sábado, 13 de junho de 2009

A atualidade de Enrico Berlinguer

Piero Fassino
Fonte: L'Unità & Gramsci e o Brasil
Tradução: A. Veiga Fialho

Nestes vinte e cinco anos que nos separam do trágico desaparecimento de Enrico Berlinguer, tudo mudou em torno de nós. O mundo, a Europa, a Itália conheceram transformações enormes que nos trazem um cenário inteiramente diferente daquele em que o mais amado secretário do PCI viveu seu extraordinário percurso político e humano.

E no entanto voltar a refletir sobre a ação e o pensamento de um dos dirigentes que mais marcaram a história da esquerda e da democracia italiana é ainda mais útil, porque o nosso tempo nos traz temas sobre os quais Berlinguer teve intuições preciosas e precoces. Quando o secretário do PCI falou de “austeridade”, não havia na nossa linguagem esta outra palavra com a mesma terminação — “sustentabilidade” —, que se tornou hoje de uso cotidiano.

Era a metade dos anos 1970, o tempo da primeira grande crise do petróleo, que levava os países produtores de petróleo a reivindicar uma mudança dos termos de troca e das relações de mercado e de investimento com os países industrializados e consumidores. Muitos consideraram, naquele momento, a austeridade berlingueriana com desconfiança, quase como se fosse uma forma de rejeição da modernidade. Na realidade, Berlinguer compreendeu muito antes do que os outros que uma concepção do desenvolvimento unicamente como ininterrupta produção de bens e de mercadorias está destinada a chocar-se com os limites intransponíveis da natureza e do destino humano. E que fundamentar o desenvolvimento em bases sustentáveis — demográficas, ambientais, sociais — é condição para que o crescimento seja capaz de produzir benefícios dos quais possa desfrutar uma vasta humanidade, sem prejudicar as oportunidades e o destino das gerações futuras.

“Governo mundial” foi outra expressão original que Berlinguer cunhou, querendo sublinhar o desgaste do sistema bipolar e a necessidade de um novo equilíbrio político do planeta, não mais governável com base nas relações de choque, competição ou confronto entre URSS e Estados Unidos.

Mesmo tal expressão podia parecer utópica — e não faltou quem acusasse o líder do PCI de abstrações e visões cheias de veleidade —, quando, ao contrário, Berlinguer antecipava assim um tema que hoje a crise da globalização nos coloca de modo incisivo: a necessidade de uma governance global e de um multipolarismo responsável diante de um mundo cada vez mais único e interdependente, que não pode ser sustentado só pelas soberanias nacionais e suas mútuas relações.

É ainda uma das afirmações mais conhecidas e fortes de Berlinguer — a “democracia como valor universal” — que se mostra hoje vigorosamente atual.

Se, no passado, tal afirmação tinha o significado forte e explícito de contestar o comunismo soviético e seu caráter opressivo, hoje a “questão democrática” revela-se de extraordinária atualidade, numa sociedade em que os poderes das nações se esvaziam, os cidadãos sentem como mais incertos os seus direitos, a política e as instituições surgem fracas e inadequadas, e, até mesmo, crescente é o deslocamento de poderes, decisões, recursos: de instituições legitimadas pelos cidadãos — “democráticas”, precisamente — para lugares e instâncias extrainstitucionais, ao mesmo tempo que se afirmam concepções populistas e plebiscitárias da política e da direção.

E, por fim, como deixar de ver a extraordinária atualidade de uma concepção da política não separada de princípios éticos e regras morais?

Por ter evocado a “questão moral”, Berlinguer foi muitas vezes acusado de sectarismo e moralismo. E ainda hoje há quem atribua à evocação dessa questão feridas dilacedoras e não curadas.

Em realidade, em tal expressão havia não apenas a consciência da degradação a que o tecido político e institucional estava perigosamente exposto, mas sobretudo a firme convicção de que a credibilidade da política e de quem a representa consiste na transparência, na honestidade, no respeito à autonomia das instituições, na observância das leis e na adoção de comportamentos que não violem essenciais princípios éticos e morais em que todos os cidadãos se reconhecem. Valores e conceitos cuja necessidade podemos bem avaliar num tempo em que a política italiana nos traz todo dia imagens bastante deprimentes.

Refletir sobre Berlinguer, portanto, não em razão de uma nostalgia anti-histórica, mas para aproveitar suas intuições e suas reflexões num tempo presente que, mais uma vez, requer da esquerda e dos reformistas que não tenham medo — como Berlinguer não teve — de percorrer caminhos inexplorados e navegar em mar aberto.

Piero Fassino, expoente do antigo PCI, foi também secretário nacional dos Democráticos de Esquerda, a partir de 2001. Especializado em temas de justiça e política exterior, foi ministro nos Governos italianos chefiados por Massimo D'Alema e Giuliano Amato. Atualmente, é deputado do Partido Democrático.

Brics, além do acrônimo

Merval Pereira
DEU EM O GLOBO

O embaixador Marcos Azambuja, que foi nosso representante, entre outros países, na França e na Argentina, conhecido pela inteligência rápida e humor crítico, caiu em desgraça no governo Itamar Franco quando disse que, com a eleição de Fernando Henrique Cardoso para a Presidência, era como se o país tivesse um upgrade da classe econômica para a primeira classe.

Hoje, como representante do Centro Brasileiro de Relações Internacionais (Cebri), tem participado de reuniões com diversos centros de estudos dos Brics (Brasil, Rússia, Índia e China) e tem uma nova sensação: a de que o país que representa “chegou lá”. Ele classifica os Brics de “o primeiro caminho de admissão do Brasil no diretório central do poder mundial”.

Na próxima terça-feira, dia 16, acontecerá o primeiro encontro de chefes de Estado dos Brics em Yekaterinburgo, na Rússia. Essa é a primeira revisão de poder da era pós-Segunda Guerra Mundial, o retrato, confuso ainda, de uma nova realidade que a crise econômica internacional valorizou.

Uma reunião dos quatro grandes que não são os quatro grandes da Segunda Guerra.

