sexta-feira, 19 de março de 2010

'Problema' do pré-sal é do Congresso, diz Lula

DEU EM O GLOBO

Presidente não confirma veto a mudanças, como prometera a Cabral
O presidente Lula disse que é do Congresso a responsabilidade de resolver a guerra federativa deflagrada com a emenda Ibsen, que redivide os royalties do petróleo e retira R$ 7 bilhões por ano do Rio.
Sabia que em ano de eleição todo mundo quer fazer gracinha, disse Lula. A bola está nas mãos do Congresso. O Congresso que resolva o problema. O presidente deixou em aberto se vetará a emenda, como prometera ao governador Sérgio Cabral. A estratégia do Planalto é tirar de Lula o peso do veto e forçar a negociação. Cabral evitou polemizar e disse que Lula tem razão ao passar a bola para o Congresso. O deputado Ibsen Pinheiro afirmou que o governo federal nunca se empenhou para derrotar sua proposta: Jogou para a plateia. E ironizou a marcha dos 150 mil: O Rio já fez uma passeata para apoiar o golpe de 64.

Lula: "O Congresso que resolva"

Presidente não confirma veto à proposta contra o Rio, em estratégia para forçar negociação no Senado

Eliane Oliveira* e Gustavo Paul


AMÃ, Jordânia, BRASÍLIA e RIO - O presidente Luiz Inácio Lula da Silva afirmou ontem que é do Senado a responsabilidade de resolver a guerra federativa patrocinada pelos deputados com a chamada emenda Ibsen, que redivide toda a renda do petróleo, inclusive a já paga hoje, retirando cerca de R$ 7 bilhões da economia do Rio. Lula disse que alertou no ano passado, quando do envio dos projetos do marco regulatório do pré-sal ao Congresso, para o risco de se fazer gracinha com o tema em ano de eleição.

O presidente deixou em aberto a possibilidade de vetar a emenda, embora tenha mantido a posição de não se comprometer publicamente com a questão: Já cumpri minha parte. Minha vontade era não votar os royalties este ano, pois sabia que era um ano político e que em ano de eleição todo mundo quer fazer gracinha. Disse que era para deixar para o ano que vem, pois tudo isso é para 2016. Não precisaria dessa pressa agora. Portanto, meus companheiros, a bola está nas mãos do Congresso Nacional, e o Congresso que resolva o problema afirmou.

As declarações foram feitas momentos antes de Lula embarcar de volta ao Brasil, depois de uma viagem de cinco dias ao Oriente Médio.

O presidente não quis dizer se assinaria o veto pedido pelo Rio e já prometido publicamente pela sua base no Congresso e evitou fazer comentários a respeito.

Ele disse que, se o que sair do Congresso for muito diferente da proposta do Executivo, vai se debruçar em cima do que for aprovado.

O presidente destacou que, com exceção do projeto dos royalties, tudo tem sido feito de comum acordo na tramitação do marco regulatório do petróleo. Perguntado se suprimiria os artigos relacionados à divisão dos royalties, afirmou: Não, eu não disse isso.

Cabral: Senado tem que corrigir erro

A estratégia do Planalto é tirar do colo do presidente a responsabilidade do veto que tem custo político imenso e forçar a negociação no Senado. Se Lula se comprometer publicamente com o veto à emenda, explicam seus auxiliares, acaba-se com qualquer chance de os senadores buscarem um acordo político que permita uma distribuição mais equilibrada das riquezas do petróleo, evitando ainda uma batalha judicial pela inconstitucionalidade da emenda Ibsen.

Foi sensato (Lula). Um presidente não pode dizer que vai sancionar ou vetar um projeto de lei antes de ele ser aprovado pelo Congresso defendeu o senador Francisco Dornelles (PP-RJ).

É um movimento escapista do presidente, que demonstra estar com dificuldades políticas rebateu o líder do DEM no Senado, José Agripino Maia (RN).

O ministro do Planejamento, Paulo Bernardo, reafirmou no programa de rádio Bom dia ministro, veiculado pela Radiobrás, o entendimento do Palácio: O entendimento que eu tenho, olhando o que foi votado, é que parece que há falta gravíssima no que foi votado, porque a Constituição diz que uma parte deve ser destinada aos estados produtores.

Não fala quanto, mas que uma parte precisa. Com certeza isso é algo que exige no Senado uma reformulação.

Segundo pessoas próximas ao presidente, ao perceber os resultados provocados pela emenda Ibsen, Lula comentou que já previa a confusão e comentou que não quer incluir o tema na agenda política de 2010. Discussão sobre estados, teria dito, deve ficar a cargo do Senado, não do Executivo.

Um alto funcionário disse que, no Palácio do Planalto e entre os ministérios da área econômica, esperase que os congressistas é que quebrem a cabeça para resolverem o que eles próprios criaram. O cenário ideal é postergar a votação para depois das eleições.

Se não houver um entendimento que reponha o bom senso, que não se faça uma guerra contra o Rio de Janeiro, só votaremos o pré-sal depois das eleições. Porque passa a eleição, passa a emoção disse o líder do PMDB na Câmara, deputado Henrique Eduardo Alves (RN), que foi relator do projeto que trata da partilha.

Cabral evitou polemizar com a declaração do presidente Lula de que caberá ao Congresso resolver o problema. O governador, que vinha garantindo o veto de Lula à emenda, mudou o tom do discurso e disse agora esperar que os deputados federais reconheçam o erro.

Ele (Lula) tem razão ao passar a bola para o Congresso. É o Congresso que deve decidir. Quem está distorcendo o acordo é o deputado Ibsen Pinheiro e os trezentos e poucos deputados que, naquele momento, concordaram. Mas eles podem mudar de opinião, e espero que isso aconteça depois que (a emenda) voltar do Senado afirmou Cabral.

O governador lembrou que, a despeito da declaração de Lula, o presidente tem feito reiteradas afirmações de que vetará o projeto. Cabral elogiou a maneira com que o presidente conduziu o processo do envio do marco regulatório do pré-sal ao Congresso.

A mensagem enviada pelo presidente Lula ao Congresso se refere ao pré-sal a ser licitado. Como ele sempre vem fazendo, respeitou contratos e a legalidade. O erro é da Câmara, e agora tem que ser retificado pelo Senado.

Espero que a Câmara reconheça o erro e mude o rumo dessa história

Ibsen: Rio manifestou apoio ao golpe de 64

Ibsen, em entrevista no rádio, criticou a manifestação que reuniu 150 mil pessoas no Rio, afirmando que nem toda passeata é do bem: O Rio já fez uma passeata para apoiar o golpe de 64. Oswaldo Cruz foi muito vaiado e xingado na ruas do Rio na batalha contra a varíola. É preciso perceber que o Brasil inteiro apoia uma mudança do sistema de distribuição dos royalties. Na Câmara, 24 bancadas votaram unanimemente pela mudança.

Eu gostaria de dizer aos cariocas que a mudança não tem como ser revogada.

Cabral, mais tarde, rebateu: Então tá. Ele é que é do bem.

Já Paulo Bernardo afirmou ainda que a expectativa do governo é que, em 2015, a produção de petróleo da camada pré-sal seja equivalente ou até maior à obtida hoje no pós-sal. A Petrobras, porém, estima que a produção do pré-sal só chegará a 1,835 milhão de barris diários (equivalente à produção brasileira atual) em 2020.

O pré-sal já começou a jorrar em 2009, mas é evidente que em pequena quantidade. Essa produção tende a aumentar disse ele.

Enviada especial

Colaboraram Emanuel Alencar e Cristiane Jungblut

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