quinta-feira, 6 de agosto de 2009

Sarney diz que acusações são 'menores' e não sai

Gerson Camarotti
DEU EM O GLOBO

No centro do maior escândalo da história recente do Senado, o presidente da Casa, José Sarney (PMDB-AP), ocupou a tribuna e discursou tentando minimizar as denúncias de nepotismo e tráfico de influência. Disse que não se licenciará da presidência e que as acusações são menores, baseadas em recortes de jornal, e "não representam queda de padrão ético". O Conselho de Ética do Senado já arquivou duas denúncias e duas representações contra ele, e as outras seis devem ter o mesmo destino. Sarney tentou dividir com os demais senadores a responsabilidade pelos atos secretos do Senado e pelas nomeações de seus parentes para cargos de confiança - que não teriam ocorrido, segundo ele, sem o aval dos parlamentares. "Todos aqui somos iguais. Nenhum senador é maior do que outro e por isso não pode exigir de mim que cumpra sua vontade política de renunciar. Permaneço pelo Senado, para que ele saiba que me fez presidente para cumprir o meu mandato", afirmou Sarney, que também se disse vítima de um complô da imprensa. O discurso esfriou o clima de acusações no plenário. A oposição vai protestar contra o arquivamento das denúncias no Conselho.

"Tenho certeza que nada fiz de errado"

Sarney diz que denúncias são "menores", comete imprecisões ao rebater acusações e reafirma que não pretende renunciar

Em mais uma tentativa de se defender e municiar sua tropa de choque no julgamento no Conselho de Ética — que em seguida arquivaria duas representações e duas denúncias contra ele —, o presidente do Senado, José Sarney (PMDB-AP), subiu ontem à tribuna para dizer que não renunciará ao cargo, rebater acusações e dividir responsabilidade com os colegas. Disse que as denúncias — de desmandos administrativos a nepotismo e tráfico de influência — “não representam nenhuma queda de padrão ético”. Para rebatêlas, cometeu imprecisões. E chegou a dizer que são denúncias “menores”, baseadas em “recortes de jornais”, parafraseando o presidente Lula, um dos mais empenhados em mantêlo no cargo, que disse que “uma coisa é você matar, outra coisa é você roubar, outra coisa é você pedir um emprego, outra coisa é relação de influências, outra coisa é o lobby.” Com o discurso, porém, Sarney conseguiu esfriar o clima no plenário, onde não houve apartes à sua fala.

Mas a oposição aposta que a análise das denúncias contra ele no Conselho de Ética continuarão repercutindo.

Em 48 minutos, Sarney fez um balanço de sua vida pública, alegou que as representações contra ele não se referem à prática de atos ilícitos ou desvio de dinheiro, mas a um processo político para tentar fragilizá-lo. O discurso foi preparado com a supervisão de advogados em relação aos aspectos jurídicos das representações.

— Na coerência do meu passado, não tendo cometido nenhum ato que desabone minha vida, não tenho senão que resistir. Foi a única alternativa que me deram. Todos aqui somos iguais. Nenhum senador é maior do que outro e por isso não pode exigir de mim que cumpra sua vontade política de renunciar. Permaneço pelo Senado, para que ele saiba que me fez presidente para cumprir o meu mandato — discursou Sarney. — Acho que ninguém aqui nessa casa sabia ou podia pensar que existia ato secreto.

E se disse vítima de uma campanha da imprensa: — No entanto, hoje não se fala mais em crise administrativa do Senado.

Ela sumiu e toda a mídia e alguns senadores não a vinculam senão a mim.

Não dizem o que fiz de errado, por que devo receber punição, o que devo fazer para a reforma do Senado.

Sobre os atos secretos, Sarney apresentou detalhado balanço dos atos de ex-presidentes da Casa para afirmar que não tinha responsabilidade por não terem sido divulgados. Sobre nomeações, só assumiu a indicação da sobrinha Vera Portela Macieira Borges.

E disse que os demais parentes foram contratados por outros gabinetes e que não poderia responder pelas escolhas dos senadores — chegando a citar a citar a filha como “senadora Roseana Sarney”. Mas também aqui apresentou versões com incorreções.

