segunda-feira, 21 de junho de 2010

Função democrática :: Thamy Pogrebinschi

DEU EM O GLOBO

A Câmara dos Deputados concluiu o relatório da subcomissão instalada para acompanhar a 1aConferência Nacional de Comunicação (Confecom), realizada, não sem controvérsias, em dezembro do ano passado. Com votação prevista para breve, o relatório aponta que aproximadamente 35% (222) das 641 diretrizes aprovadas na conferência requerem algum tipo de intervenção legislativa por parte do Congresso Nacional, a despeito de o principal destinatário das políticas públicas demandadas em conferências nacionais ser o próprio Poder Executivo que as convoca e organiza.

Mais interessante do que isso é a constatação de que 2/3 (148) dessas diretrizes já são objeto de atividade legislativa, o que pode ser constatado por projetos de lei e estudos legislativos em tramitação na Câmara e no Senado. Com a participação de representantes da sociedade civil, de empresários do setor e do Poder Público, a 1aConfecom aprovou 641 diretrizes de políticas públicas para a área de comunicação, desdobradas em temas tão diversos quanto convergência digital, ética no jornalismo, conteúdo de interesse social, proibição de monopólios e oligopólios, produção e veiculação nacional, e tão controversos quanto controle social da mídia, radiodifusão pública, e direitos humanos e de minorias.

A resposta do Congresso, na verdade, reproduz uma tendência: entre 1988 e 2009, a atividade legislativa do parlamento brasileiro foi significativamente influenciada pelos temas debatidos nas conferências nacionais.

No fim de 2009, 19,8% dos projetos de lei (2.629 iniciativas) e 48,5% das propostas de emenda constitucional (179 PECs) então em trâmite no Poder Legislativo possuíam algum tipo de pertinência temática com as diretrizes oriundas desses processos participativos.

As conferências nacionais têm se revelado uma forma de mediação política que corre paralela às eleições e aos partidos, mas que, como eles, convergem na realização da democracia através das instituições representativas.

A participação social contribui para tornar as instituições políticas mais representativas (pelo grau de abrangência e inclusividade dos interesses que o Poder Legislativo passa a apreciar com maior ênfase) e propicia uma representação política fortalecida pelos novos incentivos recebidos pelos parlamentares para iniciar o processo legislativo em determinadas direções.

A forte presunção de legitimidade popular de que dispõem as diretrizes derivadas das conferências nacionais faculta que as mesmas se superponham à lógica tradicional de distribuição dos interesses partidários.

As diretrizes de políticas públicas oriundas das conferências nacionais propulsionam a atividade legislativa do Congresso Nacional oferecendo aos parlamentares um amplo cardápio de demandas formatadas diretamente de acordo com as preferências da sociedade em um ambiente não eleitoral, e portanto livre de influências partidárias, do apelo midiático e de qualquer outra eventual interferência na formação da opinião e da vontade dos cidadãos. Desfaz-se, assim, o mito de que práticas participativas constituem uma ameaça às instituições democráticas representativas e que estas não são responsivas às demandas da sociedade.

Thamy Pogrebinschi é cientista político e professor do Iuperj

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