segunda-feira, 15 de fevereiro de 2010

FHC: Atirador de elite

DEU NA REVISTA ISTOÉ

FHC ataca Dilma, obriga PSDB a defender sua gestão e assume o papel de porta-voz da oposição na eleição presidencial

Jorge Felix

"Dilma não é líder, é reflexo de um líder"

"Ela é dogmática"

"Ela é muito dura, uma pessoa autoritária"

"Ela tem uma visão ultrapassada"

A cada campanha presidencial, Fernando Henrique Cardoso tem uma tarefa muito mais árdua do que a batalha eleitoral: convencer o candidato do seu próprio partido, o PSDB, a defender os seus oito anos de governo. Nem José Serra, em 2002, nem Geraldo Alckmin, em 2006, aceitaram a missão. Desta vez, FHC parece ter perdido a esperança. Diante da demora de Serra em confirmar-se na disputa e das críticas do PT, decidiu ele mesmo assumir a defesa de seus feitos. Por um lado, ampliou o risco para os tucanos. Por outro, retesou o debate eleitoral com uma só frase sobre a ministra-candidata: “Dilma não é líder.” A frase de FHC, apesar de ter lustrado um pouco a imagem da oposição – até então inibida pela popularidade do presidente Luiz Inácio Lula da Silva e temerosa em cair na polarização tão almejada pelo PT –, saiu depois de ele mesmo ouvir reclamações por ter defendido seu governo em artigo nos jornais “O Globo” e “O Estado de S. Paulo”. Com o título “Sem medo do passado”, FHC fez o que nunca um candidato tucano quis: listar o que considera os méritos de seu governo, inclusive, segundo ele, as privatizações. E aceitou a comparação: “Se o lulismo quiser comparar, sem mentir e sem descontextualizar, a briga é boa. Nada a temer.” Mas Serra não gostou.

Na opinião do governador, FHC estaria fazendo o que os estrategistas do PT sempre apontaram como o melhor para a candidatura oficial, ou seja, a comparação dos dois governos. O fato é que FHC procura resgatar algo que o PSDB perdeu com suas estratégias malsucedidas em 2002 e 2006. O ex-presidente ainda busca um herdeiro e, agora, corre o risco de ver o candidato Serra elogiar mais os méritos sociais do governo Lula do que defender as privatizações tucanas – tal como ocorreu com Alckmin e como pregam aqueles que apostam na “campanha do pós-Lula”. A amigos, FHC confessa que atribui a esse erro o fato de algo tão forte como o Plano Real, que o elegeu no primeiro turno em 1994 e 1998, hoje nem sequer ser levado em consideração pelo eleitor na hora de apertar o botão na urna eletrônica. O PSDB, ao abrir mão da defesa de FHC, segundo avalia o próprio, deixou escapar o seu maior trunfo administrativo: ter derrubado a crônica e alta inflação. Esse feito, na avaliação do ex-presidente, poderia ter um impacto eleitoral maior e mais duradouro do que qualquer programa Bolsa Família. Mas os candidatos do PSDB, nas últimas campanhas, tinham outras preocupações. Serra, em 2002, apostou demais em seu cacife pessoal e negou o programa econômico comandado pela equipe de seu desafeto monetarista Pedro Malan. Já Alckmin teria partido para a campanha com mágoas depois da tumultuada escolha de seu nome como candidato.

FHC era a favor de Serra e, por isso, o então governador nunca aceitou o papel de defender as realizações do governo do ex-presidente. Agora FHC decidiu provocar o debate e, com isso, criou uma situação sem volta para o candidato tucano. Quando Serra decidir entrar na disputa – o que por FHC já teria ocorrido –, ele dificilmente conseguirá fugir da defesa da gestão do ex-presidente. Pode até ignorar a era FHC no horário eleitoral, mas em entrevistas e debates, certamente, será posto o tema. É por isso que Serra tratou de agir rápido e está trabalhando para o debate voltar ao rumo que ele quer, isto é, a comparação entre o seu governo em São Paulo e o de Lula e ataques somente a Dilma, jamais ao presidente “mito”. Nesta segunda empreitada, foi auxiliado por todo o tucanato. Na terça-feira 9, o senador Tasso Jereissatti (CE) disse que Dilma é “uma liderança de silicone”, tentando esquentar as críticas à ministra com uma imagem distante da acadêmica sociologia de FHC. Na quinta-feira 11, o presidente voltou a mostrar que o atirador de elite do PSDB, por enquanto, é ele mesmo e, em entrevista ao jornal “The Miami Herald”, voltou a acertar a mira: “Ela é mais próxima do PT. Lula tem mais independência do PT. Ele é um negociador. Ele tem a habilidade de mudar de opinião. Eu não acho que Dilma faria isso porque ela é mais – talvez isso seja muito duro – dogmática. Ela tem uma visão ultrapassada a favor de uma maior interferência (do Estado na economia).” E continuou: “Ela é muito dura, uma pessoa autoritária.”

No entanto, no que diz respeito à comparação entre os dois governos, Serra pode ser surpreendido. Se o paralelo entre a gestão de FHC e a de Lula, logo feito pela imprensa, deixa o primeiro em desvantagem na área social – embora a metodologia seja contestada pelos tucanos por não ter sido levada em conta a conjuntura econômica do momento de cada governo –, o primeiro exercício de confronto entre os períodos Serra e Lula também derruba teses do PSDB, como a disciplina fiscal. Um estudo do economista-chefe do Banco Santander, Alexandre Schwartsman, divulgado na quarta-feira 10, revelou que o rigor fiscal de Serra e de Lula foi o mesmo. Os gastos de Serra cresceram, desde 2006,1,3 ponto percentual do PIB paulista, enquanto os investimentos subiram 0,8 ponto percentual. Já o governo Lula ampliou os gastos correntes em 0,9 ponto e os investimentos em apenas 0,4. “Os mesmos fatores que seguram os investimentos federais parecem também segurar os estaduais”, diz Schwartsman. Em resumo: defender gestões ou comparar governos é uma tarefa que parece simples. Mas não é.

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