domingo, 11 de abril de 2010

Captando sinais:: Merval Pereira

DEU EM O GLOBO

O presidente Lula, velho conhecedor das campanhas eleitorais, deve ter colocado o ouvido no chão e captado sinais que escapam aos comuns dos mortais para se comportar da maneira errática dos últimos dias, sem o menor pudor de afrontar a Justiça Eleitoral ou de anunciar que estará por trás da candidata oficial, Dilma Rousseff, puxando as cordinhas como se faz com as marionetes

Há também nessa mudança de atitudes de Lula a admissão de que a estratégia da oposição está dando resultados. O governo quer porque quer que a oposição assuma ser anti-Lula, enquanto a oposição vai se colocando para o eleitorado como uma opção pós-Lula, como defendia o ex-governador de Minas Aécio Neves.

Sagaz do jeito que é, Lula deve ter detectado que a sua criatura eleitoral não está convencendo os eleitores de que pode levar adiante seu projeto de governo, e resolveu escancarar que estará sempre a seu lado se realmente for eleita.

Essa estratégia de desidratar Dilma para se colocar em seu lugar, cumprindo um terceiro mandato indireto, já havia sido abandonada lá atrás, quando as pesquisas qualitativas mostraram que os eleitores estavam considerando Dilma uma mera teleguiada do líder Lula, o que poderia impedir que ampliasse sua base eleitoral, coisa absolutamente necessária para uma vitória.

Lula chegou a desmentir que pensasse em se candidatar a novo mandato em 2014, dizendo que Dilma não era candidata para um governo só.

Parecia coerente com declarações anteriores, quando defendia a tese de que ex-presidentes já têm seu lugar na História e não devem participar diretamente do dia a dia da política nacional.

Com isso queria criticar o comportamento de seu melhor adversário, o ex-presidente Fernando Henrique Cardoso.

Agora, não se peja de dizer que será o homem por trás dos cordões que moverão a marionete-presidente, e chega a dizer que poderá, fora da Presidência da República, agitar mais, reclamar mais, como se esse fosse o papel de um ex-presidente.

Aliás, Lula já disse que quebrarão a cara aqueles que imaginam que ele será um mero ex-presidente.

Essas idas e vindas de Lula podem indicar que ele está desencarnando mal do papel de presidente da República, mas podem também ser sinais de que as sondagens eleitorais mostram que será mais difícil do que ele apregoa eleger Dilma Rousseff do nada de onde foi buscá-la para reafirmar sua força eleitoral.

Pegue-se a indisposição do presidente com a Justiça Eleitoral e se terá uma ideia clara das dificuldades que Lula está encarando na sua tentativa de eleger Dilma.

Pelo que havia planejado, Lula seguiria impávido na apresentação de sua candidata ao eleitorado brasileiro sem que nada obstaculizasse essa determinação de fazê-la conhecida.

Às custas de quebrar as regras eleitorais seguidamente, conseguiu elevar Dilma de uma quase desconhecida a uma candidata viável com cerca de 30% dos votos nas pesquisas eleitorais.

Esse índice sempre foi uma barreira psicológica que Lula levou muitas derrotas para superar, e teve que se transformar no único líder eleitoralmente viável da esquerda brasileira para consegui-lo.

Ora, Dilma não tem essa capacidade de ação, e trazêla a esse patamar é sem dúvida uma grande vitória pessoal de Lula.

Mas estender o alcance de suas ideias e projetos para além desse eleitorado cativo da esquerda parece ser uma tarefa mais complexa, que não depende apenas de Lula.

E as barreiras jurídicas que o TSE está colocando ao desejo de Lula de impor sua candidata ao país estão irritando o nosso guia, como é identificado pelo chanceler Celso Amorim.

Não se trata, como simplifica Lula, de um juiz qualquer dizer o que se pode ou não se pode fazer. Trata-se de coisa bem mais profunda, respeitar as leis.

O líder sindicalista não está acostumado a ouvir um não a suas vontades, e não gosta quando leis impõem limites às suas ações.

Ou quando os meios de comunicação denunciam irregularidades.

Ou quando o Tribunal de Contas da União embarga uma obra por indícios de irregularidades.

Ou quando os 80% de popularidade que tem não se transformam em votos para aquela que tirou de sua cartola.

No fundo, no fundo, neste momento Lula parece irritado com o eleitor, que ainda não dá mostras de que vai segui-lo cegamente nas urnas de outubro.

Ele está querendo tanto convencer as pessoas de que Dilma é a cara que exagera até mesmo na modéstia.

Declarou na reunião do PCdoB que, se tivesse conhecido Dilma antes, não teria sido candidato, pois ela é bem melhor.

Tudo o mais constante, Lula não teria nem mesmo tempo de saber se Dilma é melhor do que ele, porque trataria de isolá-la politicamente caso se oferecesse para ser candidata a presidente da República, assim como fez com os atuais senadores Cristovam Buarque e Eduardo Suplicy.

Trata-se, portanto, de uma falsa modéstia, e Dilma só está candidata pela vontade exclusiva de Lula, que agora quer convencer o eleitorado de que ela será uma mera laranja dele, cumprindo um terceiro mandato indireto.

Uma mudança na legislação faz com que nesta eleição o eleitor veja na tela da máquina de votar o nome e a foto também do candidato a vice-presidente.

Não se vota separadamente para vice, como já foi o caso, mas a escolha do vice ganha relevância também na hora de votar.

E o suplente de senador também aparecerá na telinha, com foto e tudo.

Saio em férias, e a coluna volta a ser publicada na terça-feira, dia 27 de abril.

Um comentário:

  1. Exatamente um terceiro mandato. Mas desta vez não terá as obrigações de um rei. Sem todas aquelas obrigações. Dá muito trabalho!
    Desta vez quer ser é amigo da rainha. É bem mais fácil!
    Ele sabe que é muito potêncial político que não se pode desperdiçar. Descanso, terá sempre longe do trono. Conselheiro é perfeito para gritar, sem ter de prestar contas a ninguém - nem mesmo Justiça Eleitoral.
    Quer mesmo um outro patamar. Um patamar monarquico tendo a caracteristica de ser taumaturgo, Divino.
    Lula sobre sua nuvem, pensou 12 anos o melhor momento, e então 2003, sobre seu poder divino, criou o Brasil e tudo que se tem até hoje.

    O Navegante. Medeiros.

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