Disse que na conversa gravada pela Polícia Federal em que ele se compromete com o filho Fernando Sarney a nomear o namorado da neta não há qualquer citação a nomeação por ato secreto. E defendeu um gesto de ajuda à neta. Ao final, negou as acusações: — Quero resumir: em nenhum momento da minha vida, faltei ou faltarei com o decoro parlamentar. Logo eu que prezo a liturgia, porque decoro é conduta. Cidadão de vida ilibada, de hábitos simples, ter falta de compostura e de decoro? Os principais trechos do discurso: COISAS MENORES “Nas acusações que me foram feitas nas diversas representações apresentadas ao Conselho de Ética, nenhuma coisa está relacionada com dinheiro ou prática de atos ilícitos ou desvio de dinheiro público.

São coisas que não representam nenhuma queda de padrão ético, e vou enumerá-las, para que se veja como são menores e como elas podem ser jogadas e manipuladas. Todas são respaldadas, sem nenhuma exceção, por recortes de jornal.” “SOMOS IGUAIS”: “Na coerência do meu passado, não tenho cometido nenhum ato que desabone minha vida.

Não tenho senão que resistir, foi a única alternativa que me deram. Todos aqui somos iguais. Nenhum Senador é maior do que o outro e, por isso, não pode exigir de mim que cumpra a sua vontade política de renunciar. Permaneço pelo Senado para que ele saiba que me fez presidente para cumprir meu mandato.” DEVASSA: “Não dizem o que fiz de errado, por que devo receber punição, o que devo fazer para a reforma do Senado. Os jornais e a mídia em geral, que eu conheça, nunca se concentraram tanto contra uma pessoa como estão fazendo comigo, vasculhando minha vida, desde o meu nascimento, e, não encontrando nada, invadem minha privacidade e abrem devassa que se estende até a minha família inteira.

Não tenho instrumentos de revidar ou responder, porque o direito de resposta e a proteção à imagem estão na Constituição, mas não se integram nem são acessíveis aos direitos da cidadania brasileira.” DIRETORIAS: “Desconhecia que o Senado tinha 170 diretorias. Elas não foram criadas por mim! É um número inaceitável.” ATOS SECRETOS: “Dos 663 atos assinados considerados secretos, foi verificado que 152 tinham sido publicados no Diário do Senado, não na intranet, ficando em 511. Destes, 358 são de movimentação de pessoal, rotina da Casa, e 36 foram da Mesa, aprovados pelo plenário. Afirmaram, contudo, que fui eu que fui responsável por todos esses atos, e a opinião pública passou a receber essas informações erradas, deformadas e incompletas.” ATOS SECRETOS/DISTRIBUIÇÃO: (Sarney relacionou quantos atos secretos foram feitos pelos últimos presidentes da Casa). “Sarney: um ato não publicado, boletins não publicados: 1 ato; Antonio Carlos Magalhães: 21 atos, 11 não publicados; Jader Barbalho: um ato publicado, um ato não publicado; Edison Lobão: 7 atos, 3 não publicados; Ramez Tebet: 63, 303 boletins publicados, 19 não foram publicados; Sarney (na minha segunda administração): 87, publicamos 536, e 33 não foram publicados; Renan Calheiros: 260, 905 atos — ele foi por quatro anos, e, por isso, esses números crescem —, e 229 não publicados; Tião Viana — 2 meses de presidência: 16 atos, 57 e 9 não publicados; Garibaldi Alves — 1 ano de presidência: 207 atos, 445 boletins publicados, 106 não publicados, somando 312.” NEPOTISMO: “Há 55 anos no Congresso, nunca adotei a norma de chamar parentes para a minha assessoria.

(...) Essas nomeações eram feitas pelo diretor-geral, por requisição do senador interessado. Foram nomeações para gabinetes. Todos sabemos que são privativas dos srs. senadores.” (Em seguida, listou parentes e agregados para explicar a nomeação de cada um): JOÃO FERNANDO SARNEY: “Aqui no Senado não se nomeia para o gabinete quem não for requisitado para nomear pelo senador; e ele foi feito.

Está aqui a requisição ao diretor-geral, do senador Epitácio Cafeteira, que já teve a oportunidade de confessar que não me disse que tinha nomeado.” VERA PORTELA MACIEIRA BORGES: “Realmente, é sobrinha, por afinidade, minha. Eu requisitei do Ministério da Agricultura para a presidência e pedi ao senador Delcídio que a colocasse no gabinete em Mato Grosso (...). Qualquer um dos srs aqui nunca deixou na vida de cumprir ou de ajudar as pessoas que lhes pediram, legalmente, que tomassem providências.” MARIA DO CARMO MACIEIRA: “Tem o nome de Macieira, mas também não sei quem é e não trabalha no meu gabinete. Perdão, ela foi nomeada pela senadora Roseana. Eu não a conheço.

