sexta-feira, 25 de setembro de 2009

E o Fed começou a se mover...

Luiz Carlos Mendonça de Barros
DEU NA FOLHA DE S. PAULO

As primeiras medidas, longe de sinalizar aperto monetário, são uma resposta à exigência de menor liquidez do mercado

OS MERCADOS estão claramente precificando uma recuperação econômica na maior economia do mundo. Embora ainda se ouçam algumas advertências, a grande maioria trabalha hoje com esse cenário.

A recessão ficou para trás, embora os obstáculos para uma normalização do crescimento se projetem para 2010 e, provavelmente, para 2011. Portanto nada mais natural que os instrumentos monetários que foram utilizados pelo Fed (banco central dos Estados Unidos) para evitar um colapso do sistema financeiro americano sejam desativados ao longo dos próximos meses. A questão que se coloca é a forma e a rapidez com que serão retirados mais de US$ 1 trilhão do sistema bancário norte-americano.

Como sempre ocorre com as questões econômicas mais sensíveis, os analistas estão divididos em grupos: de um lado, os que projetam uma explosão inflacionária se o Fed não agir já; no outro extremo, os que defendem a manutenção da liquidez atual sob o risco de abortar uma recuperação econômica ainda muito frágil. Finalmente, os que entendem que ainda é muito cedo para mudar a ação do Fed, mas que este já deveria anunciar seu plano de ação para o futuro.

O movimento do Fed -quando ocorrer- vai provocar grande volatilidade com ajustes discretos de preços dos ativos financeiros. Por isso, a instituição presidida por Ben Bernanke sabe que está pisando em ovos. A forma como ele vai comunicar ao mercado uma mudança em sua política monetária precisa ser construída com a sabedoria e a sutileza de um artesão. Por isso, tenho procurado identificar pequenos sinais que possam sinalizar o início de sua ação.

Aconselho aqueles que estão comigo na mesma busca a não esperar que isso venha a acontecer de maneira formal nas reuniões periódicas do comitê de política monetária americano. Antes, os mercados serão informados de maneira indireta -certamente em pequenas pílulas- da decisão de encerrar o chamado "afrouxo monetário quantitativo".

Essa forma de agir tem a grande vantagem de não fixar prazos para seu início, além de permitir uma meia-volta se a economia reagir mal a esse movimento. Também é uma maneira eficiente de lidar com a tradicional histeria dos investidores em momentos cruciais como esse que será vivido à frente.

Foi o que aconteceu nesta semana. Em um primeiro e sutil movimento, o Fed iniciou uma série de consultas a instituições financeiras e a fundos de investimento para discutir a mecânica para realizar operações de curto prazo -chamadas de venda de compromisso de recompra- tendo como lastro títulos de crédito que hoje compõem sua carteira de mais de US$ 2 trilhões. Essas operações permitem que o Fed retire liquidez rapidamente dos mercados quando achar necessário.

Outra "piscada" veio na quarta-feira e ontem com uma série de medidas que afetam as intervenções do Fed no mercado bancário e de títulos, diminuindo o volume e o prazo dos leilões de crédito (os chamados TAF e TSLF) e estendendo o prazo das compras dos títulos lastreados em empréstimos imobiliários. Essas medidas, longe de sinalizar um aperto monetário, foram uma resposta à necessidade menor de liquidez do mercado.

Apesar de não terem efeitos no curto prazo, elas sinalizam uma ação mais efetiva no futuro. Certamente, os mais preocupados com os efeitos inflacionários do excesso de liquidez atual vão ficar mais calmos, e os que se preocupam com a eventual volta da recessão não podem ainda criticar a ação do Fed.

Luiz Carlos Mendonça de Barros , 66, engenheiro e economista, é economista-chefe da Quest Investimentos. Foi presidente do BNDES e ministro das Comunicações (governo Fernando Henrique Cardoso).

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