quinta-feira, 3 de setembro de 2009

Congresso é o palanque entre eleições

Maria Inês Nassif
DEU NO VALOR ECONÔMICO


O alto componente emocional que se agrega à política em momentos de grande radicalização de partidária turva julgamentos, em especial quando eles se referem a instituições. Dos partidos políticos se originam os ataques de alta capacidade ofensiva, mas ironicamente é mesmo aos partidos que eles se destinam. Quando se fala em desgaste das instituições, em especial do Legislativo, é aos partidos que isso se refere. E quando se fala em baixa qualidade das instituições, em especial do Legislativo, essa avaliação bate direto nos partidos políticos.

O chamado desgaste do Legislativo remete a alguns fatos. Um deles é uma baixa qualidade que não é da representação política como um todo, atente-se a isso, mas é da elite parlamentar que ascende a funções de liderança via partidos políticos - dessa realidade, hoje, não são poupados nem partidos do governo, nem da oposição; nem pequenos, nem grandes partidos. O segundo fato é a midiatização do Legislativo. A massificação do acesso à informação, em especial pela imagem, levou para dentro da residência do eleitor o espaço por excelência das disputas partidárias, o Congresso. O Parlamento tornou-se, assim, quase que uma extensão do horário eleitoral gratuito. Não existe desmonte de palanque entre uma eleição e outra.

Trazer o espaço de lutas políticas para o eleitor é um pressuposto altamente democrático. Todavia, isso ocorre num momento de radicaliação ideológica e dentro de um modelo de militância partidária que é emprestado da mídia de espetáculo. A ofensiva política é espetacular; o ator político fala para os microfones e encena para as câmeras; o enredo é dramático e não raro ficcional.

Assim como a mídia, os partidos políticos dedicam-se a firmar conteúdos à base de fortes emoções. Isso não desideologiza o espaço público no qual se movem os partidos - aliás, nem seria desejável um Legislativo que não seja o de embates entre ideologias, não é esse o problema. A emocionalização e a teatralização da política, isso sim, desqualificam o debate. Embora as razões ideológicas para a ofensiva midiática dos partidos políticos sejam claras, o tipo de discurso está voltado para vencer o eleitor pelas emoções, sem que a racionalidade esteja presente ao debate. Isso não qualifica o cidadão-eleitor e muito menos os partidos políticos envolvidos nesse tipo de política rasa. Aliás, pode ter um efeito contrário a isso e bastante perverso. Como são partidos que estão em choque constante no Legislativo, eles também estão sujeitos aos intensos processos de desgaste a que submetem a instituição como um todo.

A política partidária-midiática pode ganhar mais relevância se encontra correspondência na sociedade civil, em especial em setores com algum grau de relevância na formulação de opiniões públicas, inclusive a própria mídia. A contraindicação, nesse caso, é que a sobrevivência à base de criação de grandes comoções em algum momento dá vida própria aos processos de criação de escândalos. A racionalidade é a principal vítima disso; os partidos políticos, mais uma vez, são a segunda maior vítima dos escândalos que se autoalimentam.

O outro problema de políticas mantidas nesse ambiente é que elas, num primeiro momento, envolvem grandes parcelas de eleitorado pela emoção, mas no momento seguinte têm um potencial muito maior de criar ceticismos. Quando a comoção se alia a grandes polarizações ideológicas, os partidos aos poucos vão perdendo a capacidade de ampliar seus eleitores à base da midiatização. O que ocorre, via de regra, é que o discurso político-emocional tende a radicalizar posições que já estão consolidadas. Até do ponto de vista eleitoral o midiatismo é pouco recomendável aos partidos políticos.

Trazendo mais ainda a análise para o quadro partidário brasileiro, a outra característica da política emocional é a de se apoiar em julgamentos sempre morais, e sempre muito frágeis. O julgamento ético é mais neutro, ele se aplica democraticamente aos cidadãos, qualquer que seja a filiação partidária. Um julgamento moralista imprime moralidades diferentes a casos diferentes; e obrigações de moralidade diferentes a pessoas que são iguais, pelo menos do ponto de vista constitucional. A moralidade de ocasião não se sustenta como debate político, mas ajuda a radicalizar as partes que já fizeram a sua opção ideológica. É apenas um alimento de uma radicalização que não dá votos, que não melhora a qualidade dos partidos e não ajuda a qualificar a representação política.

Maria Inês Nassif é editora de Opinião. Escreve às quintas-feiras

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