O Ministro das Relações Exteriores, Celso Amorim, deu a deixa ao dizer que o G-8, que se reúne nos próximos dias, já não representa mais nada. Para o ministro do Planejamento Estratégico, Mangabeira Unger, há grande interesse pelo adensamento do movimento dos Brics, que aparece como mais promissor do que o G-20 ou o G-8 + 5.

O presidente Medvedev, da Rússia, ressalta que os quatro países detêm 40% da população e do PIB mundiais, além de representarem 28% da massa terrestre do planeta.

“Estamos muito longe do terceiromundismo, estamos tratando praticamente da metade da humanidade, e o que surgir a título de convergência entre esses países exercerá influência muito grande sobre o futuro”, ressalta o ministro Mangabeira Unger.

A recente reunião em Moscou, preparatória para o encontro de chefes de Estado, mostrou os dois megapaíses do grupo, Índia e China, muito mais cautelosos do que Rússia e Brasil, mas é natural que assim seja.

Embora Índia e Brasil tenham participado da Segunda Guerra Mundial, nenhum dos dois foi reconhecido nos acertos subsequentes da Guerra como uma potência vitoriosa, ao contrário da Rússia e da China, que fazem parte permanente do Conselho de Segurança da ONU. A Índia ainda lutou sob o domínio inglês, e o Brasil não tinha cacife político para reivindicar um lugar entre os vencedores.

Até agora, as discussões entre os Brics têm sido dominadas por dois temas: a representação mais ampla dos países emergentes nas organizações estabelecidas depois da Segunda Guerra Mundial, e a questão do protecionismo, especialmente na agricultura.

São temas divisionistas, lembra Mangabeira Unger, inclusive dividem os próprios Brics, pois dois deles, China e Rússia, estão entrincheirados entre os membros permanentes do Conselho de Segurança da ONU.

E no tema econômico do protecionismo a divisão ocorre em outras linhas por que o Brasil busca apoio aos seus produtos agrícolas, e China e Índia têm o interesse previsível e legítimo de resguardar sua agricultura familiar. Aí, há clara divisão entre os Brics.

Mas Mangabeira Unger acha que “estamos fadados a propor rearranjos nessa estrutura, e é natural que ao ouvir nossas propostas, a Rússia e a China exibam relutância”.

O e m b a i x a d o r M a rc o s Azambuja lembra que, além do Conselho de Segurança da ONU, já não fôramos antes chamados para formar a Liga das Nações, e os Brics é “o primeiro grande navio que nos embarca”. Para ele, os quatro vão se juntar ao México e à África do Sul, talvez Indonésia, para complementar o G-8.

Para Mangabeira Unger, está claríssimo de que “estamos muito longe de termos um programa comum, mas já fomos muito além de termos apenas uma lista de preocupações compartilhadas”.

Para o embaixador Marcos Azambuja, “o que une os Brics são grandes volumes, territoriais, de produto, de população.

Os Brics são a expressão da massa crítica de cada um.

Eles têm uma relevância entre eles de porte, todos são grandes países territoriais, grandes produtores”.

Mas, segundo o embaixador, “como naquela peça do Pirandello ‘Seis personagens à procura de um autor’, os Brics são quatro países à procura de uma agenda. Não temos uma agenda de cooperação montada”.

Ao contrário do G-7, que nasce de uma guerra, de uma oposição ao comunismo, afinidades culturais e a defesa de um ideário liberal progressista, industrial, os quatro dos Brics existem, primeiro, porque foram excluídos pelos outros.

Para Azambuja, se o G-7 tivesse absorvido os quatro, o mundo estaria hoje em ordem.

Só a Rússia entrou, e de maneira desconfortável, pois não se sente parte daquele time, antigos adversários da União Soviética.

“Os quatro estão num processo de começar a encontrar afinidades. Não tiveram o que costuma ser o cimento de uma união, uma guerra lutada lado a lado, e não temos um adversário ideológico. O que temos é uma percepção de que os nossos números são tão avassaladores que os quatro se identificam na sua grandeza.

É uma emergência de gigantes, que não têm nenhum ideário de convergência real”, ressalta Azambuja.

Do desarmamento nuclear ao papel do dólar como moeda de reserva internacional; da reorganização dos organismos internacionais ao papel do G-20, todos esses assuntos estão na mesa de discussões dos novos jogadores no xadrez internacional.

Uma coisa parece certa: os chefes de Estado na cúpula de Yekaterinburgo vão escolher um caminho mais focado, e sentiremos os efeitos da reunião, que por si só é um fato histórico. Os Brics passarão a ser mais do que um simples acrônimo criado por um banco de investimentos internacional.

(Continua amanhã)

Meras marionetes?

Dora Kramer
DEU EM O ESTADO DE S. PAULO

Agaciel Maia caiu, João Carlos Zoghbi caiu, Alexandre Gazineo está balançando na diretoria-geral do Senado, todos acusados de operar um esquema de ilicitudes na Casa. Talvez sejam alvos de processos administrativos e podem terminar as respectivas carreiras demitidos a bem do serviço público.

Há senadores já imbuídos da disposição de levar adiante essa tarefa.

Falta, contudo, um personagem nesse cenário de malfeitorias: alguém disposto a assumir a missão de zelar pelo bom andamento dos trabalhos da representação pública e, em nome dela, pôr o foco do problema também sobre a atuação dos senadores.

Como bem lembrou outro dia o ministro da Defesa, Nelson Jobim, a propósito dos afilhados de políticos alojados na estrutura da Infraero, "jabuti não sobe em árvore".

Nem subordinados transgridem impunemente sem o conhecimento - para não dizer, por ordem - das chefias.

A menos que no Senado a regra tenha sido oficialmente subvertida e suas excelências estejam hierarquicamente submetidas às orientações dos funcionários comissionados e dos servidores de carreira.

Fosse assim, se o corpo administrativo mandasse e suas conveniências prevalecessem sobre os bons costumes, seria de se perguntar de que valeriam, então, os senadores.

