terça-feira, 31 de agosto de 2010

Marco oculto sob a passagem de nível:: Wilson Figueiredo

DEU NO JORNAL DO BRASIL

Está no Caldas Aulete que oposição é a ação de opor ou opor-se e, como não poderia deixar de ser, o verbete vai direto ao ponto com a variante segundo a qual também vale para esforços que se opõem a um governo para o estorvar nos seus atos, para a paralisação na sua ação ou para expulsá-lo do poder. A última hipótese teve seu tempo no Brasil, mas a moda passou. E deixou sequelas. Pode ter sido por mais de uma razão, mas o fato histórico foi que o PSDB teve ao seu alcance, num determinado momento do mensalão, o primeiro mandato de Lula, em situação de tirar o fôlego. O episódio foi discreto, e o pessoal da social-democracia parou à beira do precipício. E perdeu a oportunidade de optar pela solução negociada, no melhor sentido, e garantir à democracia saldo qualificado no quinto mandato presidencial depois dos governo militares.

O episódio circulou em âmbito restrito, em forma de versões pessoais, como se fosse degradante ou envolvesse conivência para desativar o escândalo. É fato, ainda não processado de público, que o comando social-democrata resolveu esperar que a situação se resolvesse por si mesma. Não se resolveu, e o governo apenas chegou a examinar a renúncia ou a alternativa de apelar para os grotões ideológicos. A oposição tomou consciência de que a democracia confirma ter vindo para ficar.

Pode ter sido também o temor do opróbrio histórico que levou o PSDB à reflexão. O tempo trará à tona a verdade sobre o único perigo de retrocesso vivido desde a última eleição indireta, que foi também o primeiro passo rumo a uma democracia estável. Naquele momento tenso, o acordo poderia poupar a História, para sempre, da farsa de repetir-se em círculos de autoritarismo estéril e recomeçar em vão.

Ao deter-se diante do desfecho do que se entende (em regime parlamentar de governo) por ultima ratio do direito de fazer oposição, o PSDB não pleiteou solução de algibeira. No confronto de conceitos socialistas de governo democrático e resíduos de natureza revolucionária, falta aos dois lados da questão derrubar o muro de prevenções fomentadas por baixo nível ideológico. A desconfiança recíproca ficou mais nítida na campanha eleitoral perante a qual se nivelam igualmente pela intolerância. A atual oportunidade não será a última, mas o tempo desperdiçado na disputa de votos abre espaço para a reflexão isenta, objetiva, ponderada, sem pressa em relação ao futuro que está atrasado mas recomeça todos os dias. O único símbolo de progresso, a despeito das aparências e sombras (se é que não apenas esconde o que não pode ser mostrado), é a apresentação de quatro candidatos com matizes variados de esquerda, pelo que se subentende como centro, sujeito a suspeitas mas sem a tentação de voltar atrás à procura do que passou.

Passou e não tem volta.

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