terça-feira, 29 de setembro de 2009

Taxação da poupança pode ser engavetada

Martha Beck e Cristiane JungblutBrasília
DEU EM O GLOBO

A oposição e os aliados - sobretudo o PMDB - já avisaram ao governo que dificilmente o projeto para taxar cadernetas em 22,5% passará no Congresso. A pressão é por engavetar o texto.

Queda de braço na caderneta

Oposição e base aliada pressionam para governo desistir de projeto que cria IR da poupança

A proposta de tributação da caderneta de poupança virou uma verdadeira batata quente entre governo e Congresso. Enquanto a equipe econômica quer enviar aos parlamentares o projeto que institui a cobrança de 22,5% de Imposto de Renda (IR) sobre os rendimentos dos depósitos acima de R$ 50 mil a partir de 2010, a própria base governista pressiona o ministro da Fazenda, Guido Mantega, para que ele seja engavetado ou, pelo menos, alterado. O motivo seria o risco de a tributação da caderneta — assunto extremamente impopular — atrapalhar a tramitação dos projetos relativos ao marco regulatório do pré-sal e dar munição para ataques da oposição ao governo às vésperas do ano eleitoral. O PMDB (principal partido da base) já avisou não há clima para a votação e que, hoje, votaria contra a proposta.

Os técnicos do governo acham que é importante discutir o assunto no Congresso. Por ser polêmico, o tema precisa ser debatido entre os parlamentares de forma que se chegue a uma proposta palatável tanto para a base governista quanto para a oposição. O aviso dos aliados chegou na semana passada ao próprio Mantega, por meio do líder do governo na Câmara, deputado Henrique Fontana (PT-RS). Ele explicou que havia resistências e que de nada adiantaria mandar a proposta à casa com Mantega no exterior (o ministro estava nos EUA para a reunião do G-20), sem poder defendê-la.

Os técnicos do governo sempre souberam das resistências à taxação da poupança. O problema é que a redução contínua da taxa básica, a Selic, tem impacto direto sobre o rendimento da caderneta, tornando-a mais atraente que outros investimentos, já que tem garantidos por lei a correção pela Taxa Referencial (TR) mais juros de 0,5% ao mês. O rendimento dos fundos, por sua vez, cai junto com a Selic, já que são compostos por títulos do governo, corrigidos pela taxa.
Atualmente, a caderneta é isenta de IR, enquanto os fundos pagam entre 22,5% e 15% de IR, dependendo do prazo da aplicação. A ideia do governo é evitar uma fuga de grandes investidores para a poupança, o que desequilibraria o mercado. O risco poderia, inclusive, ser um entrave a uma queda maior da taxa básica.

O líder do PMDB na Câmara, deputado Henrique Eduardo Alves (RN), disse que hoje a bancada do partido é contra a taxação e que não há argumentos atuais que mostrem que houve fuga de ativos dos fundos para a poupança.

— O PMDB não está convencido da necessidade da medida. O sentimento é de o governo nem sequer enviar a proposta. Se não houver argumento, sem dados de convencimento, o PMDB vota contra — disse Alves.

Opção seria adotar percentual da taxa básica

Mexer na remuneração da caderneta também é sensível politicamente, mas pode acabar sendo uma alternativa porque empurra o problema para frente. Várias simulações já foram feitas pelos técnicos do governo e podem acabar voltando à pauta. Uma delas seria manter a correção da caderneta em TR mais 0,5% ao mês caso a Selic fique acima de 8,75% ao ano. Caso ela fique abaixo desse patamar, a remuneração acompanharia a taxa, ficando em torno de 80% da Selic. Se adotada, a medida não chegaria ter impacto em 2010 — pois o mercado financeiro projeta juros mais altos no ano que vem. Outra opção é simplesmente reduzir a tributação dos fundos para que eles se tornem mais atraentes que a poupança e, com isso, não haja migração.

Os próprios parlamentares já apresentam propostas alternativas. O senador Francisco Dornelles (PPB-RJ) defende que o governo mexa na tributação dos fundos de renda fixa, mas diz que, se optar por tributar a caderneta, deve fazer duas coisas: fazer com que ela valha apenas para novos depósitos e aumentar para R$ 100 mil, por exemplo, a faixa de isenção. O presidente do Senado, José Sarney (PMDB-AP), também já disse que deverá apoiar a taxação da poupança, mas só daquelas com valores acima de R$ 100 mil.

Outros aliados, inclusive o vice-líder do governo no Congresso, Gilmar Machado (PT-MG), têm se manifestado contra a proposta. Lembram ainda que outras negociações de Mantega fracassaram e mostram irritação com fórmulas da equipe técnica, sem avaliação do impacto político. Já a oposição diz que taxar seria mexer no princípio de proteção da poupança e que nada garante que no futuro o governo não resolverá taxar valores abaixo de R$ 50 mil.

O líder do PT na Câmara, deputado Cândido Vaccarezza (SP), disse ontem que a questão da poupança tem que ser discutida com calma. Para ele, não há pressa para tratar do assunto, numa sinalização de resistência, inclusive, entre petistas.

Colaborou: Adriana Vasconcelos

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