Além de meras marionetes manipuladas por servidores mal-intencionados, haveriam de ser necessariamente cegos, surdos e mudos para não ver, não ouvir falar nem reclamar contra a multiplicação de diretorias, a ampliação do número de cargos, os negócios de crédito consignado, o pagamento de horas extras no recesso, a contratação de familiares pelo sistema de "nepotismo cruzado" e demais absurdos.

Sendo bem diferente a realidade, não faz o menor sentido a solução que se engendra no Senado.

Não por acaso, quem faz o esboço da solução é o departamento jurídico da Casa, atuando como defensoria pessoal dos parlamentares. O objetivo, segundo o advogado-geral Luiz Fernando Bandeira de Mello, é encontrar uma saída para "diminuir o estrago para a imagem da Casa".

Em português mais escorreito, uma solução para livrar os senadores de suas responsabilidades.

No caso dos atos secretos - pelo visto, o pecado original do qual todos os outros foram consequência - o advogado já chegou à conclusão de que o culpado é quem os manteve sob sigilo. Ou seja, o dono da assinatura, o diretor-geral.

"Constatada a má-fé", o ressarcimento das despesas geradas pelas resoluções caberá ao funcionário.

O exame de constatação de má-fé pressupõe que possa haver boa-fé na edição de 500 decisões secretas e, só por isso, inconstitucionais.

A convicção de que a responsabilidade cabe exclusivamente ao servidor parte do princípio da isenção liminar de quem nomeou e sustentou politicamente Agaciel Maia durante 14 anos, além de todos os integrantes de Mesas Diretoras nesse período.

Todos festejavam e reverenciavam Agaciel. Como executor de tarefas e produtor de conveniências, bem entendido. Com poder delegado. Demissível a qualquer tempo - tanto é que foi afastado quando a necessidade se impôs - e, portanto, devedor de obediência aos verdadeiros donos da delegação.

Estes nunca parecem se dar conta, mas devem satisfação a uma instância superior que lhes conferiu votos e mandato, tornando-se responsáveis pela condução do Senado. No plenário, nas comissões, nos gabinetes, na administração dos recursos do Orçamento destinados à instituição.

É completamente fora de propósito a tentativa de separar os senadores do Senado. Contraria inclusive a posição de muitos deles que, logo no início da série mais recente de escândalos, foram à tribuna para afirmar as respectivas responsabilidades sobre o que ocorria em seus gabinetes.

Havia acabado de ser descoberto o pagamento indevido de horas extras no recesso. Vários assumiram a defesa dos funcionários, atestaram a legalidade do ato, corroboraram a lisura do dinheiro recebido e repudiaram a hipótese de devolução.

A maioria, de fato, não ressarciu coisa alguma nem foi instada a mudar de opinião.

Essa autonomia, conferida pela condição de autoridades máximas dentro do Senado, permitiu-lhes distribuir benfeitorias. Por analogia, a mesma prerrogativa soberana os obrigaria agora a responder pelas malfeitorias.

Pessoal e intransferível

A justificativa do senador Epitácio Cafeteira para a contratação de um neto de José Sarney em seu gabinete é um monumento em homenagem ao princípio da impessoalidade solapada.

Diz ele: "Contratei porque devia favores ao Fernando Sarney", filho do presidente do Senado que havia ajudado na campanha e atuado para reaproximar o contratante do avô do neto contratado.

No afã de livrar Sarney da responsabilidade, Cafeteira nem se preocupou em disfarçar o uso de um recurso público para pagar uma vantagem privada.

O escândalo que saiu do baú

Coisas da Política :: Villas-Bôas Corrêa
DEU NO JORNAL DO BRASIL

Quando a temporada de escândalos do pior Congresso de todos os tempos parecia ter esgotado o repertório para a pré-campanha eleitoral, que começa a esquentar no primeiro trimestre do próximo ano, eis que surge do fundo do baú dos segredos da cumplicidade o que parece disputar o recorde do maior do período do mandato e meio da reeleição do presidente Lula.

A esta altura, a encruada CPI da Petrobras ou a esquálida CPI das ONGs foram rebaixadas das manchetes para os destaques das páginas internas. E desta vez cabe ao Senado o lugar no alto do pódio. Ele não compartilha com a Câmara dos Deputados, apesar das muitas leviandades e trampas do seu repertório, a descoberta que a Mesa do Senado vinha guardando a sete chaves, à espera da melhor hora de divulgar o seu feito histórico.

Vamos aos fatos, antes de mais delongas. A atenta e severa Mesa Diretora do Senado foi informada, com o suporte de dados preliminares, da descoberta de mais de 500 atos secretos, que nunca foram publicados no Boletim Administrativo, como é da rotineira exigência da lei, que distribuem, com a generosidade dos que lidam com o dinheiro da explorada Viúva, favores em cascata para senadores e a sua enorme parentela dos afins, além do cupinchas, cabos eleitorais e amigos do peito e do bolso, de nomeações aos privilégios que podem render mais do que o salário.

Alguns senadores com o queixo enterrado no pescoço mexem-se para a apuração rigorosa do tamanho da trapaça, uma vez que o seu principal responsável é de fácil identificação: o ex-diretor-geral do Senado Agaciel Maia, genial inventor da fraude dos atos secretos, utilizados pelos ex-presidentes nos últimos dez anos.

E na forma do costume a apuração deslizou como água de córrego, sem bulha, na maior moita. Quando começou a varredura, o otimismo da Mesa do Senado foi alimentado pela avaliação da comissão instalada para investigar os atos secretos, em cerca de 300.

De 300 para 500 é menos que o dobro, uma mixaria. Mas não há como manter o sigilo depois do estouro do traque. E o relatório, final que deveria ser apresentado hoje, ficou adiado para a próxima semana, tempo para recuperar o fôlego. O azar nunca anda sozinho. O Ministério Público vai pedir ao Tribunal de Contas da União (TCU) a anulação dos atos secretos e a devolução do dinheiro que os ex-felizardos embolsaram e, por certo, gastaram com a imprevidente com que se costuma dissipar o que não custou o suor e o esforço do bestunto.

Até aqui, a corriola dos senadores vinha tentando abafar o estrondo da denúncia, com o pinga-pinga da liberação das apurações nas últimas páginas do Boletim Administrativo.

