sexta-feira, 3 de setembro de 2010

Governo mantém Cartaxo para preservar Dilma

DEU EM O GLOBO

Permanência de secretário da Receita atrairia para ele desgaste pelo vazamento
Martha Beck e Gerson Camarotti

BRASÍLIA. É cada vez mais incômoda a situação do secretário da Receita, Otacílio Cartaxo, diante do escândalo provocado pelo vazamento de dados fiscais de pessoas ligadas ao PSDB e ao candidato tucano a presidente, José Serra. O Palácio do Planalto considera que o secretário tem apresentado um desempenho sofrível diante da crise. Mas o próprio presidente Lula sinalizou internamente que não é o momento para fazer qualquer mudança no comando da Receita, principalmente em período de grande bombardeio político.

A percepção no núcleo do governo é de que a permanência de Cartaxo é conveniente por ter atraído para ele todo o desgaste da quebra de sigilo, distanciando o episódio da candidata petista à Presidência, Dilma Rousseff. Ontem, um interlocutor de Lula que o acompanhava na viagem a Foz do Iguaçu foi enfático ao afirmar que o presidente não tratou em nenhum momento de demissão de Cartaxo com o ministro da Fazenda, Guido Mantega.

Os boatos sobre a demissão de Cartaxo correram ao longo do dia, mas Mantega descartou a possibilidade de exoneração:

- Não estou cogitando fazer isso - disse.

Cartaxo é usado como escudo de Dilma

Um ministro afirmou que a demissão de Cartaxo só seria feita em última instância e que sua permanência no cargo servia de escudo para o próprio Mantega e até mesmo para a campanha de Dilma. Mas há o reconhecimento de que ele foi atrapalhado nas explicações públicas e de que não passou credibilidade nas entrevistas concedidas para falar sobre as violações de sigilo. Um assessor palaciano ressaltou que Cartaxo estaria cumprindo uma missão.

A postura reticente de Cartaxo ao longo do episódio que começou com a quebra do sigilo fiscal do vice-presidente do PSDB, Eduardo Jorge, e culminou com a liberação de dados da filha de Serra, Verônica, está sendo criticada também por integrantes do Ministério da Fazenda. Apesar de ainda não tratarem o caso como um motivo para tirar Cartaxo do cargo, auxiliares do ministro Guido Mantega reconhecem que o secretário não tem administrado a crise.

O problema mais recente veio com a divulgação de uma procuração falsa que teria sido utilizada por um contador para obter, numa delegacia do Fisco, cópias das declarações do Imposto de Renda de Verônica Serra.

A avaliação na Fazenda é que a Receita fez mal ao divulgar a procuração para justificar o acesso aos dados, já sabendo que o documento tinha indícios de fraude.

O problema é que uma troca de comando na Receita neste momento é avaliada como problemática em meio às pressões da oposição para que isso aconteça. Além disso, Cartaxo teve um papel importante na administração da crise interna gerada no Fisco que culminou com a saída de Lina Vieira do comando do órgão, em julho de 2009. A então secretária levara para o governo aliados políticos que aparelharam as superintendências da Receita e prejudicavam o andamento do Fisco num momento delicado economicamente, em que o governo precisava aumentar a receita.

Esses aliados ameaçavam deixar os cargos se Lina fosse demitida e o ministro Mantega levasse de volta à secretaria integrantes do comando anterior, ligados ao ex-secretário Jorge Rachid. Cartaxo, que ocupava o segundo cargo mais importante na Receita, acabou sendo aceito pelos auditores que disputam espaço no órgão.

Em entrevista ao "Estado de São Paulo", Cartaxo afirmou ontem que seu cargo pertence ao ministro da Fazenda e que questionamentos sobre sua exoneração deveriam ser feitos a Mantega. O secretário disse ainda:

- Nós estamos navegando na crise. Não é uma crise administrativa, é política.

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