sábado, 31 de outubro de 2009

Menos forte. E indispensável

Clovis Rossi
DEU NA FOLHA DE S. PAULO

Era precipitada a notícia do declínio dos Estados Unidos, como mostram recuperação econômica e caso Honduras

PARA UM país que a sabedoria convencional (ou apenas apressada) condenava a um irremediável declínio, os Estados Unidos emitem contínuos sinais de insuspeitada vitalidade.

Não estou dizendo que Washington deixou de perder força, alguma força ao menos. Mas nem por isso é menos indispensável, olhe-se para onde se olhe.

Comecemos pela economia: bastou os Estados Unidos saírem da recessão para o mundo todo festejar com certo estrépito, o que dá claro testemunho de sua indispensabilidade.

Fiquemos apenas no caso da Ásia, o continente que a sabedoria convencional (ou de novo talvez apressada) aponta como o novo centro do mundo em um futuro não muito distante.

As Bolsas asiáticas recuperaram-se ontem de sua pior queda em dois meses. Causa, segundo o "Financial Times": "Os investidores aqueceram seus corações com o retorno dos EUA ao crescimento econômico" (não acredito muito que investidores tenham coração, mas esse é outro assunto). É claro que os Estados Unidos ainda têm "um longo caminho a percorrer até que a economia esteja plenamente recuperada", como disse seu presidente.

Mas a subida das Bolsas -e não foram apenas as asiáticas- ante a notícia de que a recessão acabou nos Estados Unidos indica claramente o quanto o país mantém seu papel de dínamo.

Quer outra demonstração? Apesar de toda a onda em torno da substituição do dólar como moeda global de reserva, um coro em que a China desempenha papel relevante, o fato é que as autoridades chinesas acumularam mais ativos denominados em dólares do que outros ativos externos nos 12 meses terminados em julho. Ou seja, no auge de uma crise que levaria supostamente a um declínio inexorável dos EUA e, por extensão, de sua moeda.

Passemos agora da economia para a política, do global para o regional.

Falemos de Honduras, a mais espetacular crise da América Latina nos últimos anos. Digo espetacular para não dizer grave, porque é discutível que um país tão pequeno e tão marginal geograficamente possa ser o epicentro de uma crise regional realmente grave.

Foram quatro meses de tentativas de resolver o impasse por meio de iniciativas autóctones. Primeiro, a do presidente da Costa Rica, Óscar Arias, aureolado com o Nobel da Paz. Depois, veio a intermediação da Organização dos Estados Americanos. Nada.

Aí, chegou o sétimo de cavalaria, mais conhecido pelo nome de Thomas Shannon, responsável pela região no Departamento de Estado, enquanto aguarda que cesse a birrinha de um representante republicano e ele seja confirmado como novo embaixador no Brasil. Em dois dias, o nó foi desfeito. É verdade que a base do acordo é o plano Arias, mas foi necessária a intervenção de Shannon, ao vivo e em cores, para que o plano fosse aceito.

Toda a conversa em torno da nova liderança do Brasil, todo o teatro que são sempre as falas de Hugo Chávez, a emergência dos bolivarianos -nada disso impediu que o velho império se revelasse de novo indispensável. E, o que é melhor, desta vez para o bem.

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