sábado, 27 de fevereiro de 2010

Lula pisou em algum despacho:: Villas-Bôas Corrêa

DEU NO JORNAL DO BRASIL

A boa estrela do presidente Luiz Inácio Lula da Silva, que ilumina os seus caminhos desde a mudança num pau de arara, com a heroica dona Lindu, sua mãe, e os irmãos dos cafundós de Garanhuns, uma cidade de meia dúzia de vielas no interior de Pernambuco, para São Paulo, quando começa a viver no maior centro urbano do país em marcha para a industrialização, consegue uma vaga no curso de torneiro mecânico como que vacinara o menino pobre, que nas ruas de Santos vende amendoim, laranja, tapioca, tangerina para ajudar a alimentação da família.

Ao mesmo tempo cursa a escola primária do Grupo Escolar Marcílio Dias, onde se alfabetiza. Quatro anos depois, dona Lindu muda-se para a capital, onde o garoto Luiz Inácio em três anos tira o certificado que o credencia a trabalhar na Fábrica de Parafusos Marte e, profissional competente, consegue trabalhar na empresa metalúrgica Vilares, em São Bernardo do Campo.

Em 1969, Lula casado com dona Marisa Letícia de Silva, também viúva e com quatro filhos, é convidado a participar da diretoria do Sindicato dos Trabalhadores das Indústrias Metalúrgicas e de Material Elétrico de São Bernardo do Campo. E daí em diante o seu destino dispara em velocidade de carro de morro abaixo.

Eleito presidente em 1975, Lula cria o “novo sindicalismo”, com a liderança de antigas reivindicações, como remuneração salarial justa, garantia de emprego e melhores condições de trabalho. Reeleito presidente com 98% dos votos, em 1978, em plena greve nacional liderada por Lula, em desafio à legislação da ditadura militar.

Os últimos capítulos da novela são conhecidos. Lula funda o Partido dos Trabalhadores (PT), elege-se deputado federal com medíocre atuação na Constituinte de 1988. A sua vocação era para o Executivo. Lula tenta em obstinada determinação. Perde três eleições: uma para Collor de Mello, duas para Fernando Henrique Cardoso e se elege em 2002 para reeleger-se em 2008 para o mandato que termina em 2011.

Todo este longo e repetitivo rodeio é a modesta tentativa de estabelecer o contraste entre o ontem e hoje, na reviravolta de um longo período de bonança, onde tudo dava certo para o presidente Lula, desde o ousado lançamento na marra da ministra-chefe da Casa Civil, Dilma Rousseff, como a candidata do PT e dos que quisessem pegar uma carona na favorita, amparada pelos 82% de aprovação nas pesquisas, enquanto as oposições batem a testa na indecisão infinita da montagem da chapa.

Em que o presidente errou? O seu anjo da guarda, exausto de tanto carregar o saco dos sucessos, tirou um cochilo calamitoso na viagem sem quê nem para quê do presidente a Cuba.

É indesculpável que não tenha sido alertado pelo Itamaraty para a tensão nos porões da ditadura cubana com a agonia nos seus últimos estertores do preso político cubano Orlando Zapata Tamayo, que morreu após 82 dias de greve de fome em protesto contra as más condições da prisão e pelos direitos humanos.

A foto de Lula, em cores, na primeira página de O Globo de anteontem, seria proibida nos tempos do DIP. Entre o presidente Raúl Castro e o envelhecido Fidel Castro, Lula acaricia a barba no grupo sorridente.

A série de vexames não parou aí. A morte de Zapata provocou uma onda de violência e repressão em Cuba, com a prisão domiciliar e a detenção de dezenas de opositores que tentavam chegar a Holguín para o velório do operário detido desde 2003 e considerado preso pela anistia internacional.

A oposição no Congresso engoliu o constrangimento com a roubalheira no governo de Brasília, um feudo dos Democratas, recuperou a voz e subiu à tribuna parlamentar para protestar para um plenário às moscas, mas que sustentou um debate veemente.

O deputado José Carlos Aleluia (BA), vice-líder do DEM, foi ao acerto de contas com o governo: “Quem poderia imaginar um presidente operário, o nosso presidente metalúrgico, ir a Cuba para comemorar a morte de um dissidente do regime de Fidel Castro?

Isso é inaceitável. Tirar foto dando risada ao lado de assassinos, ao lado de bandidos, em Cuba”. A deputada Vanessa Grazziotin (PCdoB-AM) pediu que fosse retirada do discurso a expressão “assassinos”.

Com o resto, pelo visto, está de acordo.

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