terça-feira, 29 de setembro de 2009

Honduras cede e promete suspender estado de sítio

Ricardo Galhardo
Enviado especial • Tegucigalpa
DEU EM O GLOBO

Sob forte pressão interna e externa, o presidente interino, Roberto Micheletti, recuou, pediu desculpas à população e admitiu a possibilidade de revogar, até o fim da semana, o estado de sítio decretado na véspera, restringindo as liberdades individuais. De manhã, os primeiros alvos do decreto foram a Rádio Globo e a TV Cholusat Sur, o Canal 36, emissoras pró-Zelaya, invadidas e fechadas por militares. Em reunião de emergência do Conselho Permanente da OEA, o embaixador dos EUA, Lewis Amselem, disse que o retorno de Zelaya a Honduras foi “irresponsável e tolo" e pediu que ele pare de tentar chamar a atenção a qualquer custo.

Micheletti vai rever estado de sítio

Governo fecha TV e rádio, mas, após pressão do Congresso, pede desculpas por limitar liberdades

HONDURAS E SEUS DOIS PRESIDENTES

Diante da pressão interna e externa e da possibilidade de que o decreto que instala o estado de sítio fosse derrubado pelo Congresso, o presidente interino de Honduras, Roberto Micheletti, recuou e admitiu a possibilidade de revogar a medida. A decisão não foi suficiente para evitar a invasão e depredação pelas forças de repressão a uma rádio e uma emissora de TV ligadas ao presidente deposto Manuel Zelaya, ontem de manhã. Micheletti convidou ainda os funcionários da OEA que foram expulsos para voltar ao país, lamentando as “distorções” ocorridas.

A resposta de Micheletti veio depois que uma junta eletiva formada pelo presidente do Congresso, Alfredo Zaafreda, e representantes de quatro dos cinco partidos com representação no Congresso foi até a Casa da Presidência pedir que revogasse o decreto.

Segundo parlamentares, o governo estava inseguro e temia que a medida fosse derrubada em plenário. O Partido Nacional e setores do Liberal, as duas principais forças políticas do país, criticaram duramente o ato durante todo o dia. No final da tarde, Micheletti anunciou que vai consultar a Corte Nacional de Justiça e o Superior Tribunal Eleitoral e, no máximo, até o final da semana deve rever a medida.

— Quero pedir desculpas à população por esta decisão (de baixar o decreto) pois o senhor Zelaya estava chamando à violência e à insurreição.

Segundo um participante da reunião, Micheletti deve revogar o decreto amanhã, depois de consultar também o Conselho de Ministros.

Além da pressão do Congresso, o decreto foi criticado internacionalmente e até pelos veículos de comunicação que apoiaram o golpe. A manchete do jornal “El Heraldo” era “Estado de sítio”, em letras garrafais.

‘Forte abraço a Lula’

Outro motivo é a eleição do dia 29 de novembro, considerada a única saída para a crise para o governo. Os líderes do Congresso argumentaram que seria impossível uma eleição nestas condições. O decreto proíbe reuniões não autorizadas, permite a cassação de veículos de comunicação e detenções sem ordem judicial por 45 dias. As medidas são uma prerrogativa do Executivo prevista na Constituição, mas dependem de condições e devem ser submetidas ao Congresso.

Depois de anunciar o recuo, Micheletti mandou um recado ao presidente Luiz Inácio Lula da Silva.

— Quero enviar a Lula um forte abraço com todo o carinho e dizer a ele que não se preocupe pois jamais nossa polícia vai invadir seu espaço, sua propriedade.

Os primeiros alvos da repressão foram a Rádio Globo e a TV Cholusat Sur, o Canal 36, únicos veículos que divulgavam as manifestações de Zelaya e as ações do movimento de resistência ao golpe. Segundo um jornalista do Canal 36 que pediu anonimato, a emissora foi invadida por militares encapuzados que teriam arrombado a porta, ameaçado jornalistas, desconectado e danificado equipamentos. Micheletti disse ter evidências de que os veículos incitavam a guerrilha.

— Foi um ato de barbárie. Fomos expulsos com fuzis apontados para nossas cabeças — disse o jornalista.

Três jornalistas (dois guatemaltecos e um hondurenho) foram detidos e tiveram equipamentos confiscados quando filmavam o cerco à rádio.

Segundo políticos, o motivo do decreto foi o temor em relação às manifestações agendadas para ontem. Isso não impediu que mil manifestantes se reunissem na Universidade Pedagógica.

Dezenas de policiais da tropa de choque encurralaram os manifestantes, que deitaram na rua. Depois de negociar, a polícia permitiu o protesto desde que não houvesse passeata.

Da embaixada brasileira, onde continua entrincheirado, Zelaya pediu que a ONU adote uma posição firme: — Silenciaram as únicas vozes que o povo hondurenho tinha. Quem tinha dúvida de que aqui se instalou uma ditadura pode esclarecê-la agora.

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