sexta-feira, 23 de julho de 2010

Crescimento sustentável na AL::Carmen Pagés-Serra

DEU NO VALOR ECONÔMICO

A agenda de reformas é extensa e por isso precisamos iniciar um diálogo envolvendo toda a sociedade para ampliar o consenso e poder implementá-las

O desempenho econômico recente da América Latina e Caribe tem sido surpreendente, particularmente depois da crise financeira global. Países como o Brasil já estão crescendo a níveis próximos ou até superiores ao do período pré-crise, com forte retomada do investimento.

Nesse cenário, é grande a tentação de achar que finalmente as economias da região estão decolando e reduzindo o hiato de desenvolvimento com os países ricos e do leste da Ásia.

Um estudo recente do Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID) mostra que essa distância só diminuirá de maneira sustentável se a região aumentar a sua produtividade. Mais do que investimentos, a América Latina precisa aumentar a eficiência na qual utiliza os seus recursos econômicos.

O crescimento da América Latina e Caribe foi frustrante nos últimos 50 anos porque a produtividade da região ficou estagnada. Dos 17 países latino-americanos e caribenhos citados no estudo, só o Chile aumentou a sua produtividade em relação aos Estados Unidos desde 1960. A produtividade do Brasil, o terceiro melhor da lista, diminuiu 2,5% em relação aos EUA no mesmo período.

O preço que pagamos por isso foi muito alto. Se os recursos econômicos da região - trabalho, capital físico e humano - produzissem a mesma quantidade de produtos e serviços feitos em países de maior produtividade, a renda per capita da região teria dobrado sem a necessidade de se realizar nenhum investimento adicional. O que fazer então?

Uma boa parte da resposta reside na implementação de políticas e investimentos que promovam a melhor alocação dos recursos da economia. Isso significa aumentar a produtividade das empresas e permitir que as atividades de maior retorno cresçam e absorvam uma fatia maior dos recursos produtivos.

Atualmente, 60% da força de trabalho está empregada no setor de serviços, cuja produtividade é baixíssima. Os recursos econômicos nesse setor produzem somente 15% do que o mesmo setor produz nos Estados Unidos. É vital que haja uma maior competição nessa área para que se aumente a produtividade. E para tanto é necessária a redução da informalidade na economia.

Uma empresa que sonega e não registra seus empregados compete de maneira desleal com empresas no setor formal. São ineficientes porque só conseguem sobreviver porque sonegam. Prejudicam a produtividade porque utilizam recursos produtivos que poderiam estar sendo alocados em firmas e em setores mais eficientes.

Isso nos leva à segunda parte do problema. Nossa produtividade é baixa porque também temos muitos recursos produtivos alocados em empresas pequenas e pouco eficientes. Mais de 85% das empresas manufatureiras da região tem menos de 10 empregados. É preciso fortalecer os incentivos para que as empresas cresçam e saiam da informalidade, já que a produtividade aumenta fortemente com o tamanho da empresa. A produtividade de empresas manufatureiras com mais de 100 empregados é, em média, o dobro da produtividade de empresas pequenas.

A boa notícia é que muitos países já estão trabalhando para avançar nessa direção. Entretanto, precisa ser feito muito mais para que o crescimento seja sustentável no longo prazo.

Um aumento na oferta de crédito cria fortes incentivos para as empresas se formalizarem. Atualmente o nível de crédito ao setor privado na América Latina é menor do que a metade do leste asiático. Somente com maior acesso ao crédito as empresas podem expandir e investir em tecnologias que aumentem sua produtividade. Neste sentido, a expansão recente do crédito ao setor privado no Brasil pode ser um sinal extremamente promissor.

Um sistema tributário simplificado e um combate à sonegação fiscal mais efetivo teriam também efeitos benéficos já que poderiam criar incentivos importantes para as empresas se formalizarem.

É preciso reformar o sistema de financiamento de seguridade e proteção social para aumentar a eficiência na alocação de recursos. Esses sistemas precisam desonerar a folha de pagamentos das empresas porque criam incentivos à informalidade.

Deve-se também fomentar políticas e investimentos que melhorem a competitividade do setor de transportes. Nosso custo de transporte é alto, contribuindo para que nossos produtos manufaturados sejam pouco competitivos no exterior. Além disso, o alto custo de transporte acaba reduzindo os ganhos do setor exportador e isso prejudica sua capacidade de investimento.

Como esta lista indica, a agenda de reformas é extensa e, muitas vezes, pode ir contra os interesses de certos grupos sociais e econômicos. Precisamos iniciar um diálogo envolvendo toda a sociedade para ampliar o consenso e poder implementá-las. Os desafios são muitos. Mas valerá a pena porque esta é uma grande oportunidade de assegurar um futuro melhor em nossos países.


Carmen Pagés-Serra é chefe da divisão de mercado e trabalho no BID e coordenadora do estudo "A era da produtividade: como transformar as economias desde seus alicerces" realizado pelo Banco.

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