Não será tarefa para amadores encolher escândalo que se alinha entre os recordistas, com o tom de criatividade e ineditismo, da nomeação secreta de meio milhar de parentes, amigos, cupinchas, crias da casa, além de cargos de agentes secretos, aumentar salários ou a mais simples criação de horas extras sem limite.

Afinal, a longa permanência do ex-diretor-geral do Senado Agaciel Maia, e a sua prosperidade de milionário pródigo, tem a sua explicação exposta à luz dos números na apuração da comissão criada para apurar o milagre. Até prova em contrário, senadores de todos os partidos, do governo e da oposição fartaram-se nos banquetes do ex-diretor-geral. Nada impedirá que contamine a campanha eleitoral e seja um dos destaques da rede nacional de TV e na de rádio para a propaganda eleitoral gratuita.

O líder do DEM, senador José Agripino Maia, antecipou-se na cobrança pública de punições e "com a devolução dos recursos aos cofres públicos". Não é tudo. O freio de mão da cautela aconselha prudência antes de conhecidos os beneficiários com a sangria secreta. Pois, o escândalo tem todo o jeito de ser superpartidário.

Mais afoito, o líder do PSDB, senador Arthur Virgílio (AM), adiantou que vai pedir a demissão do ex-diretor do Senado Agaciel Maia, por improbidade administrativa. Com a agravante de ter mentido quando questionado por senadores: "Perguntei ao Agaciel se havia atos secretos nesta Casa, ele respondeu que não. Já pedi as notas taquigráficas para entrar com um processo administrativo por ele ter mentido aos senadores".

Se não perder o embalo, este será o escândalo do ano.

Genoino é escolhido relator de emenda que permite terceiro mandato de Lula

Isabel Braga
DEU EM O GLOBO

Petista pretende apresentar relatório à CCJ da Câmara na próxima semana

BRASÍLIA. O PT será novamente testado em relação à proposta de emenda constitucional que cria a possibilidade de o presidente Lula, governadores e prefeitos disputarem a terceira eleição consecutiva. O deputado petista José Genoino (SP) foi o escolhido para relatar a proposta na Comissão de Constituição e Justiça da Câmara, primeira etapa de tramitação da proposta na Câmara. Genoino avisou, por meio da assessoria, que vai apresentar o relatório na CCJ no fim da próxima semana ou início da seguinte. Só então falará sobre o tema. Em entrevistas recentes, manifestou-se contra a emenda, que abre possibilidade para o terceiro mandato de Lula. Para Genoino, seria incoerente defender um terceiro mandato para Lula, uma vez que o PT criticou a ação que permitiu a reeleição de Fernando Henrique Cardoso.

Para que a proposta pudesse tramitar, 34 petistas assinaram o requerimento, reapresentado por Jackson Barreto (PMDB-SE), semana passada, com 176 assinaturas. Muitos dos que assinaram, como o secretário-geral do partido, José Eduardo Cardozo (SP), disseram ser contra a tese, mas a favor da tramitação de todos os temas na Casa. Genoino não assinou.

A escolha de relatores é de competência do presidente da CCJ, deputado Tadeu Filipelli (PMDB-DF). Segundo um deputado peemedebista, a indicação teria que recair sobre alguém do PT, para que o partido assumisse o ônus em relação à proposta. Se passar na CCJ, a emenda terá que ser aprovada, na comissão especial de mérito, antes ir a plenário.

FHC diz que PT só queria escândalo

Fausto Macedo
DEU EM O ESTADO DE S. PAULO

Depoimento do ex-presidente à Justiça, como testemunha de Jefferson na ação do mensalão, ganhou viés político

"É inegável que o governo do presidente Lula, em muitas matérias, criticou o que se fazia e, quando encontrou a realidade, aceitou que era melhor o que nós estávamos fazendo antes.

Então isso aconteceu, para o bem do Brasil", declarou o ex-presidente Fernando Henrique Cardoso (1995-2002) em depoimento à Justiça Federal.

Ele depôs dia 4, como testemunha de defesa do ex-deputado Roberto Jefferson (PTB-RJ), um dos 40 réus do processo do mensalão, suposto esquema de propinas a parlamentares da base aliada do governo.

A audiência foi conduzida pelo juiz Marcio Catapani, da 2ª Vara Criminal Federal em São Paulo.

O termo de declarações, em 7 páginas, foi enviado ao Supremo Tribunal Federal (STF), onde tramita a ação do mensalão.

O ex-presidente elogiou Jefferson, a quem chamou de "batalhador", mas seu relato não se restringiu ao histórico do acusado. Quando provocado pela defesa ou pelo Ministério Público Federal, ele apontou para seu sucessor e o PT. Mais que uma audiência criminal, a sessão ganhou viés político.

"Em termos de ética e de postura, com relação ao combate à corrupção, qual foi exatamente a postura do PT com relação a esses assuntos?", perguntou a Procuradoria da República.

"Transformar em escândalo qualquer caso, muitas vezes sem ter sido apurado", respondeu Fernando Henrique.

A procuradoria indagou sobre a conduta de outros dois réus, o deputado José Genoino (PT-SP) e o ex-ministro José Dirceu. A defesa se opôs, mas o juiz dirigiu-se ao ex-presidente. "O senhor disse que o PT tinha por hábito transformar em escândalo qualquer fato mesmo antes de investigado. Os acusados José Genoino e José Dirceu faziam parte dessa postura? Acho que é uma questão de postura. Só para saber se objetivamente eles assumiam essa postura."

Fernando Henrique: "Eu não posso dizer com precisão se, especificamente, cada um deles, qual é a ação que desenvolveu nesse sentido. Conheço Genoino há muito tempo. Agora, seguramente eles são responsáveis também, porque um era o presidente do partido e o outro tinha posição de destaque, de liderança, sempre foi um deputado, o Genoino, muito ativo. Não posso dizer que eles pessoalmente tenham feito tal coisa no sentido de transformar em escândalo, mas certamente eram pessoas que conduziam o partido, entre outros, naturalmente."

