quinta-feira, 28 de janeiro de 2010

Dia D em Honduras

DEU EM O GLOBO

Novo presidente, Porfirio Lobo, toma posse, e Manuel Zelaya deixa embaixada após 128 dias

Ana Lúcia Borges
Tegucigalpa e Rio

O impasse que há quase sete meses domina a cena política de Honduras — disparado pelo golpe de Estado que derrubou o então presidente Manuel Zelaya — chegou ao fim. Ontem, numa cerimônia marcada por segurança reforçada no Estádio Nacional, finalmente tomou posse o presidente Porfirio “Pepe” Lobo, eleito dia 29 de novembro. Duas horas após o novo dirigente ter recebido a faixa presidencial, outra novela se encerrou: Zelaya deixou a Embaixada do Brasil em Tegucigalpa por volta das 15h (19h de Brasília), onde passara os últimos 128 dias, sob forte escolta e driblando o assédio da imprensa. Numa caravana, o ex-presidente rumou para a base aérea da capital, onde embarcou para a República Dominicana num bimotor da Embraer. Antes de partir, entregou ao chefe da embaixada, Francisco Catunda, uma carta de agradecimento ao presidente Luiz Inácio Lula da Silva pelo apoio durante a crise.

Encontro “cortês” antes da viagem

Eu seu primeiro discurso como presidente, Lobo apelou a uma “necessária e indispensável” reconciliação com a comunidade internacional.

Agradeceu ao presidente da Costa Rica, Óscar Arias, “por ter se interessado (...) numa solução justa e pacífica” para a crise; ao presidente da República Dominicana, Leonel Fernández, um dos protagonistas no acordo que facilitou a saída de Zelaya do país, ao lhe conceder salvo-conduto, e à Organização dos Estados Americanos (OEA), entidade de que Honduras foi suspensa após o golpe. Disse, ainda, que seu mandato durará quatro anos, “nem um dia a mais, nem um dia a menos”. Roberto Micheletti, que ocupava interinamente o cargo após o golpe, não assistiu à cerimônia de posse.

— Acabamos de sair da pior crise política de nossa história democrática, mas conseguimos evitar todos os grandes perigos que afrontavam nossa nação — disse Lobo.

Minutos após a posse, o novo presidente sancionou o decreto aprovado na véspera pelo Congresso, que concedeu anistia política tanto a Zelaya quanto aos integrantes do governo participantes no golpe que o derrubara. Depois da cerimônia, Lobo foi para a embaixada, onde se encontrou rapidamente com Zelaya e Leonel Fernández, e, em seguida, acompanhou-os à base aérea, informou Francisco Catunda, ao GLOBO, por telefone.

— Foi uma conversa rápida, de cerca de cinco minutos, e muito cortês.

Eles se cumprimentaram, Zelaya desejou êxito ao governo de Porfirio Lobo e agradeceu a sua iniciativa. Foi muito correto — disse Catunda, acrescentando que Zelaya tirou fotos com sua comitiva, e, depois, entregou uma carta de agradecimento endereçada a Lula e outra aos diplomatas Catunda e José Wilson Batista, que se revezaram nos últimos quatro meses na representação.

O último dos 128 dias na embaixada foi agitado, mas sem confusões.

Pouco antes do almoço, Zelaya recebeu assessores e familiares — como a mãe, Ortensia, que lhe levou uma sopa de galinha, e a sogra. Recebeu ainda um estilista, responsável por seu terno para a partida e pela roupa de sua mulher, Xiomara Castro, segundo o jornal “La Prensa”. As malas, prontas, foram dispostas no primeiro andar, para agilizar o processo.

E, a fim de facilitar a saída, o ex-presidente pedira que seus simpatizantes, que organizavam uma manifestação de despedida, desobstruíssem as vias de acesso à embaixada e se concentrassem nas proximidades da base aérea.

Ao deixar a representação, porém, Zelaya e seus acompanhantes na viagem à República Dominicana — sua mulher, a filha mais nova, também chamada Ortensia, e o assessor Rasel Tomé — conseguiram escapar da imprensa. Uma hora antes da partida, Ortensia, de 23 anos, disse ao GLOBO que a família “continuaria lutando”, mesmo fora do país: — Representamos a vontade do povo, continuaremos à luz das propostas feitas pela Frente de Resistência (Frente Nacional de Resistência Popular, movimento que exigia a volta do expresidente ao poder) e vamos continuar lutando.

Logo depois, deixaram a embaixada os outros seis zelayistas que ainda permaneciam no local — pessoal de apoio como segurança e limpeza. Segundo Catunda, o plano de Zelaya agora seria passar de 15 dias a um mês na República Dominicana e, depois, morar no México.

Ele pretenderia, ainda, incorporarse ao Parlacen (Parlamento Centroamericano) — presidentes dos países membros da entidade têm direito a um assento ao concluírem seu mandato. No entanto, a decisão de se a vaga será destinada a Zelaya ou a Micheletti, que estava interinamente à frente do país, caberá à Corte Centroamericana, com sede em Manágua.

— Zelaya é muito ambicioso politicamente — disse Catunda.

Colaborou: Ângela Góes dos Santos

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