terça-feira, 6 de outubro de 2009

Honduras suspende estado de sítio

Ricardo Galhardo
Enviado especial • Tegucigalpa
DEU EM O GLOBO


O presidente interino de Honduras, Roberto Micheletti, revogou o estado de sítio e pediu punição aos responsáveis por tirar Zelaya do país em junho. Três estudantes ocuparam por 7 horas a embaixada brasileira em Caracas, pedindo a mediação de Lula junto ao governo Chávez.

Honduras revoga estado de sítio

Governo de Micheletti recua às vésperas da chegada de missão da OEA ao país

No momento em que o golpe de Estado que derrubou Manuel Zelaya completa cem dias, e às vésperas de uma reunião de chanceleres planejada pela Organização dos Estados Americanos (OEA), o presidente interino de Honduras, Roberto Micheletti, deu sinais de flexibilidade em busca de um acordo para o fim da crise. Ontem, anunciou a revogação do decreto que suspendia direitos civis como a liberdade de imprensa, de reunião e de protestos; admitiu pela primeira vez a possibilidade da restituição de Zelaya ao poder; e pediu punição aos responsáveis por tirar o presidente deposto do país, na madrugada de 28 de junho.

Semana passada, Zelaya também dera sinais de disposição para o diálogo ao aceitar ser submetido à Justiça, abrir mão da Assembleia Constituinte e reassumir com poderes limitados.

Ontem pela manhã, em entrevista ao Canal 5 de Honduras, Micheletti admitiu a possibilidade de Zelaya reassumir o governo após as eleições de 29 de novembro.

— Se tivermos eleições transparentes e elegermos um novo chefe de Estado, se poderá então falar de qualquer cenário e qualquer solução.

Cremos que a pátria é a primeira razão para sentar e dialogar, e a volta ao poder de Zelaya é uma aspiração que teríamos que entender desde um ponto de vista mais amplo, um ponto de vista legal — disse Micheletti, que na mesma entrevista rechaçou ainda uma possível Constituinte.

Depois, em entrevista coletiva na Casa Presidencial, Micheletti foi esquivo, mas não rejeitou a possibilidade da restituição.

— É uma questão de diálogo — admitiu.

Punição a grupo que retirou Zelaya do país

Para analistas políticos hondurenhos, a proposta de Micheletti é clara: Zelaya apoia e legitima as eleições e, em troca, é restituído ao poder, ainda que simbolicamente, para mostrar que a América Latina não aceita mais golpes de Estado.

Na coletiva, Micheletti aproveitou para anunciar a revogação do decreto, que suspendia direitos civis como a liberdade de imprensa.

— Quero dar a notícia ao mundo inteiro e dizer que na reunião do Conselho de Ministros revogamos o decreto todo, revogamos completamente — afirmou.

A revogação ocorreu após forte pressão internacional e consultas a diversos setores sociais hondurenhos, unânimes em rechaçar o decreto. Micheletti não explicou, porém, se o governo devolverá as frequências do Canal 36 e da Rádio Globo, invadidos e tirados do ar por militares por serem ligados a Zelaya.

Depois de admitir que foi um erro a forma como Zelaya foi deposto (de pijamas, embarcado à força num avião militar e retirado do país), o atual presidente afirmou que os responsáveis serão castigados no rigor da lei.

— Definitivamente é uma decisão que foi tomada por alguns setores que serão castigados conforme a lei — disse Micheletti, sem explicar, porém, quais são esses setores.

A flexibilização aconteceu às vésperas da visita de chanceleres da OEA, marcada para amanhã, da qual se espera uma solução definitiva para a crise política hondurenha. Além do secretáriogeral da entidade, a missão incluirá o secretário de Estado da Espanha para a Iberoamérica, os chanceleres de Costa Rica, Equador, El Salvador, México, Panamá, Canadá e Jamaica, e os representantes permanentes de Argentina e Brasil na OEA. Víctor Rico, secretário de Assuntos Políticos da OEA, afirmou que a entidade se dispõe, caso necessário, a alterar os termos do Acordo de San José, elaborado pelo presidente da Costa Rica, Óscar Arias, como proposta de solução para a crise: — Isso é absolutamente factível, aqui não há nada escrito em pedra ou em bronze.

Arias também falou sobre a crise ontem, dizendo que “mais cedo ou mais tarde” a Constituição hondurenha terá de ser modificada, e que a atual situação no país não deveria ser levada ao Conselho de Segurança da ONU, já que não representaria perigo ao mundo.

Ontem, de dentro da embaixada brasileira, Zelaya pressionou Micheletti a aceitar a imediata assinatura do Acordo de San José. O presidente deposto divulgou um comunicado no qual estabelece como condições para a negociação o fim do cerco à embaixada brasileira e a liberdade para receber quem queira na representação diplomática, onde está desde o último dia 21. A pessoas que se encontram retidas com ele na embaixada, também queixou-se da falta de canais de comunicação com seus assessores. Segundo Zelaya, os telefones celulares estão grampeados e seus interlocutores foram proibidos de entrar na representação brasileira, o que inviabiliza a articulação de estratégias de negociação. Zelaya teria inclusive ameaçado não participar do diálogo pelo fim da crise caso não lhe sejam garantidos canais seguros de comunicação com seus assessores.

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