A defesa abordou a transição. "Entre o seu governo e o do presidente Lula foi um período em que o risco Brasil realmente explodiu..." O ex-presidente respondeu: "A sensação que o mercado teria é a de que eventualmente o governo Lula queria modificar aquilo que vinha sendo feito até então, essa era a sensação dos mercados."

As reformas da Previdência e tributária foram questionadas. "No seu governo, qual foi o comportamento do PT em relação às reformas?" Fernando Henrique retrucou: "Em geral, contrário. Na previdenciária votou praticamente contra tudo, e foi aprovada."

Anistia pede postura de Lula pelos direitos humanos

Jamil Chade
DEU EM O ESTADO DE S. PAULO

Posição do Brasil é "lamentável", diz representante da entidade na ONU

A Anistia Internacional apela para uma mudança na posição do presidente Luiz Inácio Lula da Silva no Conselho de Direitos Humanos da Organização das Nações Unidas. Em carta aberta divulgada ontem, a entidade pede que o Brasil passe a adotar uma "postura de princípios" em relação aos temas de direitos humanos. Lula falará no conselho na segunda-feira, em Genebra.

Nos últimos meses, o Brasil vem adotando posições no Conselho de Direitos Humanos da ONU que deixaram as ONGs ocidentais preocupadas. O Itamaraty evitou dar seu apoio a uma investigação internacional em relação às supostas violações de direitos humanos no Sri Lanka e ainda poupou a Coreia do Norte em uma resolução que a condenava.

EXPLICAÇÕES

"Não queremos abrir uma guerra contra o Brasil. Mas o País tem explicações a dar sobre seu comportamento. Esperamos sinceramente que o Brasil, uma democracia, olhe para frente e mude de posicionamento", disse Peter Splinter, representante da Anistia na ONU, considerando "lamentável" a posição do País.

"A Anistia Internacional encoraja o presidente Lula a comprometer o Brasil a uma proteção mais vigorosa dos direitos humanos, tanto nacionalmente como internacionalmente, quando ele discursa no Conselho de Direitos Humanos", afirma o texto da carta. "O Brasil deve mostrar mais compromisso com a proteção de direitos humanos na ONU."

PERPLEXIDADE

A Anistia reconhece os avanços na área dos direitos humanos no Brasil desde o fim da ditadura militar. A entidade também elogia iniciativas internas brasileiras para reduzir a pobreza e combater o trabalho escravo, mas se diz ?perplexa? com a decisão do País de apoiar uma resolução a favor do Sri Lanka diante do cenário de avanços do País com relação aos direitos humanos.

A Anistia lembra, ainda, que a proteção de direitos humanos é uma preocupação legítima da comunidade internacional. Para a entidade, o Brasil não traduz seus discursos de princípio em posições nos votos relacionados com a Coreia do Norte e Sri Lanka e entende que o País queira ser uma ponte para tentar superar problemas entre países e regiões.

Outra entidade que questiona posição do Brasil é a Human Rights Watch. "O Brasil precisa estar ao lado das vítimas", alertou Julie de Rivero, diretora da Human Rights Watch em Genebra.

O Itamaraty, por intermédio de sua assessoria, observou que a Anistia Internacional é uma ONG e informou que a diplomacia brasileira se manifesta nos fóruns adequados.

Lula e o PIB

Fernando Rodrigues
DEU NA FOLHA DE S. PAULO

BRASÍLIA - Como bem escreveu Oscar Pilagallo na Folha nesta semana, a relação entre economia e política não é tão direta como na frase do marqueteiro James Carville ("é a economia, estúpido").

Há exemplos de políticos se dando bem com a economia em desarranjo. Fernando Henrique Cardoso se reelegeu em 1998 mesmo com o PIB brasileiro estagnado.

Já outros perdem mesmo quando as finanças do país dão sinais de reação. Em 1984, o Brasil cresceu 5,4%. Em 1985, o percentual foi de 7,9%. Ainda assim, o momento era de mudança. O candidato governista a presidente, Paulo Maluf, foi derrotado no Colégio Eleitoral.

Os casos em que políticos sofrem reveses eleitorais apesar de a economia estar andando para a frente são curiosos, porque nada têm a ver com as finanças do país. São momentos em que a população resolve mudar. É uma força difícil de conter. Atropela o establishment.

Mas, quando há um desejo de continuidade, vale a mesma lógica.

Essa é a variável trabalhada pelos lulistas. Propagam a interpretação de cristalização iminente de um desejo continuísta no eleitorado. O PIB reagindo e apontando para um crescimento em 2010 seria só a cereja num bolo político cuja preparação está em curso.

Pela estratégia traçada no Planalto, Lula repetirá o mesmo caminho de outros políticos. Venderá um oximoro ao eleitor: avance parado, não mude para ir adiante. Franco Montoro elegeu Orestes Quércia governador de São Paulo. Paulo Maluf emplacou Celso Pitta prefeito paulistano.

Por obra de prestidigitação política, o eleitor de Quércia acreditou estar elegendo Montoro. O de Maluf enxergou em Pitta a perenização do malufismo.

Em todos esses casos, o criador sempre era muito mais popular do que a criatura. Dá-se o mesmo com Lula e Dilma Rousseff. E o petista ainda terá o PIB a seu favor.

A crise não pegou?

Cesar Maia
DEU NA FOLHA DE S. PAULO

TRÊS PESQUISAS -Datafolha, Sensus e Ibope- reforçaram seus resultados. Após oito meses de uma grave crise econômica, a avaliação de Lula volta a crescer. O mais intrigante é a percepção dos brasileiros sobre a crise, que é melhor que em março. Em alguns itens, muito melhor.

Não há indicador econômico que permita chegar a essa conclusão.

As consequências da crise continuaram a avançar. Que razões explicam essa reação da opinião publica? Registre-se que tanto a avaliação de Lula como a percepção dos fatores econômicos se deram em todas as regiões do país, mas não chegaram aos governadores.

Podem-se destacar seis elementos explicativos. O primeiro é a menor intensidade das informações publicadas. À medida que elas são percebidas como parecidas, mantê-las em destaque contrariaria a lógica da renovação do noticiário.

