DEU EM O GLOBO
Investigação sobre destino dos recursos públicos recebidos por centrais se arrasta há 9 anos
O governo federal repassou pelo menos R$ 162 milhões às grandes centrais sindicais do país - Força Sindical, CUT e outras quatro entidades - e até hoje não se sabe se esses recursos foram gastos corretamente, apesar de os convênios terem sido firmados de 2001 a 2009. Uma amostragem do Sistema Integrado de Administração Financeira (Siafi) revela que as prestações de contas referentes a R$ 54,9 milhões nem foram analisadas. Nos demais casos, a prestação de contas não foi apresentada ou contém irregularidades, informa Regina Alvarez. A Força, que passou a apoiar o governo Lula e sua candidata à Presidência, Dilma Rousseff, aparece como inadimplente em três convênios entre 2001 e 2003 e, somados, chegam a R$ 101,9 milhões. Todos são alvo de tomadas de contas especiais devido a irregularidades identificadas. O TCU já alertou o governo sobre as falhas na fiscalização.
Dinheiro sindical sem controle
Convênios de R$ 162 milhões com CUT, Força e mais 4 entidades têm irregularidades e pendências nas prestações de contas
Regina Alvarez
BRASÍLIA - Em campanha explícita pela candidata do PT à Presidência, Dilma Rousseff, as grandes centrais sindicais e sindicatos ligados a essas entidades recebem tratamento complacente do governo, em relação ao controle e à fiscalização do uso do dinheiro público. Amostragem extraída do Sistema Integrado de Administração Financeira (Siafi) aponta irregularidades e pendências em, pelo menos, R$ 162 milhões repassados à CUT, à Força Sindical e a mais quatro entidades, por convênios. Desse montante, R$ 54,9 milhões são de repasses que sequer tiveram as prestações de contas analisadas pelos órgãos federais até o momento, embora os convênios tenham sido encerrados entre 2001 e 2009. O restante se refere a prestações de contas que não foram apresentadas ou contêm irregularidades.
As grandes centrais sindicais e sindicatos ligados a essas entidades receberam milhões em recursos do governo para aplicar em treinamento e capacitação de trabalhadores, cursos de aperfeiçoamento e outras atividades inerentes ao movimento sindical.
Uma parte das irregularidades na aplicação dos recursos destinados às centrais sindicais foi detectada ainda no governo anterior, a partir de auditorias feitas pelo Tribunal de Contas da União (TCU).
A Força Sindical, por exemplo, que apoiava o governo anterior e agora defende a candidata do presidente Lula, aparece no Siafi como inadimplente em três convênios firmados com o Ministério do Trabalho, encerrados entre 2001 e 2003.
Somados, esses convênios (inadimplentes) da Força chegam a R$ 101,9 milhões e são objeto de tomadas de contas especiais pelos órgãos de fiscalização, mas ninguém foi punido até o momento, porque os processos não foram concluídos.
Outros três convênios entre o ministério e a Força Sindical aparecem no Siafi com prestações de contas sem análise. Um deles, no valor de R$ 4,2 milhões, foi encerrado em fevereiro de 2001. Outro, no valor de R$ 13,2 milhões, em março de 2006. Somados, os recursos repassados à Força e que apresentam algum tipo de pendência na prestação de contas irregularidades ou falta de análise chegam a R$ 123,5 milhões.
Maioria da verba transferida é do FAT
A maioria dos recursos transferidos às entidades é do Fundo de Amparo ao Trabalhador (FAT), administrado pelo Ministério do Trabalho.
Só do Fundo, são R$ 145,7 milhões sem prestações de contas aprovadas. O levantamento feito no Siafi abrange 23 convênios firmados com órgãos do governo, que apresentam pendências diversas.
Além de CUT e Força Sindical, o balanço inclui outros dois braços da CUT: Escola Sindical São PauloCUT e Escola Sindical Amazônia (CUT-PA); Federação dos Trabalhadores na Agricultura Familiar (FetrafSul-CUT) e o Sindicato dos Metalúrgicos de São Paulo, este último ligado à Força Sindical.
No caso da CUT, há registro de dois convênios, encerrados em 2006 e 2007, que ainda não tiveram as prestações de contas analisadas pelos órgãos federais. Um com o Ministério do Trabalho, via FAT, de R$ 5,2 milhões; outro com o Ministério da Educação, por meio do Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação (FNDE), de R$ 7,8 milhões.
A Escola Sindical Amazônia-CUT deixou de apresentar as prestações de contas de convênios com o Ministério de Desenvolvimento Agrário (MDA) encerrados em 31 de dezembro de 2007, no valor de R$ 308 mil, e aparece como inadimplente no Siafi.
A Escola Sindical São Paulo-CUT tem uma prestação de contas sem análise de um convênio com o Ministério do Trabalho encerrado em abril de 2007, no valor de R$ 5 milhões. E não apresentou prestação de contas de outro convênio, com o Ministério da Cultura, de R$ 150 mil.
O Sindicato dos Metalúrgicos de São Paulo, ligado à Força Sindical, tem um convênio de R$ 12,9 milhões com o Ministério do Trabalho, encerrado em fevereiro de 2001, que aparece no Siafi com a prestação de contas sem análise.
A Federação de Trabalhadores na Agricultura Familiar (Fetraf-Sul-CUT) não apresentou prestações de contas de quatro convênios firmados com o Ministério do Desenvolvimento Agrário (MDA). E outros quatro convênios, encerrados em 2007, não tiveram até o momento as prestações de contas analisadas. No total, são R$ 3,7 milhões repassados pelo governo à federação, e com pendências nas prestações de contas.
O Tribunal de Contas da União considera falha a fiscalização dos convênios com as chamadas entidades sem fins lucrativos, onde se enquadram as entidades sindicais, e já fez diversos alertas ao governo sobre o acúmulo de prestações de contas sem análise.
Em maio, o TCU aprovou acórdão que contém advertência à ministra da Casa Civil, Erenice Guerra, e ao ministro do Planejamento, Paulo Bernardo, sobre o atraso na implantação plena do Siconv (sistema de convênios) e do Portal de Convênios.
Os sistemas foram criados pelo governo para o acompanhamento e fiscalização das transferências de recursos do Orçamento da União, por exigência do TCU.
Quando estiverem funcionando plenamente, prometem maior transparência e controle efetivo do uso do dinheiro público. A implantação começou em 2007, mas se arrasta, e o cronograma já foi adiado várias vezes, a pedido do governo.
Os sucessivos atrasos no cronograma de implantação do Siconv e do Portal de Convênios estão postergando a conclusão dessas ferramentas e, em consequência, impedindo uma melhor gestão dos recursos públicos federais descentralizados, comprometendo os custos e os resultados de parcela dos programas de governo, e propiciando a ocorrência de irregularidades na gestão orçamentária desses recursos(...), afirma o ministro Augusto Sherman, relator do acórdão do TCU.
Os órgãos que repassam os recursos têm estruturas muito precárias.
Não têm recursos humanos nem materiais para fazer trabalho eficiente disse o ministro ao GLOBO.
Política e cultura, segundo uma opção democrática, constitucionalista, reformista, plural.
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