achamos erradas, diz. "Mas a situação a que nós chegamos hoje não é em decorrência da incompetência do governo. Ela decorre de uma crise mundial que está dando novo patamar de juros no Brasil".

Maia pretende deflagrar a discussão no Congresso e no partido, a partir desta noite. Ele encomendou um estudo para a assessoria técnica do DEM tendo como referência a queda da taxa selic abaixo dos 10% prevista por algumas consultorias.

A conclusão do estudo é que isso deverá "causar fortes distorções no mercado financeiro", em decorrência do "aumento da atratividade da caderneta de poupança em relação aos demais ativos financeiros, em especial o principal instrumento de captação, os Certificados de Depósitos Bancários (CDBs)". Além disso - diz - , também devem ficar "relativamente mais caros os financiamentos habitacionais".

"Essa discussão da poupança não dá para ser desse jeito: "Vamos colar no Lula o desgaste" . Tudo bem, por um lado ele vai ter o desgaste mas por outro lado ele vai dizer "vocês não querem financiar a casa própria, vocês não estão entendendo nada, vocês defendiam a redução da taxa de juros, a taxa de juros caiu e agora como faz com a taxa projetando 9%?" É uma realidade diferente", insiste Maia.

No mérito, Maia diz que a questão da poupança é complexa porque não se restringe ao poupador. O Sistema Brasileira de Poupança e Empréstimo conta também com os bancos, "que precisam captar; com os poupadores, que de dois, três anos para cá têm taxas melhores em relação aos últimos anos todos e conta, na outra ponta, com os financiamentos da habitação", argumenta.

Para o presidente do DEM, duas coisas devem acontecer: "primeiro, os bancos não vão querer aumentar a captação da poupança, porque, num momento como o atual, não tem tanto tomador assim na praça e eles também não vão querer assumir o risco" e, segundo, "se você olha a taxa do poupador em relação ao CDI (taxa de juros do mercado interbancário), vê que, enquanto o poupador ganhou remuneração nos últimos anos, o tomador do setor de habitação passou a pagar mais caro pelo financiamento (leia o gráfico)".

A consultoria do DEM apresenta dois exemplos. Em relação ao CDB, se a taxa básica de juros atingir 9% ao ano, a rentabilidade final do papel, após a cobrança do Imposto de Renda, seria de 5,6%. E conclui: "Como a remuneração da caderneta de poupança está atrelada à TR e na taxa de juros de 6% ao ano, capitalizada mensalmente, o seu rendimento final será de 7,4%, com isenção de IR, o que corresponde a 133% do rendimento líquido do CDB".

No que se refere ao financiamento habitacional, "o benefício para o mutuário da queda do juro básico tem sido menos que proporcional". Segundo o estudo demista, em 2008 o custo do empréstimo habitacional já superou a remuneração do CDI.

É uma tendência que deve se acentuar em 2009. "Supondo que a selic seja reduzida até 9% ao ano, o custo médio do financiamento habitacional com recursos das cadernetas de poupança, mesmo na faixa com taxa de juros tabelada, ficará muito acima do CDI", diz o estudo do Democratas.

"Da nossa parte, o presidente do Banco Central não precisa ficar preocupado se vai entregar um problema para o governo", anuncia Rodrigo Maia. "Vamos aprovar coisas que ajudem a questão do crédito no Brasil. Vamos aprovar o cadastro positivo", afirma. "Não podemos sinalizar para os próprios investidores que a discussão é oportunista de tentar colar uma coisa ou outra no Lula.

Maia não está sozinho no DEM. Resta saber até que ponto pode arrastar outros aliados, como PSDB e PPS, que veem na reforma da poupança uma chance para abalar a popularidade de Lula.

Raymundo Costa é repórter especial de Política, em Brasília. Escreve às terças-feiras

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