O segundo: depois de um ciclo de três anos de crescimento econômico e de seus efeitos positivos sobre o emprego e renda/consumo, é a esperada torcida para que a crise passe logo.

O terceiro elemento é a própria natureza empresarial dos meios de comunicação, que são parte da crise, com a redução dos patrocínios, da circulação e da audiência. Por isso mesmo, as boas notícias e as previsões otimistas de economistas, empresários e políticos ganham destaque, e as más noticias são deslocadas para os cadernos econômicos. O multiplicador dos fatos negativos tem, assim, a sua aceleração reduzida.

Lula é o quarto elemento. Em seu conhecido voluntarismo, optou por minimizar a crise ("marolinha") desde o início. Ao contrário dos líderes europeus e norte-americanos, que sinalizaram para um aumento defensivo da poupança, Lula estimulou o consumo, que, mesmo não tendo vindo, se ajustou ao discurso otimista. Com isso, vestiu o traje de protetor do povo contra a crise (externa) -o que, aliás, sempre lhe coube muito bem.

O quinto elemento é que, num terceiro ano, pré-eleitoral, os governos, federal e estaduais, diante de uma crise imprevisível e dos seus riscos políticos, aceleraram os gastos publicitários.

E, finalmente, é importante lembrar que, desde 2006, pós-mensalão, o governo federal passou a ter um forte vetor publicitário direcionado à imprensa das cidades menores, especialmente em polos. A grande imprensa -exceção à TV- não circula nessas cidades. E o custo para o governo dessa sustentação é pequeno. Com isso, foi construída uma enorme rede capilar.

A sinergia desses seis elementos ajuda a explicar as pesquisas. A questão de sua sustentabilidade depende do acerto ou não das previsões otimistas e de suas relações com o cotidiano das pessoas.

Serra corta R$ 605 mi para reajustar salários

Catia Seabra
Da Reportagem Local
DEU NA FOLHA DE S. PAULO


R$ 401 mi serão destinados a servidores da área de segurança, R$ 90 mi a técnicos agrícolas e R$ 90 mi a servidores da Fazenda

Cerca de 280 mil servidores, incluindo aposentados e pensionistas, vão receber um reajuste; o Executivo tem 936,4 mil funcionários

Amargando uma perda real de receita de 1,6% em comparação aos cinco primeiros meses do ano passado, o governo de São Paulo vai cortar R$ 604,8 milhões originalmente destinados a diferentes secretarias para poder cobrir reajuste de pessoal concedido no fim do ano passado.O corte de cerca R$ 550 milhões deverá ser irreversível. Outros R$ 50 milhões poderão ser restituídos aos orçamentos para atendimento de programas, como o de manutenção do Poupatempo ou a Ação Social.

Desse total, R$ 400,9 milhões serão destinados aos servidores da área de segurança, incluindo policiais civis e militares. Outros R$ 90 milhões se referem a reajuste para técnicos agrícolas, enquanto R$ 89,9 milhões correspondem ao pagamento de bônus para funcionários da Fazenda.Já o reajuste concedido aos engenheiros do Departamento de Água e Energia consumirá R$ 20 milhões. Para a Fundação Casa, serão R$ 4 milhões. Cerca de 280 mil funcionários, incluindo aposentados e pensionistas, serão beneficiados. O Executivo tem 936,4 mil funcionários no Estado.

A ginástica servirá para contemplar reajustes aprovados pela Assembleia Legislativa após elaboração da proposta de Orçamento (em setembro de 2008). Como as despesas não estavam programadas, não havia reserva de recursos.

Um caso emblemático é o dos policiais civis e militares. Pela proposta inicial de reestruturação de carreira, o gasto seria de aproximadamente R$ 500 milhões anuais. Mas, ano passado, após greve de policiais, marcada por confronto às portas do Palácio dos Bandeirantes, o governo teve que ampliar o benefício. Com isso, o gasto adicional será R$ 400 milhões.

Para honrar os compromissos, o governo decidiu remanejar recursos que já estavam congelados desde janeiro. No início do ano, o governo anunciou o contingenciamento de R$ 1,6 bilhão, poupando os gastos com saúde, educação e segurança. Os investimentos também foram preservados.

Inicialmente, a intenção do governo era liberar parte desses recursos ao longo do ano, desde que a receita fosse concretizada. Há um mês, porém, o governo enviou uma carta aos secretários informando que não contassem com o dinheiro retido no início do ano.

"Nesse segundo semestre, teremos que fazer uma administração corpo a corpo", afirmou o secretário de Planejamento, Francisco Vidal Luna.

Um decreto fixando a cota de cada secretaria deverá ser publicado hoje no "Diário Oficial". A Secretaria de Planejamento sofrerá um corte de R$ 105 milhões, dos quais R$ 87 milhões são reservados para assinatura de futuros convênios.

Na Secretaria de Desenvolvimento, o programa de apoio a investidores será suspenso. Da dotação de R$ 40 milhões, R$ 35 milhões serão destinados a gastos com pessoal. Outros R$ 5 milhões ao programa de parques tecnológicos.

A Secretaria de Assistência e Desenvolvimento Social será uma das mais afetadas com a contenção de R$ 48 milhões de um orçamento de R$ 428,2 milhões. Com retenção de R$ 36 milhões, a dotação para manutenção de Poupatempo passará a R$ 149 milhões. Já a Secretaria de Habitação terá um corte de R$ 88,4 milhões.

O Orçamento do Estado é de R$ 118,2 bilhões, sendo R$ 42 bilhões para pessoal. A arrecadação, no entanto, caiu 1,6%. Com a crise, a perda real é de R$ 640,4 milhões.

Foi ele

Celso Ming
DEU EM O ESTADO DE S. PAULO

Desde o Paraíso Terrestre, a cada encrenca, o ser humano tem uma inexorável propensão a procurar o culpado em vez de uma solução. "A culpa é dela", disse Adão ao Senhor, apontando o dedo para Eva. "A culpa é da serpente", disse Eva.

Agora, por todos os lados, há gente apontando o indicador para Alan Greenspan, o ex-presidente do Federal Reserve (Fed, o banco central americano): "O culpado por essa crise é ele."

