quarta-feira, 10 de junho de 2009

Ouvidos moucos

Rosângela Bittar
DEU NO VALOR ECONÔMICO

Com o novo rigor que imprimiu às suas deliberações sobre campanha eleitoral antecipada, uso da máquina administrativa para obter votos, promessas e distribuição de benefícios em palanque, que já rendeu cassações polêmicas de vários mandatos, o Tribunal Superior Eleitoral está fazendo um alerta, espécie de aviso aos navegantes para que depois de eleitos não reclamem. Em circular dirigida aos políticos em geral e entregue aos partidos em particular, o Corregedor-Geral da Justiça Eleitoral, ministro Felix Fischer, assina um ato de orientação aos diretórios regionais dos partidos sobre o que não pode absolutamente ser feito agora e explica as possíveis punições a quem não cumprir as regras.

O primeiro item do lembrete é também o mais desobedecido: menciona a proibição de prática dos atos, em benefício de futuros candidatos a cargos nas eleições de 2010, "que possam configurar propaganda eleitoral antes de 6 de julho de 2010". O ministro ressalva a propaganda intrapartidária.

Está proibida, também, a utilização do tempo autorizado para a propaganda partidária anual em divulgação de propaganda de candidatos a cargos eletivos, para defesa de interesses pessoais ou de outros partidos. Esta regra também está entre as campeãs da transgressão. E, diz ainda o Tribunal Superior Eleitoral, a Constituição veda o uso de publicidade de atos, programas, obras, serviços e campanhas dos órgãos públicos em que constem nomes, símbolos ou imagens que caracterizem promoção pessoal de autoridades ou servidores públicos.

As penalidades a serem aplicadas aos infratores vão de multas a cassações do direito à propaganda, da declaração de inelegibilidade ao cancelamento do registro da candidatura. O corregedor eleitoral determina aos partidos que encaminhem, com urgência, ao Ministério Público Eleitoral "notícias de fatos, indícios ou circunstâncias que possam configurar infrações à legislação que disciplina a propaganda, acompanhadas, sempre que possível, de documentação que comprove a responsabilidade pela prática, com a indicação dos nomes dos beneficiários da irregularidade". Aos juízes eleitorais o corregedor recomenda que tenham igual procedimento com relação aos diretórios municipais ou zonais. E os diretórios nacionais ficam sob o controle e acompanhamento da própria Corregedoria do TSE.

Diante do papel que recebeu, o presidente do PPS, Roberto Freire, teve duas reações. Uma, foi perguntar: "E o Lula? Recebeu este papel? Está sabendo das proibições?". A ironia relaciona-se à convicção de que o presidente Luiz Inácio Lula da Silva está há muito tempo em plena campanha, talvez até desde o primeiro dia de governo, e sua candidata à sucessão em 2010, Dilma Rousseff, com uma exposição, há mais de ano, que contraria todos os dispositivos das regras do Tribunal Superior Eleitoral.

A segunda reação do presidente do PPS foi apressar a tomada de decisões no seu campo de ação, o da oposição ao governo do PT. Está convencido de que é preciso, sem sair viajando em campanha, como ocorre no governo, apressar a definição do candidato de oposição. "O candidato não fará campanha, mas o partido pode fazer", sublinha, até para delimitar ações que sejam aceitáveis para José Serra, o pré-candidato do PSDB cujo nome lhe parece "maduro" entre os partidos que podem seguir aliados no ano que vem.

"O Serra já não quer antecipar campanha, e com as determinações do tribunal resistirá mais ainda. Não adianta pressionar porque ele não vai. Mas nós podemos resolver", afirma o presidente do PPS lembrando que, dentro do seu partido e do PSDB, a definição sobre quem será o candidato já avançou muito. O que falta, agora, é dar maior coesão aos partidos em torno do nome provável.

"A indefinição não nos ajuda neste momento em que o governo Lula está muito definido em torno de sua candidata e em plena campanha, desmoralizando o tribunal", diz. A seu ver, Serra pode continuar tomando todos os cuidados, evitando viagens, recusando-se a entrar em campanha tal como vem sendo feita pelo presidente, mas é preciso, já, em sua opinião, unir a oposição em torno de um candidato. E os partidos, já tendo um candidato, não ficam parados, podem se mobilizar, começar a fazer atos permitidos mesmo que o candidato não se exponha porque está governando. "Estou defendendo isto, acho necessária a unidade e a definição, até porque não vamos enfrentar um governo qualquer", recomenda.

Retrocesso técnico

Não fosse por atribuir aos significados a palavra que não lhes corresponde à essência - chama de transparente o que é opaco, e de democracia o que é arbítrio -, a Petrobras estaria, ao impor novas regras ao diálogo com a sociedade através da imprensa, tornando mais ágil o trabalho jornalístico. Nada atrasa mais os processos industriais, hoje, do que esperar respostas, opiniões, notas e posições de todos os envolvidos em uma notícia, principalmente se o que está no centro da questão é uma denúncia.

A estatal de petróleo decidiu tornar públicas, para todo o mercado concorrente, as reportagens em elaboração por uma empresa de comunicação. Com a decisão de espalhar o trabalho exclusivo, fica fácil resolver o problema: é só não ouvir a Petrobras antes de a informação ser publicada. É possível deixar para registrar sua posição quando a reportagem for também pública. É um retrocesso, pois ouvir todos os lados no mesmo dia foi uma mudança que representou um avanço obtido não faz muito tempo. Antes, deixava-se mesmo para depois, exatamente por temor aos vazamentos da exclusividade. Com a atitude antimercado e anticoncorrência que adotou, a Petrobras impõe o retrocesso na técnica, facilita os processos industriais e, quanto às vantagens e desvantagens para si, deve se entender bem com seus acionistas e investidores. Pois o episódio só revela que a estatal do petróleo começa sua atuação na CPI acuada, perdendo a razão ao primeiro passo.

Rosângela Bittar é chefe da Redação, em Brasília. Escreve às quartas-feiras

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