sexta-feira, 16 de outubro de 2009

Vale enfrenta agora ameaça de ter exportações taxadas

Eliane Oliveira
DEU EM O GLOBO

Após ser salvo da pressão de Lula para mudar o comando da Vale, o presidente da empresa, Roger Agnelli, agora tem pela frente nova batalha. Os ministérios da Fazenda e do Desenvolvimento preparam a criação de um imposto sobre as exportações brasileiras de minérios, com alíquota de até 5%. Das 282 milhões de toneladas vendidas pelo Brasil no exterior, que renderam US$ 22,8 bilhões no ano passado, 60% a 70% são de minério de ferro, principal item da pauta exportadora da Vale, que concentra 79% da produção no mercado nacional. A medida é uma alternativa à proposta do ministro de Minas e Energia, Edison Lobão, de elevar os royalties pagos por todo o setor de mineração - o novo imposto seria recolhido só pelo exportador. A um interlocutor, Agnelli revelou estar assustado com a pressão pública que vem sofrendo. Para ele, setores do governo querem tomar conta da Vale.

Nova ameaça à Vale

Governo quer taxar exportação mineral em até 5%. Empresa produz 79% do minério de ferro no país

Às voltas com um inferno astral no campo político desde que o presidente Lula passou a pressionar pela troca de comando na Vale, o presidente da empresa, Roger Agnelli, tem pela frente uma nova batalha, desta vez na área técnica. Os ministérios da Fazenda e do Desenvolvimento alinhavam nos últimos dois meses a imposição de um imposto sobre as exportações brasileiras de minérios, com alíquota de até 5%. Das 282 milhões de toneladas vendidas pelo Brasil no exterior, que renderam US$22,8 bilhões em 2008, 60% a 70% são de minério de ferro - principal item da pauta exportadora da Vale, que concentra 79% da produção no mercado nacional. Atualmente, o couro é o único produto brasileiro cuja venda ao exterior é tributada.

A medida é uma alternativa à proposta do ministro de Minas e Energia, Edison Lobão, de elevar os royalties pagos por todo o setor de mineração - o imposto seria recolhido apenas pelo exportador. Este é um dos principais pontos do projeto do novo Código Brasileiro de Mineração, que está sendo formatado pela pasta. Mesmo que a tributação não vingue, a Vale será afetada pelo aumento dos royalties, reduzindo na margem sua competitividade. Caberá à Câmara de Comércio Exterior (Camex) examinar e dar aval à taxação das exportações.

De um lado, os defensores do tributo argumentam que as cadeias produtivas que dependem do minério de ferro - com ênfase para o setor siderúrgico, que abastece áreas estratégicas como a automotiva e a de construção civil - serão atingidas pelo aumento de royalties, o que poderá desestimular investimentos. O ônus seria repassado ao consumidor final, provocando repiques na inflação.

O único temor é que o Imposto de Exportação, que seria transitório, passe a compor a expectativa anual de receita orçamentária - ou seja, o governo não abriria mão desses recursos. Foi o que aconteceu na Argentina, que não sobrevive mais sem a tributação de commodities como soja e milho, adotada há cerca de dois anos pela presidente Cristina Kirchner, para garantir o abastecimento interno.

Setor privado é contrário à medida

Além disso, o minério de ferro tem fatia de 9% do total exportado pelo país. Garantiu, somente no período de janeiro a setembro de 2009, uma receita maior que US$10 bilhões.

Uma fonte destacou que, se aprovado o imposto, que pode ficar entre 4% e 5%, a tributação não atingirá somente minério de ferro. Outras commodities exportadas pelo Brasil, como bauxita, alumínio, manganês, cobre, e níquel, também serão atingidas.

Um técnico observou que a China já aplica o imposto sobre esses itens, para assegurar o abastecimento interno. No Brasil, a ideia de elevar os royalties - que são distribuídos às cidades afetadas pela atividade - seria turbinar a arrecadação, que atualmente é de apenas R$500 milhões.

Na defesa pelo aumento de royalties incidentes sobre o setor de mineração, Lobão tem afirmado que um dos objetivos é igualar o Brasil a outros países, como Austrália, nosso principal concorrente no mercado externo.

As empresas mineradoras, como Vale e MMX, e o Instituto Brasileiro de Mineração (Ibram) evitaram comentar a medida. Outros representantes do setor privado, como a Associação de Comércio Exterior do Brasil (AEB) e o Instituto Aço Brasil (IABr, antigo Instituto Brasileiro de Siderurgia), se posicionaram contra a criação do imposto.

- Sou completamente contra isso. Neste momento, o mundo virou uma bolsa de mercadorias em que as cotações das commodities sobem e descem, muitas vezes movidas por especulação. Além disso, o imposto de de hoje pode virar um confisco amanhã - afirmou o vice-presidente da AEB, José Augusto de Castro.

O vice-presidente do IABr, Marco Polo de Mello, disse não concordar com nenhuma das alternativas. O aumento de royalties encareceria o processo produtivo como um todo, retirando competitividade da indústria brasileira. A tributação da exportação de minérios teria um efeito nocivo sobre as exportações brasileiras.

- O minério de ferro é uma commodity que está em competição no mundo inteiro, e isso demonstra que o governo só está preocupado em arrecadar - afirmou.

O setor siderúrgico já está sob a ameaça dos ministros da Fazenda, Guido Mantega, e do Desenvolvimento, Miguel Jorge, de perder a proteção que conseguiu há cerca de dois meses, com a redução das tarifas de importação. O imposto foi aumentado para atender a preocupação das indústrias, que apontavam o aumento das importações e a perda de exportações em mercados vizinhos para a China. Mas foram acusadas pelo setor automotivo de reajustar indevidamente seus preços.

- Já asseguramos que não houve reajuste. Não aceitamos ser usados como instrumento para venda de outros segmentos - disse Marco Polo.

A medida também irá aumentar ainda mais a carga tributária que incide na mineração. Levantamento feito em 2008 pela consultoria Ernst & Young, para o Ibram, aponta que o Brasil é o país que cobra a maior carga tributária sobre 12 minérios, na comparação com outras vinte nações concorrentes no mercado internacional.

O Brasil é o campeão na cobrança de impostos sobre seis minérios (zinco, cobre, fosfato, níquel, potássio e rochas ornamentais), cobra a segunda maior carga sobre outros cinco (bauxita, carvão mineral) e é o terceiro em minério de ferro, atrás da Venezuela, que tem produção irrisória, e da China, que consome tudo o que produz.

Colaborou Gustavo Paul

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