Greenspan está nessa história porque a bolha começou a inflar-se em 2002/2004, quando o Fed manteve por 21 meses juros em torno de 1% ao ano.

Como se sabe, juros no chão equivalem a abundância de dinheiro nos mercados e essa fartura produziu administrações financeiras irresponsáveis, excessiva criatividade dos bancos e por aí foi... até que as bolhas estouraram, uma a uma.

Quem estava no comando da política monetária do país mais rico do mundo era o inegavelmente permissivo Alan Greenspan. Mas daí a dizer que tudo aconteceu porque ele produziu ou deixou que alguém produzisse o ovo da serpente, é dar um passo maior do que as pernas.

Toda autoridade está lá para conceber e aplicar políticas públicas. No caso de um presidente de banco central, seu único instrumento de trabalho é a política monetária, ou seja, é o manejo da sanfona que põe dinheiro no mercado ou tira dinheiro do mercado e, com isso, maneja seu preço, que são os juros.

A pergunta correta está em saber que políticas o Fed poderia ter formulado e não formulou e quais poderia ter adotado e não adotou quando as bolhas estavam sendo sopradas. Nesse período, a inflação vinha muito próxima do zero, com risco de transformar-se em deflação, e a atividade econômica estava bombando. Nessas circunstâncias, se o Fed não tivesse adotado uma política monetária acomodatícia, estaria extrapolando os limites do seu mandato.

Pode-se contra-argumentar que o Fed ao menos poderia ter fiscalizado melhor e supervisionado os bancos que praticavam a farra financeira. Essa crítica parece pertinente. Mas é preciso entender, também, que nos Estados Unidos a maior parte dessa função é desempenhada por organismos reguladores estaduais.

E há ainda quem afirme que Greenspan deveria ter avisado do perigo, mais ou menos como a partir de 1998 atacou a bolha da internet quando denunciou a "exuberância irracional" dos mercados de ações. O problema aí é que a simples denúncia, sem políticas adequadas que a acompanhem, não serve para muita coisa. A bolha da internet acabou estourando do mesmo jeito, sem que as denúncias tivessem feito alguma coisa para evitá-la.

A árvore do fruto do bem e do mal, causa mais profunda desta crise, são os enormes desequilíbrios nos balanços de pagamentos no mundo. Foram esses desequilíbrios que produziram a atual simbiose entre Estados Unidos e China, fator que transformou os Estados Unidos em economia altamente deficitária, em gastadora inveterada de produtos asiáticos baratos e em desbragada importadora de poupança. Esta é uma situação insustentável que nenhuma fiscalização e nenhuma política monetária serão capazes de controlar. Como o pecado original será reparado ainda é um mistério profundo.

Contrafilé

Panorama Econômico :: Mirian Leitão
DEU EM O GLOBO


A decisão das grandes redes de supermercados — Carrefour, Wal-Mart e Pão de Açúcar — de exigir dos frigoríficos comprovações de que a carne fornecida por eles não vem de áreas de desmatamento é um salto civilizatório. O caso vai separar as empresas modernas das arcaicas. As primeiras reações dos frigoríficos e da CNA não são animadoras. O BNDES ficou de averiguar as denúncias feitas pelo Greenpeace. Os supermercados tomaram a decisão certa.

Se as grandes redes cumprirem o que disseram, o consumidor brasileiro em breve terá o conforto de saber que, ao degustar um filé, não está derrubando a Amazônia.

O presidente da Associação Brasileira de Supermercados (Abras), Sussumu Honda, me disse numa entrevista recente que a tendência é que as grandes redes sejam seguidas em breve pelas redes regionais. Assim, a pressão pode se generalizar.

O frigorífico Bertin divulgou ontem um comunicado dizendo que já foi informado pelo Pão de Açúcar que não poderá fornecer carne das unidades industriais localizadas no Pará, e que vai acatar, só fornecendo de outras unidades.

Disse também que antes de fazer suas compras, faz consultas diárias à lista suja do trabalho escravo e à lista de propriedades embargadas pelo Ibama. Na nota, o frigorífico repete o que está em seu site: que já tinha descredenciado 141 produtores de gado de áreas embargadas pelo Ibama e 24 produtores que entraram na lista suja do trabalho escravo.

Outros frigoríficos, e os líderes da classe, preferem o arrogante silêncio ou o confronto.

A Confederação Nacional da Agricultura e Pecuária (CNA) e a Associação das Indústrias Exportadores de Carne (Abiec), vão processar o Greenpeace, autor do estudo que rastreou a carne servida aos brasileiros e mostrou que os grandes frigoríficos tem unidades de processamento em região de desmatamento e compram de produtores que criam gado em área desmatada.

O BNDES foi acusado no estudo de ser sócio do desmatamento: tem R$ 6 bilhões em ações dos três maiores frigoríficos citados — JBS Friboi, Marfrig e Bertin. Ele ainda tem feito vultosos empréstimos ao setor. O banco se reuniu com o Greenpeace e divulgou esta resposta: “Vamos analisar cuidadosamente o relatório. Se forem comprovados indícios de irregularidades, serão adotadas medidas já previstas em contrato, que vão desde a suspensão dos desembolsos até o vencimento antecipado dos contratos”.

O diretor de campanhas do Greenpeace, Sérgio Leitão, (a propósito: não é meu parente), disse que saiu insatisfeito da reunião porque em três horas o banco não conseguiu responder às três perguntas fundamentais: quem são os financiados na cadeia da pecuária? Quando haverá uma auditoria independente como a que está sendo exigida pela Abras? Quais são as condições do financiamento aos três grandes frigoríficos? O Ministério Público, no começo do mês, entrou com 21 ações contra os frigoríficos e pecuaristas que produzem ou comercializam carne em áreas de desmatamento.

Neste caso, a resposta da CNA foi, de novo, ameaçar com “medidas judiciais cabíveis”.

Segundo a entidade ruralista, a ação do MP vai “inviabilizar toda a cadeia de pecuária de corte do Pará, que responde por 35% do abastecimento de carne do país”.

