DEU EM O GLOBO
O Brasil começou a recuar de sua rejeição às eleições em Honduras. Marco Aurélio Garcia, assessor do presidente Lula, disse que, se o país considerar que tem que mudar de posição, mudará". O continente está dividido.
Continente dividido
Cúpula Iberoamericana vive impasse sobre reconhecimento de eleições, e Brasil já ensaia recuo
Deborah Berlinck Enviada especial• ESTORIL, Portugal
A eleição de Honduras concentrou as atenções ontem na Cúpula Iberoamericana em Estoril, Portugal, expondo a enorme divisão no continente americano sobre como reagir, agora que a eleição de Porfirio “Pepe” Lobo em Honduras é um fato consumado.
Diante do racha, a cúpula poderá acabar hoje sem uma declaração sobre Honduras. Alguns países que se alinhavam à posição do Brasil — de não reconhecer os golpistas —começaram a caminhar na direção do diálogo com o presidente eleito.
A Espanha defendeu abertamente o diálogo, dizendo que a resolução do impasse político em Honduras tem que passar, necessariamente, por um “grande acordo” que envolva América do Sul, América Central e Europa.
No final do dia, depois uma verdadeira ginástica retórica, até o Brasil, pela primeira vez, admitiu que poderá mudar de posição, dependendo de gestos do presidente eleito e do índice de participação eleitoral.
— Se o Brasil considerar que tem que mudar de posição, mudará. Vamos ter que ver concretamente como isso evolui — disse Marco Aurélio Garcia, assessor especial da Presidência, que repetia, ao mesmo tempo, que “o Brasil não mudou de posição”.
Quando repórteres insistiram em perguntar se isso não era uma contradição — repetir que a eleição é ilegítima, mas aceitar reavaliar o quadro se ficar comprovada forte participação popular —, Garcia respondeu : — Consideramos que esta eleição é ilegítima.
Mas se evidentemente tivesse tido uma fortíssima participação popular, não poderíamos ficar indiferentes a este dado. Uma coisa é repudiarmos a eleição como procedimento. Outra é considerarmos como um fato político. Para quem faz política, como fazemos, são elementos que devem ser considerados — disse.
A divisão entre os países ficou óbvia com a troca de farpas ontem entre o presidente da Costa Rica, Óscar Arias, e Marco Aurélio Garcia.
Na crise de Honduras, Garcia bateu de frente com dois Prêmio Nobel da Paz: Barack Obama, o presidente dos EUA, e agora Arias.
Este disse que não reconhecer as eleições hondurenhas significa “castigar o povo hondurenho”. Sem citar nominalmente o presidente Luiz Inácio Lula da Silva, que apoiou abertamente a contestada reeleição do presidente do Irã, Mahmoud Ahmadinejad, ele disse que “o pior seria atuar com moral dupla”.
— Há muitos países na comunidade internacional que aceitam a eleição do Irã, que foi questionada e que se sabe que não foram limpas e que todos sabem que não foram transparentes — atacou.
Garcia defende eleições iranianas
Marco Aurélio reagiu mal às declarações de Arias: — Esta comparação, além de indelicada, é absolutamente improcedente.
As eleições do Irã foram convocadas pelo governo do Irã, sobre o qual não havia nenhuma contestação. As eleições de Honduras foram convocadas por um governo golpista.
Garcia insistiu que, para o Brasil, as eleições hondurenhas servem para legitimar o golpe. Mas listou algumas condições para o governo reavaliar sua posição. O Brasil quer saber o que pensa o presidente deposto, Manuel Zelaya. Depois, o que Lobo está pensando sobre o futuro de seu país, e se ele vai trabalhar com a Organização dos Estados Americanos para uma saída para a crise.
Ontem, a chanceler deposta de Honduras, Patricia Rodas, admitiu que o governo eleito precisa fazer parte do diálogo para pôr fim à crise.
Política e cultura, segundo uma opção democrática, constitucionalista, reformista, plural.
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