quarta-feira, 31 de março de 2010

Investimento no PAC é visto com ceticismo

DEU EM O GLOBO

Analistas não creem que o Brasil conseguirá atingir a taxa de investimento de 21,5% do PIB em 2014, como prevê o PAC-2. Hoje, está em 16,7%. Para dar esse salto, seria preciso que a taxa de poupança subisse também quase 5 pontos.

Poupança empaca investimentos

Analistas duvidam da capacidade do país de poupar para alcançar metas do PAC-2

Cássia Almeida e Flávia Barbosa

RIO e BRASÍLIA
- As projeções econômicas do governo que amparam a nova versão do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC-2), lançado anteontem, nãoencontramrespaldo nas contas do mercado financeiro. Analistas alertam que não há poupança suficiente no país para financiar o volume de investimentos previsto pelo PAC-2. Ao divulgar os números do programa, o governo se baseou em projeções de que o país vá ter uma taxa de investimentos de21,5% do Produto Interno Bruto (PIB, conjunto de bens e serviços produzidos pela economia) em 2014. Na conta dos analistas, para isso, seria preciso ter um nível de poupança de 19% do PIB ou seja, um salto de quase cinco pontos percentuais frente ao patamar atual, de 14,6%.

Economistas destacam ainda que o principal entrave para ampliar a poupança no Brasil são os gastos públicos enquanto famílias e empresas poupam mais do que gastam, a poupança do governo é negativa. No resultado final, o governo retira 15,9% do total poupado pelo país. Ou seja, para chegar ao crescimento econômico estimado pelo governo de 5,5% até 2014, o país precisará investir e poupar mais com o governo gastando menos. Como chegaremos lá é a pergunta que o economista-chefe da Convenção Corretora, Fernando Montero, fez ao olhar as projeções do PAC-2: A apresentação oficial desfilou uma economia com mais investimento e crescimento, inflação na meta, divida pública caindo, juros menores e superávit fiscal. Faltou o slide que aborda a poupança por trás desse feliz cenário. Se não temos essa perna, o resto cai como castelo de cartas: os juros serão maiores, o investimento e o PIB, menores, e a dívida menos benigna.

Nas contas de Montero, para atingir o nível de investimento previsto (21,5%do PIB, ou R$ 525,8 bilhões em valores de hoje), a poupança precisaria ser de 19% do PIB. E isso já considerando o ingresso de poupança externa.

O professor da PUC São Paulo Antonio Corrêa de Lacerda destaca que enquanto alguns veem a poupança doméstica como pré-requisito para a expansão da economia, outros acreditam que a poupança é resultado do crescimento. Esta é a sua opinião, que não vê empecilhos para o país atingir o investimento projetado no PAC-2. O financiamento pelo BNDES, pelo mercado de capitais e pelos bancos públicos funcionaria como uma antecipação da poupança, afirma.

A poupança baixa é um problema estrutural do Brasil. A renda muito concentrada dificulta a acumulação de poupança.

O mundo quer financiar o Brasil, diz secretário

Para Montero, o caminho é reduzir os gastos públicos para aumentar a poupança do país.

Paulo Levy, do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea), diz que o governo precisa elevar a parcela do investimento no gasto público.

A poupança é pró-cíclica. Se a economia cresce, aumenta também a poupança. Quem poupa mais são as empresas e, com o país crescendo, a rentabilidade delas aumenta. Já o governo é despoupador explica Levy.

Para o secretário de Política Econômica do Ministério da Fazenda, Nelson Barbosa, o que parte dos analistas está questionando é se o Brasil nãoterá de recorrer a muita poupança externa para catapultar o investimento. Isso significa ponderar o tamanho do déficit externo que é saudável para a economia. Barbosa desconversa sobre os números, mas a equipe econômica projetou uma taxa de investimento de21,5% levando em consideração um déficit em conta corrente (trocas como exterior) de 3%do PIB em 2014. Confirmado, este cenário produziria uma taxa de poupança de 18,5% em 2014, igual ao alcançado em 2004, que foi o pico dos últimos anos. Parte dos analistas, porém, acredita que este cenário não é factível e que o déficit externo chegará a 6% ou 7%do PIB. Barbosa considera exagerada esta projeção: Todo economista sabe, ou deveria saber, que investimento gera poupança. É absolutamente sustentável que parte desta poupança venha de fora. O mundo quer financiar o Brasil.

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