O Greenpeace fez uma investigação detalhada, mas não é o primeiro a falar isso.

Reportagens, estudos técnicos como os do Imazon, já vinham mostrando a estreita ligação entre pecuária e desmatamento no Brasil. A revista “Época” publicou, meses atrás, a lista dos grandes frigoríficos e suas unidades de abate em municípios campeões de desmatamento.

Perguntei, num programa recente na Globonews, sobre este texto da revista ao atual presidente da Abiec, Roberto Gianetti da Fonseca. Ele disse desconhecer o assunto e duvidar da informação. Eu entreguei a ele uma cópia da reportagem.

Isso foi antes do estudo do Greenpeace. As denúncias estavam sendo postas com frequência para os grandes produtores mas eles preferiram ignorar o alerta. Agora, veio o estudo da ONG e a reação das redes de supermercados.

A notícia correu o mundo.

Jornais estrangeiros e agências internacionais estão acompanhando o assunto e por dois bons motivos: a Amazônia é a maior floresta tropical do planeta e o Brasil é o maior exportador de carne. Seria ingenuidade achar que a falta de controle e o mau comportamento dos produtores não seriam vigiados por outros países. Aqui neste espaço alertei várias vezes o setor, como na coluna “Pecados da carne”, de 2007. O Brasil em poucos anos passou todos os seus competidores em exportação: Argentina, Nova Zelândia, Canadá, Austrália e Estados Unidos. Hoje, de cada três toneladas de carne exportada, uma sai do Brasil.

Com um desempenho assim, o certo a fazer era aumentar as garantias de produção sustentável, melhorar a sanidade animal, montar sistema de rastreabilidade para comprovar ao cliente a origem da carne.

Pressionados pelo mercado europeu, os grandes produtores — como esses citados no estudo: Marfrig, Friboi, Bertin — criaram sistemas de rastreabilidade para atender às exigências sanitárias.

Mas não adotaram o mesmo sistema para garantir que a carne não vem da Amazônia. A pressão do consumidor pode mudar isso.

Recuperação de empregos pode levar até 8 anos

DEU NO JORNAL DO COMMERCIO (PE)

Para diretor da OIT, ainda é cedo para declarar vitória, pois o mundo vai precisar de tempo para recuperar nível de emprego de antes da recessão

GENEBRA – Governos não devem ter uma posição ideológica sobre a questão da flexibilidade no mercado de trabalho. A avaliação é do diretor-geral da Organização Internacional do Trabalho (OIT), Juan Somavia, que argumenta que o mundo poderá levar até oito anos apenas para recuperar as mesmas taxas de emprego que existiam antes da recessão. “Não podemos declarar vitória muito cedo apenas porque alguns dados mostram um pequeno crescimento.” Na segunda-feira, a OIT abre sua conferência internacional sobre a crise no trabalho, com a presença do presidente Luiz Inácio Lula da Silva. A delegação brasileira revelou que o discurso de Lula será o de defesa dos direitos dos trabalhadores e contra qualquer tentativa de flexibilização das condições e benefícios do trabalho.

O governo avalia até mesmo ratificar uma convenção da OIT que dificultaria demissões. “Não há condições sequer de falar em redução dos direitos dos trabalhadores”, afirmou o ministro do Trabalho, Carlos Lupi. Somavia alerta que a decisão de adotar ou rejeitar medidas de flexibilização no trabalho não deve ser um objetivo ideológico. “A flexibilização é um instrumento. Depende do país e do setor”, disse.

O diretor da OIT lembra que os países nórdicos são os principais defensores de medidas de flexibilização no mundo do trabalho. “Quando olhamos para quais são os países mais competitivos do mundo, vemos que são os países nórdicos. Se a flexibilização fosse ruim, não seriam os mais competitivos”, disse. “Mas cada país deve adotar esse instrumento se achar que pode funcionar”, disse. Ele não nega que, em uma crise, adaptações sejam necessárias.

Somavia admite que o governo de Lula no Brasil “teria sido de crescimento, em condições normais”. “O maior problema dessa crise é que países que estavam funcionando bem, de repetente, foram afetados”, disse. O diretor da OIT ainda lembrou que países que basearam seu crescimento apenas na exportação viram que isso não funcionaria. “Precisa haver um equilíbrio entre o crescimento doméstico e as exportações”, disse.

Ela acredita que o Brasil deve escolher entre uma série de políticas para poder superar a recessão. Mas insistiu que, em qualquer delas, seria necessário o diálogo social.

Outro alerta de Somavia é quanto a tendência do mercado de “começar a abrir champagne” diante da estabilização relativa dos mercados. “Para muitos, a economia pode até ter chegado ao fundo do poço. Mas para vários outros, a questão é que não há como sair de lá”, alertou.

Lupi, em discurso hoje na OIT, insistiu que “o Brasil foi o primeiro país a sair da crise. No atual trimestre, vamos crescer em 1%”, garantiu. Além de Lula, o evento contará com presidentes da Argentina, França, Moçambique, Noruega e outros.

Para Somavia, se os governos deixarem a situação como está e não tomarem medidas concretas para a geração de empregos, quase uma década poderá se passar até que as taxas de desemprego voltem às de 2008. “Entre 39 e 59 milhões de pessoas podem perder seus trabalhos entre 2007 e o final de 2009. Para recuperar isso, precisaríamos entre seis e oito anos para retornar a taxas que sequer eram tão boas”, afirmou Somavia.

Concerto nº 5 op. 73, “Imperador” – parte 4

Ludwig van Beethoven
Confira a parte 4




Confira este vídeo em que Glenn Gould executa o Concerto nº 5 para piano, op. 73, “Imperador”, de Ludwig van Beethoven, acompanhado da Orquestra Sinfônica de Toronto, regida pelo maestro Karel Ancerl.

O genial pianista Glenn Herbert Gould nasceu em 25 de setembro de 1932, em Toronto, no Canadá, e faleceu em 4 de Outubro de 1982, após um derrame profundo.

Gould "conversava" com a música e o piano durante as execuções, em verdadeiro transe de envolvimento interior intenso.Foi também organista.

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