DEU EM O GLOBO
Ministro Tarso Genro diz que há um "fascismo galopante" na Itália
Depois da polêmica decisão do Supremo Tribunal Federal (STF) de aprovar a extradição do italiano Cesare Battisti mas decidir que a palavra final caberá ao presidente Lula, o relator do caso, ministro Cezar Peluso, deixou clara sua irritação com o resultado do julgamento. Peluso disse que não tem condição de redigir o texto do acórdão que resumirá a decisão final. "Não tenho condições intelectuais de sequer resumir com inteira fidelidade o douto raciocínio da maioria", reclamou. Para esclarecer dúvidas sobre as consequências práticas do julgamento, a defesa do governo da Itália anunciou que entrará com embargos de declaração no STF. Também no Senado o resultado foi criticado: "O Supremo lavou as mãos, se desmoralizou", disse Demóstenes Torres (DEM-GO). Juristas divergiram sobre o caso. O ministro da Justiça, Tarso Genro, disse que a decisãode Lula deve demorar, e denunciou que há "um fascismo galopante" na Itália.
Julgamento e discórdia no STF
Depois de Gilmar, Peluso reclama da decisão de dar a Lula palavra final sobre extradição
Carolina Brígido BRASÍLIA
Um dia após o julgamento do processo de extradição do ex-ativista italiano Cesare Battisti, o Supremo Tribunal Federal deu demonstrações de que ainda não tinha digerido a polêmica sessão de anteontem. Integrantes do grupo derrotado na votação que garantiu ao presidente Luiz Inácio Lula da Silva o direito de dar a última palavra sobre o destino do italiano deram explícitas demonstrações de insatisfação.
No início da sessão, o relator do caso, ministro Cezar Peluso, mostrou irritação com o resultado do julgamento. Peluso disse que não tinha condição de redigir o texto do acórdão que resumirá a parte final dos votos dos colegas, em que eles deixam a decisão final com Lula.
— Não tenho condições intelectuais sequer se resumir com inteira fidelidade o douto raciocínio da maioria — protestou o relator.
Na primeira parte do julgamento, a Corte decidiu que era ilegal a condição de refugiado dada a Battisti pelo governo brasileiro. Depois, os ministros resolveram autorizar a extradição do italiano. No terceiro momento, ficou decidido que a palavra final sobre a extradição cabe ao presidente.
Nos dois primeiros aspectos, prevaleceu a vontade do relator. No terceiro item, Peluso foi derrotado. Ele defendeu que fosse obrigatório ao presidente seguir a determinação do STF. A votação terminou em cinco votos a quatro nas três etapas.
O ministro Marco Aurélio Mello, um dos que defenderam a permanência de Battisti no país como refugiado, sugeriu ontem que Carlos Ayres Britto redigisse o acórdão. Ayres Britto foi dos mais ferrenhos defensores de que Lula deve decidir sobre a extradição.
Por fim, Cármen Lúcia se ofereceu para ajudar Peluso a elaborar o texto.
Anteontem à noite, o presidente do STF, Gilmar Mendes, também manifestou contrariedade ao dizer que o julgamento — em que saiu derrotado — não tinha encerrado a polêmica.
Advogado reclama de contradições
Para esclarecer dúvidas sobre as consequências práticas do julgamento, a defesa do governo da Itália anunciou que entrará com embargos de declaração no Supremo. O advogado Nabor Bulhões quer que o STF entre em detalhes sobre todos os possíveis desdobramentos do caso Battisti. Essa medida será tomada após a publicação do acórdão da decisão, que não tem data prevista.
— Com relação àquele último incidente, foi uma questão muito mal discutida, confusamente tratada.
Houve incontornável obscuridade por parte de alguns ministros. Vários ministros fizeram manifestações contraditórias. As notas taquigráficas vão revelar isso com toda clareza.
Foram contradições sucessivas em espaço de minutos — disse.
Para Bulhões, o STF quis dizer com a decisão que Lula só pode se recusar a extraditar o réu se houver previsão específica em lei: — Não há de se entender que o Supremo tenha dito que o presidente pode descumprir a lei, a Constituição e o tratado bilateral. A Itália confia que o presidente cumpra o tratado.
O advogado de Battisti, Luís Roberto Barroso, disse confiar que seu cliente não será extraditado. No momento, ele reúne documentos e argumentos para apresentar ao presidente Lula a fim de influenciá-lo na decisão.
— Não tenho nenhuma razão para supor que o presidente da República vá tomar uma decisão política diversa daquela que já tomou. Minha expectativa é que o presidente ratifique a posição dele — afirmou.
Barroso ponderou que o tratado de extradição firmado entre Brasil e Itália prevê que o presidente deixe de extraditar um réu por motivo político: — É incorreto dizer que a decisão do presidente de não extraditar viola o tratado. Pelo contrário: há fundamento no tratado para que o presidente faça uma valoração sobre a entrega ou não do extraditando.
Política e cultura, segundo uma opção democrática, constitucionalista, reformista, plural.
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