E a lei brasileira não passa responsabilidade de filha para pai.” ISABELLA MURAD CABRAL ALVES DOS SANTOS: “Também não é minha parenta. Foi nomeada pelo senador Cafeteira.” VIRGÍNIA MURAD ARAÚJO : “Também nomeada para o gabinete da senadora Roseana. Cada um de nós é senador pelo seu estado e, naturalmente, recruta quem deve trabalhar com ele. Meu estado é o Amapá.” l NATHALIE RONDEAU: “Não tenho ligação de parentesco com ela.” l LUIZ CANTUÁRIA: “Também não sei quem é.” l ROSÂNGELA TERESINHA GONÇALVES:“ Não tenho laço de parentesco, nem sei de quem se trata.” MARIA DO CARMO DE CASTRO MEIRA: “Não sei de quem se trata.” SHIRLEY DUARTE PINTO DE ARAÚJO: “Também era do gabinete da senadora Roseana. Não foi requisitada para nomear por mim.” RODRIGO CRUZ: “Também não sei quem é.” FAUSTO RABELO CONSENDEY: “Também não conheço, não sei onde trabalha, nem que é meu parente ou que tenha sido nomeado por mim.” RICARDO DE ARAÚJO ZOGHBI, LUIZ FERNANDO ZOGHBI, JOÃO CARLOS ZOGHBI JÚNIOR: “Todos sabem que eu nunca me relacionaria aqui com o sr. Zoghbi. E, ao contrário, mandei abrir inquérito contra ele.” IVAN SARNEY: “Ivan Sarney trabalhou aqui dois anos, (...) no gabinete do senador João Alberto.” CRÉDITO CONSIGNADO: “Meu neto nunca teve relação com o Senado.

(...) Sua relação era com o HSBC, o maior banco do mundo, e não podia ter sido colocado como se aqui no Senado ele tivesse sido posto por interferência de quem quer que seja. Esse contrato foi feito com o HSBC, a sua concessão, em 2005. Em 2005, quando ele operava, eu não era presidente. (...) E quando eu assumi no dia 2 de fevereiro deste ano, meu neto não era mais credenciado para operar no HSBC.” FUNDAÇÃO JOSÉ SARNEY: “Tratouse também da Fundação Sarney, acusando-me de nela ter funções administrativas e ter negado isto desta tribuna. A Fundação não é uma coisa feita de escondido. É uma grande obra. (...) Nunca tive função administrativa na fundação fundada por mim.” NAMORADO DA NETA: “Acusaramme, numa campanha pessoal, de favorecer o namorado da minha neta por um ato secreto, nos trechos dos diálogos divulgados de maneira ilícita (...) Não há qualquer palavra minha nessa gravação em relação à nomeação por ato secreto. É claro que não existe o pedido de uma neta — se pudermos ajudar legalmente — que qualquer um de nós deixe de ajudar. A pessoa indicada era competente (...) sempre trabalhou com assiduidade e recebe elogios dos seus chefes.” l AUXÍLIO-MORADIA: “O auxíliomoradia é legal. Muitos dos senadores recebem, mas, por uma questão pessoal, eu não quis aceitar. Depositaram em minha conta e mandei estornar esses depósitos. Mandei estornar, não estava indenizando.” DECORO: “Em nenhum momento da minha vida faltei ou faltarei com o decoro parlamentar. Logo eu, que prezo a liturgia, porque decoro é conduta, cidadão de vida ilibada, de hábitos simples, ter falta de compostura e de decoro? (...) Não favoreci neta ou neto meu. Não abusei da minha autoridade ao requisitar o envio de seguranças para a minha residência.

Não menti ao dizer que não tinha responsabilidade por atos administrativos na Fundação José Sarney. Sou, isto sim, vítima de uma campanha sistemática e agressiva.”

CARGO: “Minha força não é o desejo de poder. Este cargo não me acrescenta nada senão agruras, injustiças, decepções e trabalho, mas minha certeza é de que nada fiz de errado

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