segunda-feira, 15 de junho de 2009

Bienal de São Paulo e de Veneza

Luiz Carlos Bresser-Pereira
DEU NA FOLHA DE S. PAULO

Por que a Bienal de SP vem perdendo relevância artística enquanto a de Veneza continua a alcançar sucesso?

DIANTE DE crise que dura anos, há cerca de duas semanas o Conselho Curador da Bienal de São Paulo escolheu um jovem e dinâmico consultor e colecionador para a presidência da instituição. Logo em seguida, na Itália, a Bienal de Veneza deste ano foi inaugurada com festas que celebram seu êxito.

Por que essa diferença de destinos? Por que a Bienal de São Paulo, que não deixei de visitar desde quando foi inaugurada, em 1951, até 2006, ano a ano vem perdendo relevância artística e apoio social, enquanto a Bienal de Veneza continua a alcançar sucesso e respeito? Por falta de dinheiro, dirá alguém. Por falta de suficiente apoio do Estado, completará outro. E talvez ambos tenham alguma razão. Sugiro, entretanto, outra explicação que não pretende ser exclusiva, porque ela também ajuda a explicar a falta de recursos, mas que, se for levada em conta pela Bienal de São Paulo, poderá levá-la de volta a seus belos tempos. Há uma diferença fundamental entre as duas bienais. Enquanto a de Veneza está dividida em três setores, a de São Paulo está limitada a um. Enquanto Veneza mantém um amplo setor para as representações nacionais no Giardino e no Arsenale, um setor pequeno mas relevante para artistas consagrados no Giardino, e um setor amplo no Arsenale, em que o curador desenvolve um tema e abre espaço para novos artistas, a Bienal de São Paulo decidiu, há alguns anos, de forma arrogante e equivocada, limitar-se ao tema escolhido pelo curador e aos novos artistas. Refletiu, dessa forma, um fato real e até auspicioso: a importância crescente de curadores criativos para os grandes museus e também para as bienais. Mas o fez de forma radical e, por isso mesmo, equivocada.

Um espaço para artistas consagrados é importante porque é educativo e porque dá mais legitimidade à mostra junto aos demais artistas consagrados, independentemente de estarem ou não presentes. Por outro lado, as representações nacionais são importantes porque, por meio delas, é possível lograr a participação de grandes artistas sem custo para a Bienal, já que fica por conta do governo do país representado. Assim, se decidirmos dividir o espaço da Bienal de forma que 45% fiquem para as representações nacionais, 10% para o curador exibir artistas consagrados e 45% para o tema da Bienal daquele ano, teremos uma mostra mais atrativa para o público e mais barata.

Mas, em compensação, essa limitação do poder do curador não implicará uma queda da qualidade artística ou da significação cultural da Bienal? De forma alguma. Primeiro porque ele terá poder sobre os três segmentos da mostra. Mesmo no caso das representações nacionais, poderá e deverá haver negociação. Segundo porque sobrarão mais recursos para o grande segmento temático -para que o curador possa convidar os melhores artistas que estão despontando.

A Bienal de São Paulo sempre teve um papel importante na difusão da arte de vanguarda brasileira e mundial e na consagração de novos artistas. Por meio dela, a cidade de São Paulo e o Brasil se integram na contemporaneidade, participam das experimentações de vanguarda cultural e da crítica fundamental que transparece na arte conceitual.

Mais do que antes, vemos hoje os artistas se apropriarem das tecnologias mais avançadas para inovar e criar. Não podemos deixar uma instituição como essa morrer por incompetência administrativa e arrogância intelectual. O conselho da Bienal e seu novo presidente têm diante de si um belo desafio.

Luiz Carlos Bresser-Pereira , 74, professor emérito da Fundação Getulio Vargas, ex-ministro da Fazenda (governo Sarney), da Administração e Reforma do Estado (primeiro governo FHC) e da Ciência e Tecnologia (segundo governo FHC), é autor de "Macroeconomia da Estagnação: Crítica da Ortodoxia Convencional no Brasil pós-1994".

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